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A escrita biográfica de Frei Luís de Sousa
A «História de S. Domingos» e a «Vida de frei Bartolomeu dos Mártires», apresentou a dominante preocupação de exaltar a Ordem dominicana, enaltecendo a piedade, as virtudes e letras dos seus membros.
Na «História de S. Domingos» essa preocupação traduz-se especialmente pelo relato de numerosos milagres, êxtases e visões, de interesse mais religioso do que histórico; na «Vida de frei Bartolomeu dos Mártires» pelo relato dos merecimentos do arcebispo.
Foi a «Vida» do arcebispo tirada dum acervo enorme de apontamentos, que ele ampliou com várias particularidades obtidas por ele próprio, e que ordenou e pôs em estilo. A maior parte dos apontamentos tinham sido tomados por frei Luís de Cácegas. Referindo-se a eles, escreveu Alexandre Lobo:
- «as Memórias de Cácegas eram indigestas e informes, ele (frei Luís) tirou do confuso caos um corpo regular, aptamente conformado, que da prudente disposição recebe alma, claridade e formosura» e mais adiante: «apontamentos e rascunhos mal alinhados e muito perplexos».
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E é o conhecimento da realidade viva e da totalidade concreta que a história principalmente visa; objectivo de extrema dificuldade, pois não só é procurado através dos documentos (matéria morta), mas é perturbado pelas crenças' paixões, predilecções, interesses do historiador. Quantas falsas visões, quantos informes omitidos, quantos acrescentamentos fantasiosos!
O trabalho de frei Luís de Sousa está naturalmente dentro deste defeituoso condicionamento, agravado pelo critério histórico da época. Por outro lado os escritos de frei Bartolomeu dos Mártires, que chegaram até nós (vários se perderam), não fornecem suficientes elementos para completar o trabalho de Sousa no sentido dum melhor conhecimento do arcebispo; são sobretudo doutrinários e de devoção.
Francisco Alexandre Lobo, referindo-se às obras de frei Luís de Sousa, diz que «não pintam homens, representam anjos, não são corpos de história são panegíricos em que a mesma vaidade move desconfiança ou se despreza como fábula vaidosa».
Seria frei Bartolomeu um «presuntuoso» um «altivo», como lhe chamavam os seus inimigos? (Livro III, cap. IX), - um espírito naturalmente orgulhoso (que procurava ocultar-se sob uma forçada modéstia); pouco sociável, refractário a qualquer ingerência alheia, sobranceiramente apegado a estudos, devoções e costumes em que gostosamente se sentiria embalado e superiorizado?
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Costumes que ostensivamente contrapunha aos duma época, que ele estigmatizava do alto do púlpito como, por exemplo, quando, em Coimbra, se referia a «uma vanglória que hoje vejo devassadamente introduzida ou entronizada em Portugal, de pompas, de gastos e estados, que nunca usaram vossos avós, nem vos fazem melhores, nem mais honrados; de invenções de trajos que vos trazem os membros emprensados, cativos e aleijados, que tevéreis merecimento se por penitência os sofrêreis; de gulodices e superfluidades nas mesas que efeminam os ânimos e enfraquecem os corpos» (Livro IV, cap. III).
As autoridades terrenas, parece que pouco o interessavam, parece não ter por elas especial deferência. Vários casos levam a suspeitá-lo. Assim por exemplo: constrangido se encontrou com Filipe II, ao regressar de Trento:
- «bastantemente vinha enfastiado de honras e favores de príncipes e do maior de todos que era o papa» e «não pôde acabar consigo falar por Majestade a um rei da terra», «parecia-lhe que fazia agravo à Divina, que sempre trazia presente na alma, se comunicasse aquele tão alto título a quem era terra» «Majestade só Deus a tinha». (Livro II, cap. XXXIII).
Deus e ele, e os pobres como representações de Cristo, e portanto divinas. Nada mais». In Augusto Reis Machado, Fundação Calouste Gulbenkian.
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