sábado, 14 de abril de 2018

Dona Estefânia de Hohenzollern. Maria Antónia Lopes. «Vilhena, um ex-ministro monárquico já então muito idoso, ficou fascinado pela alma pura, da jovem, chegando a considerá-la a mais notável das rainhas…»

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Rainha que o povo amou. Estefânia de Hohenzollern-Sigmaringen (1837-1859)
«(…) Mendes dos Remédios, em 1903, num prefácio à edição de cartas de Pedro V, é o primeiro a referir-se ao dispendioso e luxuosíssimo enxoval de dona Estefânia, que, aliás, tinha sido descrito quando a rainha chegou a Portugal, mas que os biógrafos omitiram, por certo para não contrariarem as qualidades de modéstia e simplicidade que lhe exaltavam. Em 1922 Júlio Vilhena publicou a correspondência que dona Estefânia manteve com a mãe, 50 cartas redigidas entre 6 de Maio de 1858 (em viagem para Portugal) e 6 de Julho de 1859, dois dias antes de adoecer. Trouxe também a público sete cartas que a princesa endereçara ao noivo. Vilhena, um ex-ministro monárquico já então muito idoso, ficou fascinado pela alma pura, da jovem, chegando a considerá-la a mais notável das rainhas, de Portugal. Fez preceder a publicação de um estudo cuidadoso, onde tentou compreender a personalidade de Estefânia, apontando características que até aí não eram conhecidas, como o seu pragmatismo e capacidades de análise política. Júlio Vilhena revela possuir sensibilidade e argúcia, mas, como não podia deixar de ser, reflecte o pensamento do seu tempo, muito marcado por ideias feitas relativamente às mulheres e ao que estas deveriam e desejavam ser. Foi também este autor que em 1921 tornou conhecido um assunto que era sussurrado desde que a rainha morrera, a única polémica que a sua vida suscitou: a possível virgindade à data da morte.
Depois de 1922 pouco ou nada foi acrescentado ao conhecimento historiográfico sobre dona Estefânia, nem ao nível da informação factual, nem no plano da interpretação, apesar de tanto se haver escrito sobre Pedro V. Mas com a publicação das cartas que este escreveu a Alberto de Inglaterra, marido da rainha Vitória, e ao conde do Lavradio, editadas por Ruben Andresen Leitão, e, mais recentemente, as do príncipe Alberto para o rei de Portugal, publicadas por Maria Filomena Mónica, esclareceu-se devidamente como surgiu o nome de Estefânia para rainha de Portugal e os meandros do processo que culminou no casamento.
Não consegui localizar documentação inédita produzida por dona Estefânia ou a ela respeitante. As suas cartas, assim como as do marido, todas publicadas, serão, pois, a principal fonte deste estudo que muito se irá socorrer das suas próprias palavras. Apesar disso, é possível reapreciar a vida desta rainha e matizar a sua personalidade, analisando a correspondência contínua, pormenorizada, franca e íntima que dirigiu à mãe durante os meses que residiu em Portugal. Estes documentos permitem chegar à vida privada e aos sentimentos, quase sempre inacessíveis aos historiadores. Tem passado despercebida a ligação da família de dona Estefânia aos Bonapartes, que será esclarecida. Quanto à apreciação da relação conjugal, afasto-me da interpretação comum, pois não creio que Estefânia tenha sido realmente feliz no seu casamento. Pedro, sim. Mas Pedro não era Estefânia. Admito estar equivocada na minha leitura, embora, com as fontes actualmente disponíveis, me pareça difícil chegar a outra conclusão. Aguardemos, contudo, que um dia surja documentação inédita, nomeadamente em arquivos alemães.

A família
Estefânia Hohenzollern-Sigmaringen nasceu a 15 de Julho de 1837 em Krauchenwies, perto de Sigmaringen, no actual estado alemão de Baden-Württemberg, no Sul da Alemanha. De seu nome completo, Estefânia Frederica Guilhermina Antónia Hohenzollern-Sigmaringen, pertencia ao ramo católico dos Hohenzollern, família reinante da Prússia, e sob a qual a Alemanha será unificada. Mas quando Estefânia nasceu, a família Sigmaringen era ainda soberana no seu principado homónimo que ficava encravado no reino de Würtremberg, confinando a sul com o grão-ducado de Baden e cortado ao meio pelo de Hohenzollern-Hechingen.
Em 1806 o principado de Sigmaringen integrou a Confederação do Reno, sob a protecção do imperador Napoleão Bonaparte. Depois da derrocada deste, passou à Confederação Germânica, tutelada pelo imperador da Áustria. Na luta pela hegemonia do espaço alemão entre a Casa de Habsburgo, da Áustria, e a Casa de Hohenzollern, da Prússia, esta saiu vitoriosa ao fim de um processo de vários decénios em que gradualmente foi incorporando os estados germanófonos. O de Sigmaringen integrou-se na Prússia em 1849/1850, por cessão e abdicação de Carlos António, pai de Estefânia, a favor do rei prussiano, que se tornou chefe representante dos Hohenzollern. Em contrapartida, o chefe da família Sigmaringen ficava com prerrogativas de segundo príncipe da Casa Real prussiana, recebia uma pensão anual e conservava todos os seus bens. Depois, entre 1858 e 1862, Carlos António Hohenzollern-Sigmaringen será ministro-presidente da Prússia». In Maria Antónia Lopes, Rainha que o povo amou, Dona Estefânia de Hohenzollern, Círculo de Leitores, 2011, ISBN 978-972-424-718-2.

Cortesia de CLeitores/JDACT