domingo, 13 de junho de 2010

Trindade Coelho: Um escritor, magistrado e político português. A sua obra reflecte a infância passada em Trás-os-Montes, num ambiente tradicionalista que ele fielmente retrata

(1861-1908)
Mogadouro
Cortesia de bragancanet
José Francisco Trindade Coelho, foi um escritor, magistrado e político português. A sua obra reflecte a infância passada em Trás-os-Montes, num ambiente tradicionalista que ele fielmente retrata, embora sem intuitos moralizantes. O seu estilo natural, a simplicidade e candura de alguns dos seus personagens, fazem de Trindade Coelho um dos mestres do conto rústico português. Fiel a um ideário republicano, dedicou-se a uma intensa actividade pedagógica, na senda de João de Deus, tentando elucidar o cidadão português para a democracia.
Cortesia de bragancanet
A terceira etapa dos estudos fixa-se em Coimbra, onde concluiu o curso de Direito. Embora os pais fossem ricos, a mãe morreu ainda ele era jovem, a verdade é que ele chumbou no 1.' ano do curso de Coimbra e o pai cortou-lhe a mesada, pelo que Trindade Coelho teve que arranjar forma de ultrapassar as dificuldades. Começou a dar explicações e a escrever em jornais. Entretanto casou e apareceu um filho, facto que mais complicou a sua vida, enquanto estudante. Chegou a ter um «esgotamento».
E ele próprio escreveria do ambiente de Coimbra: «aquela vida em que estive metido e que nunca se deu comigo nem eu com ela, mas em que nunca me dei razão porque lha atribuía a ela e a mim uma inferioridade que mais pesava por ser sincera».
Nesse período escrevia nos jornais com o pseudónimo de Belistírio. Também fundou, nessa época, duas publicações: Porta Férrea e Panorama Contemporâneo. Após a conclusão do curso permaneceu em Coimbra, como advogado. Mas a clientela era pouca e ele enveredou pela carreira administrativa. Ingressa na magistratura e é colocado como Delegado do Procurador Régio, na comarca de Sabugal. Sabe-se que para obter esse lugar, foi precisa a «cunha» de Camilo Castelo Branco, que admirava, literariamente Trindade Coelho. Sabe-se que valeu a pena porque foi Trindade Coelho um magistrado de elevadíssima craveira moral.
Cortesia de bragancanet
Foi depois transferido para a comarca de Portalegre. Aí fundou dois jornais: Gazeta de Portalegre e Comércio de Portalegre. Entretanto granjeara fama e os políticos da época quiseram fazer dele um deputado. Como não podia candidatar-se pelo círculo onde trabalhava, foi transferido para Ovar. A última etapa profissional foi Lisboa, onde não teve tarefa fácil por causa do Ultimato Inglês, durante o qual ele teve que fiscalizar a imprensa da capital.
Desgostado com as críticas que lhe faziam transferiu-se para Sintra, em 1895. Chegou a ir a África (Cabo Verde) defender 33 presos políticos. Ao fim de 3 meses regressou vitorioso, porque conseguiu libertar os presos, prendendo os acusadores. Continuou a escrever nos jornais: Portugal, Novidades, Repórter e fundou a Revista Nova, onde publicou os Folhetos para o Povo. Era um homem inconformado. Nem a fama de magistrado, nem o prestígio de escritor, nem a felicidade conjugal conseguiam fazer de Trindade Coelho um cidadão feliz.
Cortesia de bragancanet
À medida em que avançava no tempo mais se desgostava com a vida, pelo que o desespero o levou ao suicídio.
Deixou uma obra variada e profunda, distribuída por quatro vertentes. Jornalismo, carácter jurídico, intervenção cívica e literária. Algumas obras:
  • Os Meus Amores (1891);
  • A ABC do Povo (1901);
  • A Minha Candidatura por Mogadouro (1901);
  • Cartilha do Povo (1901);In Illo Tempore (1902);
  • O Primeiro Livro de Leitura (1903);
  • Segundo Livro de Leitura (1904);
  • Terceiro Livro de Leitura (1905);
  • Manual Político do Cidadão Português (1906);
