sexta-feira, 5 de abril de 2013

O Vaticano contra Cristo. Religiões. Tradução de José A. Neto. I Millenari. « O verdadeiro amigo não é aquele que te enxuga as lágrimas mas aquele que te impede de as verter. … seria mais prático colocar o nome do bom samaritano no índex...»

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Escândalo necessário
«Pelo contrário, os originais, os espontâneos, os não conformistas, os inflexíveis perante as humilhações, os lineares e indomáveis capazes de desmascarar compromissos sibilinos e condicionamentos opressivos, oportunismos indignos e servilismos despropositados, ficam, por vezes, isolados, são progressivamente marginalizados, e depois descredibilizados, expulsos, suspeitos e escarnecidos, obrigados a sofrer incríveis frustrações com origem em atoardas e insinuações gravosas cozinhadas nas suas costas. Esta categoria de pessoas dotadas de firme inflexibilidade desmente o provérbio chinês que diz:
  • Quando sopra o vento todas as canas devem dobrar-se por sua vez.
Profissionais dos melhores, a sua permanência é já uma condenação em acto, engolidos no anonimato de um campo de trabalhos forçados, no abismo do silêncio. Uma coisa é tentar fazer a leitura de tudo isto e outra é vivê-lo, dia-a-dia, na própria pele. Muitos juízes severos, rasgando as vestes, apontarão o dedo acusador, indignados, espantados, desgostosos, hostis contra quem optou por esta forma de informação e reflexão por eles considerada dessacralizante. De nariz encrespado, dizem que teriam procedido com maior moderação em função dos compromissos com quem toca o sino. Quando a crítica em surdina se transforma em protesto corajoso, salta a mola do aparelho defensivo da maioria alinhada em defesa do superior que, elogiando os fidelíssimos, exorta-os a acreditar, a obedecer e a combater o inimigo que constantemente tece emboscadas contra a Igreja, o que, ao fim e ao cabo, está subentendida no sou eu. Como o tirano que instiga em silêncio, pensando, assim, poder satisfazer a multidão agitada. Por servil conformismo e por submissão estes juízes severos e bem pensantes apressar-se-ão a condenar um semelhante livro: rasgando as vestes, ridicularizarão os audazes, definindo-os como incapazes, inaptos, rebeldes, insubordinados, insatisfeitos, rancorosos, exagerados, desprezíveis, e assim por diante. Como se fizessem o papel da filha de Príamo, que sem que a acreditassem, predizia a destruição de Tróia, os de bem com a lei defini-la-ão Cassandra de previsões catastróficas e que é necessário não dar qualquer crédito.
Uma ideia nova, desde que contrária ao que é normal, é ordinariamente rejeitada a priori por esta maioria que se recusa a considerá-la com seriedade. Isso porque é costume conferir-se um carácter sacro ao que habitualmente se vive no próprio meio; o contrário disso é por si mesmo dessacralizante. O bem não pode estar em oposição a si mesmo, apenas o mal. Só que se faz confusão grosseira sobre os conceitos de bem e de mal. Procura-se, por todos os modos, não tornar público o mal e isto para não enfrentar o fastidioso incómodo de dever eliminá-lo, fazendo com que dê lugar ao bem. O podre existe, ninguém o nega, mas porquê exibi-lo? Ocultar sob a venda a chaga gangrenada não atormenta a consciência doente. Pôr a nu uma ou as cinco chagas da Igreja geraria, ódio, vingança e perseguição; seria mais prático colocar o nome do bom samaritano no índex...
Os bem pensantes julgam que notícias do género, uma vez do domínio público, além do escândalo e do descrédito da cúria trariam graves consequências também para outros meios. O melhor será calar tudo, exactamente como se fez com o segredo de Fátima; é melhor não o tornar público. Pelo contrário, René Laurentin diz:
  • A insistência e a virulência dos profetas e também dos apóstolos de Cristo escandalizaram muitas vezes o conformismo dos seus contemporâneos. Para impor certas instruções, às vezes é necessário chocar alguém.
Deste autor se faz eco Teixeira:
  • O verdadeiro amigo não é aquele que te enxuga as lágrimas mas aquele que te impede de as verter.
Os espíritos tacanhos e estéreis acusam e condenam sempre os homens corajosos que têm zelo e entusiasmo para semear. Ir contra a corrente, virtude do homem de carácter forte, é entendido no ambiente da cúria como uma falta grave, como insubordinação, e por consequência um escândalo a encobrir». In I Millenari, Via col vento in Vaticano, Kaos Edizioni, 1999, O Vaticano contra Cristo, tradução de José A. Neto, Religiões, Casa das Letras, 2005, ISBN 972-46-1170-1.

Cortesia Casa das Letras/JDACT