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A
cidade e o exterior. As muralhas
«(…)
Em Toulouse, a noção de uma comunidade urbana englobando cité e burgo aparece já em
1141 e ela passa a chamar-se Tolosa,
Toulouse.
Do mesmo modo que os heróis cavaleirescos de Chrétien Troyes aprendem a sua
identidade pela revelação do seu nome, a cidade se revela a si mesma e se
afirma perante as outras pela proclamação do seu nome. A cidade adoptou o nome
de cité. Tolosa passa a ser, como
dizem os documentos, urbs et suburbium,
a cidade e o
subúrbio, a cidade e o burgo. A partir de 1190, Tolosa é empregado como termo geral. A consciência da
entidade global tornara-se bastante forte para não exigir a cada passo a
evocação de seus constituintes. Foi encavalada no local do velho muro
romano que separava as duas aglomerações que se construiu a casa comum. Em
1222, os cônsules promulgam um texto que organiza um conselho comum, composto
por metade dos cônsules de cada comunidade. Quaisquer que tenham sido para a
tomada de consciência dos habitantes as consequências da construção e da
existência de uma ou várias muralhas, a importância de seu papel militar é
evidente. Ainda aqui o funcional e o simbólico, o militar e o político
estão estreitamente ligados. Veremos mais adiante a incidência da edificação
das muralhas sobre as finanças urbanas. A guarda e a manutenção desses muros e
das suas portas constituiu desde logo um aspecto da luta dos novos cidadãos
para assumir eles próprios as suas responsabilidades. Mas também, sem que seja
possível distinguir o que prevaleceu, a vontade dos citadinos ou o desejo do
senhor ou do rei, tem-se a impressão de que o desejo de livrar-se desse encargo
de vigilância levou esses senhores ou o rei a conceder mais facilmente ou mais cedo,
contra o seu compromisso de vigiar as portas e os muros, outros privilégios aos
habitantes das cidades. Por outro lado, às vezes vêem-se também estes, longe de
reivindicar essa função de espreita, vigilância e manutenção, tentando
isentar-se dela como do serviço militar.
Em
Clermont, já no primeiro foral que conhecemos, em 1219, o conde Guy II faz estipular
que, em troca do direito para a comunidade urbana de reunir-se e de fazer o que
lhe compete, os cidadãos (cives)
deverão vigiar os muros e as torres e limpar os fossos. Em Montpellier, a
vigilância da muralha parece caminhar de par com a organização dos ofícios.
Desde 1204 a guarda das portas é repartida entre trinta desses ofícios. Ainda
aqui aparece a ambiguidade da relação cidade/campo. A muralha define um espaço
de exclusão, o do mundo rural, mas também é feita para acolher eventualmente,
em caso de guerra, habitantes desse mesmo mundo. A função pode inverter-se e,
em relação à população rural, a muralha pode definir, no interior, um espaço de
refúgio, em conformidade, aliás, com uma das grandes imagens da cidade, a
cidade do refúgio, que o Antigo Testamento lega à cidade medieval. Essa função
tinha sido essencial nas sauvetés.
Por conseguinte, os camponeses, eventuais beneficiários da protecção da muralha
urbana, são chamados com bastante frequência, ao que parece, a participar de
sua vigilância.
Em
Poitiers, os aldeões dos povoados vizinhos colaboravam para a manutenção da
muralha e participavam do serviço de espreita.
Ressaltou-se que os 6km de muralhas, encerrando uma população relativamente
pequena (15.000 habitantes?), requeriam, para ser eficazes, um grande número de
vigias, de reparadores e, em certas ocasiões, de defensores. Durante o nosso
período as muralhas tiveram relativamente pouca utilidade. A paz prevaleceu
quase sempre sobre a guerra e o banditismo organizado em larga escala, como durante
a Guerra dos Cem Anos. No entanto as empresas de Filipe Augusto contra os
ingleses (conquista da Normandia) e os flamengos (campanha de Bouvines), as
expedições militares, sobretudo dos senhores do Norte e, depois, dos reis Luís
VIII e São Luís contra as populações meridionais, e enfim as campanhas de
Filipe, o Belo, contra os ingleses no Sudoeste e contra os flamengos no
Nordeste foram marcadas por um certo número de sítios de cidades». In
Jacques le Goff, O Apogeu da Cidade Medieval, 1980, Livraria Martins Fontes
Editora, 1989, 1992, ISBN 978-853-360-127-1.
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