quinta-feira, 12 de abril de 2018

Maria da Fonte. Maria João F. Gouveia. «A par da Balaio, a que mais consenso gera é “Maria Angelina”. E é esta a minha Maria da Fonte! Aquela que, a meu ver, em si encerra todas as outras»

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A rainha do povo
«(…) Numa questão de meses o governo caía, Cabral era desterrado para Espanha e a rainha era obrigada a nomear novo executivo, que confiou ao duque de Palmela. O novo chefe do governo mandou desmantelar as juntas governativas de cariz popular e burguês, que haviam sido formadas um pouco por todo o país. Mas Cabral, a partir do seu exílio, planeava um golpe de Estado, em conluio com Sua Majestade, e não muito depois, o poder régio dava posse ao marechal Saldanha, com promessas de abolir os tão odiados novos impostos. Tendo provado já o doce sabor da liberdade e do exercício do poder local, as classes mais baixas não aceitaram a dissolução das suas juntas, e a revolta, que, para além de Maria da Fonte passou também a chamar-se Revolução do Minho, estendia-se já a toda a nação. Era a Guerra da Patuleia que se iniciava, travada entre as forcas governamentais e as da autoproclamada Junta do Supremo Governo Provisório do Reino, que fazia frente ao poder régio. Às tropas do poder régio aliaram-se, em certas ocasiões, os homens do Partido Legitimista, que, aproveitando a instabilidade que varria Portugal, procuravam trazer de volta e devolver ao trono Miguel I, o rei deposto.
O conflito prolongou-se por oito meses, com avanços e recuos de ambas as partes, sagrando-se a rainha vencedora, por intervenção das tropas estrangeiras, cujo apoio solicitou. Pelo caminho perderam-se muitas vidas, o povo conquistou alguns direitos, várias vilas ascenderam a cidades, e os políticos alcançaram e perderam postos, numa dança interminável. É neste contexto que se desenrola a história de Maria da Fonte, símbolo do poder do povo, que hoje é cantada em hinos e canções e homenageada em estátuas pelo país fora. Exaltada ou vilipendiada pelos autores (como por Feliciano Castilho e pelo padre Casimiro Vieira, respectivamente), certo é que todos convergem num ponto: Maria da Fonte foi uma mulher que deu voz à voz do povo, incendiando-lhe os peitos contra os desmandos das autoridades cabralistas. Ao seu grito se juntaram de imediato outras mulheres, alguns padres descontentes com a laicização do Estado e com a extinção das ordens religiosas, e, mais tarde, os homens, quando elas, enfim, regressaram aos seus lares.
Contemporâneos, romancistas e historiadores foram-lhe atribuindo várias identidades, quer baseando-se em fontes fidedignas, quer por questões políticas ou por mero romantismo. Desde a Maria da Fonte do Vido, de Camilo Casteio Branco, à taberneira Maria Luiza Balaio, a Joaquina Carneiro, Josefa Caetana, Joana Maria Esteves, Maria Mota, ou à doceira de Calvos, vários foram os rostos que se concederam à heroína do povo. A par da Balaio, a que mais consenso gera é Maria Angelina. E é esta a minha Maria da Fonte! Aquela que, a meu ver, e de acordo com o resultado da minha pesquisa, em si encerra todas as outras. A minha protagonista é feita de um entretecer de factos históricos e romanceados, ora reais, ora imaginados. Assim, a Maria da Fonte que aqui retrato é uma jovem lavradeira, rebelde e respondona, que foi servir para a casa de uma família burguesa minhota. Foi lá que conheceu um jovem da Alta Burguesia, Túlio Vila Rosa, por quem se apaixonou. Quando o patrão, amigo desse jovem, tomou conhecimento do facto, despediu-a e Maria voltou para a sua vida no campo, na Póvoa de Lanhoso, sua terra natal.
Por esta altura, já as políticas do Administrador do Concelho geravam grande descontentamento. E foi em resposta a esta situação que, quatro anos mais tarde, a populaça se alevantou, enraivecida, dando origem à insurreição. No calor dos confrontos, Maria conheceu José Maria Si1va, um bandido amigo dos pobres, conhecido como O Covêlo, e com ele se envolveu». In Maria João Fialho Gouveia, Maria da Fonte, Topseller, 20/20 Editora, 2017, ISBN 978-989-886-955-5.

Cortesia de Topseller/20/20 E/JDACT