O Oriente Português: a perda de Ormuz e Malaca. O Brasil
«(…) A nomeação de Francisco da Gama, 4º conde da Vidigueira, para
um segundo exercício no governo da Índia não foi de molde a afastar a ameaça.
Em Fevereiro de 1622, uma frota
inglesa, com a ajuda do rei da Pérsia, cercou a cidade, que, por falta de
homens e de víveres, a 15 de Maio teve de render-se ao inimigo. Portugal via-se
assim despojado da grande fortaleza que era a chave da sua presença no oceano
Índico. Na área da Insulíndia verificou-se a ameaça dos Holandeses, que se
coroou em 1639 com a conquista da
ilha de Ceilão e, dois anos depois, com a da cidade de Malaca, por onde se
fazia todo o comércio de Goa com o Extremo Oriente. Foi um rude golpe vibrado
na nossa presença na Índia e que veio a acentuar a decadência do Império que
tinha Goa por capital. A Espanha filipina pouco ou nada fez para socorrer o
Oriente português, dada a sua vocação ultramarina nas Américas, onde o Brasil
constituía a primeira e natural defesa do hemisfério.
No princípio do século XVII aumentou a cobiça das nações marítimas
sobre o Brasil. Corria a fama na Europa da imensa riqueza daquele Estado, o que
era motivo para disputar a soberania portuguesa e obter os benefícios do
comércio da América do Sul. Em 1612,
a esquadra francesa de La Ravardière atacou o Maranhão, com o apoio dos
ameríndios hostis a Portugal. Na ilha de São Luís ergueram um forte que deu
origem a um pequeno burgo que se tornou a capital do Brasil francês. Filipe III
reagiu à ameaça e enviou várias frotas para expulsar os invasores. Graças ao
ardor de Matias Albuquerque,
capitão de Pernambuco, em 1615 era
possível vencer o inimigo no seu principal bastião. A vitória obrigou a coroa a
providenciar na defesa e povoamento do Maranhão e do Pará, olhando de frente
para a grandeza da Amazónia.
Mais grave foi a ameaça militar dos Estados Gerais, que pretendiam
criar na zona do Nordeste um Brasil holandês. A Companhia das Índias Ocidentais
pretendia obter direitos sobre o tráfico com a África Meridional e as costas da
América. Com grandes frotas e gente treinada na actividade marítima e
comercial, a Holanda desafiava o princípio do mare clausum, querendo
forjar um império ultramarino à custa das possessões portuguesas e espanholas
da América. Um ataque de surpresa, em 1624,levou
à conquista de Salvador, notícia que ao chegar ao Reino causou a maior emoção.
No ano seguinte, uma frota enviada de Lisboa pôde reconquistar a capital do
Brasil. Mas os Flamengos não desistiram do seu ambicioso plano e decidiram tomar
a capital de Pernambuco, ponto mais vulnerável para a sua fixação no Brasil.
No ano de 1630, com a ajuda
de uma poderosa armada e aproveitando a presença em Lisboa do capitão Matias
Albuquerque, atacaram Olinda,
que não tardou a render-se. Nos anos seguintes foram conquistadas outras terras
do Nordeste, ao ponto de em 1640 já
dominarem as cinco capitanias ao norte do rio São Francisco. Eram as esperanças de as recuperar, como
escreveu o padre António Vieira, não
quase, se não de todo perdidas. A realeza filipina vivia no pavor da
conquista flamenga, uma vez que já se encontrava no Brasil um grande cabo de
guerra, o conde Maurício de Nassau, com o fim de mover uma luta sem quartel aos
Portugueses. Era a guerra, no sentido mais completo do termo, que Nassau
lançava para a conquista do grande Estado, de modo a impor-lhe o domínio
político, económico e militar da Holanda. Só com a Restauração, ao longo de
uma luta que durou catorze anos, seria possível expulsar os invasores e
conferir de novo ao Brasil a plenitude da soberania portuguesa.
As alterações de Évora
Para acorrer aos encargos militares da Espanha, decidiu o conde-duque
de Olivares impor novos impostos a Portugal. Mal recebida dos povos foi essa
pressão fiscal, que por meio do subsídio voluntário atingiu, em 1628, aquantia de 200 mil cruzados para
socorro do Estado da Índia. Dois anos depois, mais tributos foram lançados para
preparar uma frota destinada a expulsar os Holandeses de Pernambuco. Veio, em
seguida, o imposto da meia anata,
ou seja, metade do produto anual ou dos proventos de uma renda ou ofício.
Foi
grande a reacção dos povos, o que originou uma série de motins em muitas cidades
e vilas. Tal facto irritou Olivares que não quis aceitar as queixas
gerais contra a pressão fiscal que Filipe IV impusera ao Reino. Desde então, o
primeiro-ministro insistiu na política centralista, com o objectivo de integrar
Portugal na coroa vizinha. Em 1634,
foi nomeada D. Margarida, duquesa de Mântua, para governadora de Portugal,
tendo como secretário de Estado um português que deixou triste fama na
história: Miguel Vasconcelos, fiel servidor da coroa filipina».
In Joaquim Veríssimo Serrão, O Tempo dos Filipes em Portugal e no
Brasil (1580-1668), Edições Colibri, Estudos Históricos, Lisboa, 1994, ISBN
972-8047-58-4.
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