terça-feira, 31 de maio de 2011

Maria Ana M. Guedes: Introdução Parte I. Interferência e Integração dos Portugueses na Birmânia, ca 1580-1630. «Em Portugal, o período está por estudar, embora se tenham divulgado, numa perspectiva lusocêntrica, as conquistas territoriais na Baixa Birmânia entre 1600 e 1613. Em vários artigos, de revistas e de enciclopédias, tem-se feito corresponder a história dos Portugueses na Birmânia ao efémero domínio no sul daquele país»

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Introdução
«Tem sido dedicada pouca atenção à história da presença portuguesa na Birmânia, apesar das muitas fontes disponíveis sobre o assunto. A minha intenção inicial ao escolher o tema da presente dissertação foi a de recolher a documentação existente nos arquivos, compará-la com o material impresso, e delinear uma história que preenchesse essa lacuna e servisse de base a futuras investigações, tendentes a enquadrá-la no âmbito, mais vasto, da história dos Portugueses na Ásia.
Delimitei o tema ao período entre 1580 e 1630 por duas razões essenciais.
  • A primeira, foi a de tratar uma época marcante na história da Birmânia, coincide com forte e rápida dinâmica de desestabilização e reconstrução de poderes, que culminou com reorganização de formações políticas relativamente estáveis.
  • A segunda, foi a de averiguar o papel dos Portugueses nesse processo.

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Em Portugal, o período está por estudar, embora se tenham divulgado, numa perspectiva lusocêntrica, as conquistas territoriais na Baixa Birmânia entre 1600 e 1613. Em vários artigos, de revistas e de enciclopédias, tem-se feito corresponder a história dos Portugueses na Birmânia ao efémero domínio no sul daquele país. Tais artigos têm por base um relato seiscentista, da autoria do Pe Manuel de Abreu Mouzinho, que embora constitua fonte de considerável valor, reporta-se a um espaço e a um tempo circunscritos, e é nitidamente tendencioso no que respeita à análise de personagens envolvidas nessa ocupação. É de aflitiva inexactidão o uso que tem sido feito do relato de Mouzinho. Tomando-o como informação exclusiva, os escritos que nele se baseiam restringem a presença portuguesa na Birmânia à região, ao período, e aos acontecimentos focados pelo religioso, sem qualquer carácter interpretativo. Constituem excepção a esse género de inexactidão um artigo de Socarras, e parte da «História Militar» de Botelho de Sousa, no entanto, ambos os historiadores mantiveram o tipo de perspectiva assinalado atrás. Mais recentemente foi publicado um livro do Pe Manuel Teixeira que, apesar de constituir sobretudo numa compilação de citações de algumas crónicas ou histórias de autores estrangeiros, acompanhada de relação das missões católicas, apresenta a vantagem de ser o único que não se restringe espacialmente à região vulgarmente conhecida por Pegu. Sob um ponto de vista analítico, os sólidos e fundamentados estudos de L. F. Thomaz versam essencialmente aspectos comerciais dos primeiros contactos com o litoral sul daquele país.

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As primeiras e quase únicas histórias gerais da Birmânia foram escritas por ingleses e por outros autores de escola anglo-saxónica, dada a circunstância de os britânicos ao ocuparem o país, se terem interessado pelo seu passado. As poucas páginas dedicadas nessas histórias por A. Phayre, J. G. Scott, G. E. Harvey e M. Htin Aung ao período entre 1580 e 1630 servem ainda de base aos trabalhos que, como este, se debruçam sobre a Birmânia. A mesma utilidade têm os estudos de D. G. E. Hall, sobretudo aqueles que versam a presença dos europeus. Uma nova geração de historiadores, também de escola anglo-saxónica, tem vindo a refazer a história da época em questão. Partindo de algumas ideias de Harvey e apoiando-se maioritariamente em fontes locais, V. B. Lieberman reconstituiu a história político-administrativa dos sécs. XVII e XVIII, em excelentes trabalhos, particularmente importantes para a elaboração desta dissertação. Também com base em fontes locais, historiadores entre os quais ressalto M. Aung-Thwin e Than Tun abordaram cuidadosamente aspectos culturais e políticos do período.
Um problema deixado em aberto pelos estudos referidos, é o do que se entende por Birmânia. Em Portugal, tende a estabelecer-se uma certa confusão entre Pegu e Birmânia. Na verdade, Pegu começou por ser a capital dos reinos «mons» da Baixa Birmânia. Por razões que se prendem sobretudo: com a importância adquirida pela cidade, que passou a capital de um vasto império; com o estabelecimento do comércio oficial português naquelas paragens; e com a posterior ocupação da região por dissidentes Portugueses, Pegu passou a ser usado por historiadores e cronistas como termo designativo de todo o país. Embora os autores de escola anglo-saxónica não chamem «Pegu» à Birmânia quinhentista ou de qualquer outra época, as suas histórias, tal como as dos Portugueses, são geograficamente restritas às zonas que ocuparam». In Maria Ana Masques Guedes, Interferência e Integração dos Portugueses na Birmânia, ca 1580-1630, Fundação Oriente, ISBN 972-9440-28-X.

Cortesia da Fundação Oriente/JDACT