  • Autobiografia e Cartas (1910 - póstumo);
  • O Senhor Sete (1961 - póstumo);
  • O Desajeitado (2001 - póstumo).
Cortesia de bragancanet
Em 1961 comemorou-se o primeiro centenário do seu nascimento. E nessa altura publicou-se um volume: O Senhor Sete, onde se reuniram os seus disperses. Há também a sua Autobiografia, por ele escrita, em 1902, - dirigida à sua tradutora alemã Louise Ey. Esta autobiografia, quase sempre aparece na parte final da edição de Os meus amores. Cortesia de bragancanet
Cortesia de wook
«Formado em Direito na Universidade de Coimbra em 1885 (tempo esse cuja memória evoca no livro In Illo Tempore, 1902), e depois de breve período em que exerceu advocacia no Porto, decidiu-se pela magistratura, tendo sido nomeado procurador régio, sucessivamente para o Sabugal, Portalegre, Ovar e Lisboa. Revelando-se um magistrado íntegro e um homem de bem, conjugou o exercício da sua profissão com o cultivo das letras, que iniciou ainda estudante, tendo a sua passagem pelas diversas cidades em que viveu ficado assinalada pela fundação de uma série de jornais, desde A Porta Férrea e Panorama Contemporâneo, em Coimbra, à Revista Nova ou à Revista de Direito e Jurisprudência, em Lisboa. Generoso, sonhador e entusiasta, com uma enorme capacidade de trabalho alternando com graves crises de esgotamento nervoso que o deixavam prostrado (foi na sequência de uma dessas crises que se suicidou), Trindade Coelho interessou-se pela pedagogia, pelo folclore e pelos estudos etnográficos, pela jurisprudência e pela política, para além da produção propriamente literária.
Nunca tendo sido tentado por obras de grande fôlego, é no domínio da crónica, da fábula, do conto, que se revelam os seus melhores dotes («Contos?... Foi afinal a única coisa que tentei... a única coisa que eu fiz...»). As suas histórias simples e comoventes (diz ele que o conto se deve alimentar quase exclusivamente de emoção) têm por cenário o seu torrão natal – a paisagem é a do planalto transmontano com as suas árvores, os seus bichos, as suas gentes. O seu contar é ainda e essencialmente uma evocação do paraíso perdido da infância, de um lugar de certa maneira idealizado e utópico (em Os Meus Amores, que é a sua obra principal, confessa formalmente que as suas narrativas são talvez saudades).
Esta visão, que exprime a resistência de uma mentalidade predominantemente rural e tradicional ao avanço da vida urbana, é, de resto, uma constante em vários outros contistas da mesma época. Combinando habilmente este lirismo saudosista com uma exacta descrição da realidade (que o leva, por exemplo, a recriar com especial cuidado a linguagem oral e popular, sobretudo nas cenas dialogadas), o realismo de T. C. adopta uma feição particular, misto de rusticidade e delicadeza. Trindade Coelho pode ainda enfileirar na estirpe de Castilho e João de Deus pela preocupação com o analfabetismo, publicando e até distribuindo, gratuitamente, folhetos de iniciação às primeiras letras. Na mesma linha de preocupações pedagógicas escreveu três livros de leitura e uma série de fábulas e de crónicas moralizadoras para crianças – «[...] se um dia puder edificar uma escola, meto-me nela e ensino meninos», escreve ele, numa carta dirigida a Augusto Moreno, em 1902. É ainda de salientar o fundo saber das coisas populares, reunido em O Senhor Sete, e a vastíssima correspondência, em grande parte ainda inédita, que nos dá preciosas informações não só sobre a sua vida particular como, sobretudo, das suas relações com importantes vultos da cultura da época». In Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, Vol. II, Lisboa, 1990

 
(Os Meus Amores, The Project Gutenberg EBook)
Cortesia de bragancanet/Dicionário Cronológico de Autores Portugueses/JDACT