(1923-2010)
Portalegre
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Vendo-a Sorrir
Filha, quando sorris, iluminas a casa
Dum celeste esplendor.
A alegria é na infância o que na ave é asa
E perfume na flor.
Ó doirada alegria, ó virgindade santa
Do sorriso infantil!
Quando o teu lábio ri, filha, a minha alma canta
Todo o poema de Abril.
Ao ver esse sorriso, ó filha, se concentro
Em ti o meu olhar,
Engolfa-se-me o céu azul pela alma dentro
Com pombas a voar.
Sou o Sol que agoniza, e tu, meu anjo loiro,
És o Sol que se eleva.
Inunda-me de luz, sorri, polvilha de oiro
O meu manto de treva!
Guerra Junqueiro, in «Poesias Dispersas»
Canção de Batalha
Que durmam, muito embora, os pálidos amantes,
Que andaram contemplando a Lua branca e fria...
Levantai-vos, heróis, e despertai, gigantes!
Já canta pelo azul sereno a cotovia
E já rasga o arado as terras fumegantes...
Entra-nos pelo peito em borbotões joviais
Este sangue de luz que a madrugada entorna!
Poetas, que somos nós? Ferreiros d'arsenais;
E bater, é bater com alma na bigorna
As estrofes de bronze, as lanças e os punhais.
Acendei a fornalha enorme — a Inspiração.
Dai-lhe lenha — A Verdade, a Justiça, o Direito —
E harmonia e pureza, e febre, e indignação;
E p'ra que a labareda irrompa, abri o peito
E atirai ao braseiro, ardendo, o coração!
Há-de-nos devorar, talvez, o incêndio; embora!
O poeta é como o Sol: o fogo que ele encerra
É quem espalha a luz nessa amplidão sonora...
Queimemo-nos a nós, iluminando a Terra!
Somos lava, e a lava é quem produz a aurora!
Guerra Junqueiro, in «Poesias Dispersas»
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