quinta-feira, 8 de novembro de 2012

O Maior Tufão de Macau. Pedro Fragoso Matos. «Também, nas ‘Efemérides da Marinha Portuguesa’, constantes da ‘Lista da Armada’ de 1900, encontrámos a seguinte notícia, onde já se referiam os nomes dos comandantes dos navios de guerra sinistrados, embora se omita a verdadeira situação da Canhoneira “Camões”»

Curva barométrica do tufão
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Com a amizade da LC e a memória do amigo APCM

(Continuação)
«Do Boletim n.º 44/31-10-874, extraímos ainda os seguintes trechos, o primeiro referente a Macau e o segundo a Taipa e Coloane.
  • (...)No mar os prejuízos foram maiores. Mais de 700 lorchas grandes de comércio e de pesca deram à costa e perderam-se completamente, tendo algumas delas cargas valiosas a bordo. Calcula-se em mais de 1000 o número de lorchas pequenas, como os tancaros e outras, que foram destruídas. As pessoas entendidas nesta matéria avaliam aproximadamente em quase um mílhão de patacas o valor destas embarcações.
    (...)
    As lorchas naufragadas, incluindo as que tinham negócio na povoação e naufragaram noutros portos, trezentos e oitenta e cinco, tancás trezentos e quatro (...).

 Farol da Guia antes do tufão

Também, nas ‘Efemérides da Marinha Portuguesa’, constantes da ‘Lista da Armada’ de 1900, encontrámos a seguinte notícia, onde já se referiam os nomes dos comandantes dos navios de guerra sinistrados, embora se omita a verdadeira situação da Canhoneira “Camões”:
  • 1874 (22 de Setembro)Grande ciclone em Macau, causando numerosos prejuízos e desgraças, tanto no mar como em terra, e morrendo centenares de pessoas. No porto da nossa colónia afundaram-se alguns navios e entre eles a escuna de guerra Príncipe D. Carlos que se perdeu totalmente, e a canhoneira Camões. A Príncipe D. Carlos era comandada pelo primeiro-tenente Vicente Silveira Maciel e fora lançada ao mar em 1866, e a Camões fora lançada ao mar em 1865 e era comandada pelo segundo-tenente José Maria Guimarães’.
Descrição do Tufão
Para melhor elucidação, a descrição desta tremenda tempestade tropical, que constituiu um verdadeiro martírio para Macau e para a sua população, será feita com a transcrição de pequenos trechos das publicações de dois conhecidos escritores que, da melhor maneira, nos transmitem os aspectos mais salientes deste trágico acontecimento.
Assim, no Boletim Oficial da Província de Macau e de Timor nº 42/17-10-1874, pode encontrar-se uma curiosa descrição assinada pelo escritor Pedro Gastão Mesnier, Secretário do Governador de Macau, de que escolhemos os seguintes extractos pelo seu magnífico valor literário:
  • (...)‘Durante toda a semana anterior, não tinha havido tão formosa madrugada. Centenas de lorchas de pesca, aproveitando o bom tempo, velejava à vista da Praia Grande, na larga bacia de mar, que se estende até à ilha de Lantau, e todos estavam entregues à mais tranquila confiança, enganados pelo aspecto risonho da atmosfera.
    (...)
    O vento começou a aumentar, o barómetro baixava gradualmente e, segundo o costume, pela Capitania do Porto, se fizeram os sinais de mau tempo. Deu-se o tiro de peça, e a bandeira amarela com quadrado vermelho, foi içada na haste da Praia Grande. Eram três horas da tarde, e os marinheiros chineses, assustados pela transformação súbita da atmosfera, corriam a abrigar as embarcações em lugar seguro. Impelidos pela brisa cada vez maís fresca, debaixo do firmamento, que de momento a momento se tornava mais medonho, e fazendo espumar sob as rápidas quilhas as águas esverdeadas do nosso porto, milhares de juncos se precipitavam, em confuso tropel, fugindo perante as ameaças que todos aqui sabem compreender. Em poucos instantes a perspectiva da vida de Macau, que pela manhã apresentava tão animado espectáculo de embarcações indígenas, aparecia solitária e deserta.
    (...)
    Ao pôr do sol, os seus raios quase horizontais, refractos pelo raro véu de vapores que cobria o ocidente, derramaram subitamente pelo firmamento uma cor vermelha intensa, que envolvia tudo nos seus ardentes reflexos. Parecia que se abria subitamente a boca de enorme fornalha. Durou poucos instantes e fenómeno luminoso.
    (...)
    À meia noite, eram já violentíssimas as rajadas, e nos bairros expostos, a cidade estava como morta.
    (...)
    No porto interior, desobrigado do lado Norte, as águas estavam mais desinquietas. Sacudidas pelo ímpeto do temporal, algumas lorchas principiaram a perder a amarração, e apenas se desligavam das âncoras, eram arrastadas em vertiginosa carreira, sobre as vagas espumantes, pelo esforço combinado do mar e do vento. Os nossos navios de guerra, a escuna Príncipe D. Carlos, navio de vela de 150 toneladas, a canhoneira Tejo a vapor de 300 toneladas, e a canhoneira Camões de 80 toneladas, ancoradas entre a Alfândega e a fortaleza da Barra, viam estas moles passando desordenadamente em todas as direcções, acrescentando ,mais os perigos com que já se encontravam a braços».
In Pedro Fragoso Matos, O Maior Tufão de Macau, Separata dos Anais do Clube Militar Naval, Lisboa, 1985.

O amigo Olavo Rasquinho, numa palestra
continua
Cortesia de António Pedro (†)
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