domingo, 3 de dezembro de 2023

Os Pilares da Terra. Ken Follett. «Quem é você? Meu nome é Tom e sou pedreiro. Foi o que pensei. O que o traz aqui? Estou procurando trabalho, respondeu, prendendo a respiração. John sacudiu a cabeça imediatamente. Não posso empregar…»

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«Seguiram o carro de boi até ao canto do adro onde as pedras estavam empilhadas. Os bois, agradecidamente, mergulharam a cabeça no bebedouro. Onde está o mestre construtor?, perguntou o carroceiro a um pedreiro que passava. No castelo, foi a resposta do pedreiro. O carroceiro balançou a cabeça e virou-se para Tom. Você o encontrará no palácio do bispo, creio. Muito obrigado. Eu que agradeço.

Tom deixou o adro com Agnes e as crianças atrás. Refizeram seus passos pelas ruas apinhadas e estreitas até à frente do castelo. Ali havia outra vala seca e uma segunda imensa fortificação de terra que cercava a praça-forte. Atravessaram a ponte. Na casa da guarda, de um lado do portão, um homem corpulento de túnica de couro estava sentado, contemplando a chuva. Trazia uma espada. Tom dirigiu-se a ele: Bom dia. Sou chamado de Tom Construtor. Quero falar com o mestre construtor, John de Shaftesbury. Está com o bispo, respondeu o guarda indiferentemente. Eles entraram. Como a maioria dos castelos, aquele era uma colecção de edifícios de estilos diversos dentro de uma muralha de terra. O pátio ficava a cerca de cem jardas. Em posição oposta à do portão, do lado mais distante, estava a imponente fortaleza, a última cidadela em tempo de ataque, erguendo-se bastante acima das fortificações, a fim de ter boas condições de observação. À esquerda via-se um agrupamento de casas baixas, a maioria de madeira: um estábulo comprido, uma cozinha, uma padaria e diversos armazéns. Havia um poço no meio. À direita, tomando quase toda a metade norte do conjunto, ficava uma grande casa de pedra que obviamente era o palácio. Era construído no mesmo estilo da nova catedral, com pequenos portais e janelas caracterizadas por terem a parte superior arredondada, e tinha dois andares. Era nova; na verdade, alguns pedreiros ainda estavam trabalhando num canto, aparentemente construindo uma torre. A despeito da chuva, havia muita gente no pátio, entrando ou saindo e correndo de uma construção para outra: homens de armas, sacerdotes, comerciantes, operários da obra e criados do palácio.

Tom podia ver diversas portas no palácio, todas abertas, a despeito da chuva. Não estava bem certo do que deveria fazer a seguir. Se o mestre construtor estava com o bispo, talvez não devesse interromper. Por outro lado, o bispo não era um rei, e Tom era um homem livre e um pedreiro em busca de trabalho legítimo, não um abjecto servo com alguma queixa. Decidiu ser ousado. Deixando Agnes e Martha, atravessou com Alfred o pátio lamacento e entrou pela porta mais próxima do palácio. Os dois se viram numa pequena capela com o tecto abobadado e uma janela na outra extremidade, por cima do altar. Perto da porta, um sacerdote estava sentado a uma mesa alta, escrevendo rapidamente em papel velino. Ele ergueu os olhos. Onde está o mestre John?, perguntou Tom bruscamente. Na sacristia, respondeu o sacerdote, indicando com a cabeça uma porta na parede lateral.

Tom não pediu para falar com o mestre. Achou que se agisse como se estivesse sendo esperado perderia menos tempo. Atravessou a capelinha com algumas passadas e entrou na sacristia. Era uma câmara pequena e quadrada, iluminada por muitas velas. A maior parte do chão era tomada por uma caixa com areia, muito rasa. A areia fina tinha sido perfeitamente alisada com uma régua. Havia dois homens dentro da sacristia. Ambos olharam rapidamente para Tom e voltaram sua atenção para a areia. O bispo, um velho enrugado de olhos brilhantes, estava desenhando na areia com uma varinha pontuda. O mestre construtor, usando um avental de couro, o observava com ar paciente e expressão céptica. Tom aguardou em ansioso silêncio. Tinha que causar boa impressão; ser cortês, mas não servil, e demonstrar conhecimento sem ser presunçoso. Um mestre artesão deseja que os aprendizes sejam tão obedientes quanto talentosos.

Tom sabia disso por sua própria experiência como empregador. O bispo Roger estava esboçando um prédio de dois andares com grandes janelas dos três lados. Era um bom desenhista, fazendo linhas rectas e perfeitos ângulos de noventa graus. Fez uma planta e uma vista lateral da casa. Tom pôde ver que jamais seria construída. Aí está, disse o bispo ao acabar. O que é?, perguntou John, virando-se para Tom. Fingindo pensar que ele tivesse pedido sua opinião do desenho, disse: Não se pode ter janelas tão grandes assim numa cripta. O bispo fitou-o irritado. É uma sala de estudos, não uma cripta. Cairá do mesmo modo. Ele tem razão, disse John. Mas é necessário ter luz para poder escrever. John deu de ombros e virou-se para Tom. Quem é você? Meu nome é Tom e sou pedreiro. Foi o que pensei. O que o traz aqui? Estou procurando trabalho, respondeu, prendendo a respiração. John sacudiu a cabeça imediatamente. Não posso empregar você. O coração de Tom pareceu parar. Teve vontade de girar nos calcanhares, mas aguardou polidamente para ouvir as razões. Já estamos construindo aqui há dez anos, prosseguiu John. Muitos dos pedreiros já possuem casas na cidade. Estamos chegando ao fim, e agora tenho mais pedreiros na obra do que preciso na realidade». In Ken Follett, Os Pilares da Terra, 1989, Editorial Presença, 2007, ISBN 978-972-233-788-5

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