sexta-feira, 19 de maio de 2017

Xeque-mate da Rainha. Elizabeth Fremantle. «Bem, ela não viveu para dar errado. Talvez isso tenha sido bom. Era o seu maior desejo ver os Parr novamente em ascensão»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) Caminham em silêncio pela longa galeria em direcção aos aposentos de lady Mary. Will parece cismado e Katherine suspeita que esteja pensando que gostaria que fosse ele de luto pela esposa. Os dois se odeiam desde que se conheceram. Anne Bourchier, a única herdeira do idoso conde de Essex, era o prémio que sua mãe havia conquistado quase implorando para o seu único filho. Com Anne Bourchier vieram grandes expectativas, entre elas o título de Essex para levar os Parr um ou dois degraus acima. Mas o casamento não trouxera nada ao pobre Will, nenhum filho, nenhum título, nenhuma felicidade; nada além de desgraça, pois o rei deu o condado a Cromwell e Anne fugiu com um clérigo do interior. Will não conseguia livrar-se do escândalo, era sempre assediado com piadas sobre enganos clericais, esconderijos de padre e mitra. Não via graça nenhuma e, não importa quanto tentasse, não conseguia fazer o rei sancionar o seu divórcio. Está pensando na sua esposa?, pergunta ela. Como sabe? Conheço-o mais do que imagina, Will Parr. Ela teve outro fedelho com aquele maldito padre. Ah, Will, o rei vai acabar mudando de ideia e você poderá fazer de Lizzie Brooke uma mulher honesta.
Lizzie está perdendo a paciência, Will resmunga. Quando penso nas esperanças que a mãe tinha nesse casamento, em tudo que fez para arranjá-lo… Bem, ela não viveu para dar errado. Talvez isso tenha sido bom. Era o seu maior desejo ver os Parr novamente em ascensão. O nosso sangue é bom o bastante, Will. O nosso pai serviu o velho rei e o seu pai serviu Edward IV, nossa mãe serviu a rainha Catherine. Ela conta os familiares nos dedos. Quer mais? Isso é história, Will diz num grunhido. Nem me lembro do meu pai. Só tenho vagas lembranças dele, diz ela, embora se lembre claramente do dia em que foi enterrado; quão indigna ela se sentira por ser considerada jovem demais, aos seis anos, para ir ao funeral. Além do mais, a nossa irmã Anne serviu todas as cinco rainhas e agora serve a filha do rei. E é provável que eu a sirva também. Ela fica irritada com a ambição do irmão, tem vontade de dizer que, se ele se importa tanto com a ascensão dos Parr, deveria buscar favores junto às pessoas certas em vez daquele sujeito. Seymour pode ser tio do príncipe Edward, mas é seu irmão Hertford que tem voz com o rei.
Will começa a sua ladainha novamente, mas parece pensar melhor. Os dois continuam a caminhar em silêncio, serpenteando entre a multidão que circula em frente aos aposentos do rei. Então ele aperta o seu braço, dizendo: o que acha de Seymour?. Seymour? Sim, Seymour…Nada de mais. A sua voz sai entrecortada. Não o acha esplêndido? Não especialmente. Achei que poderíamos tentar arranjar um casamento com Meg. Com Meg?, ela diz bruscamente. Perdeu a cabeça? A cor sumiu do rosto da garota. Ele comeria a pobrezinha viva, pensa Katherine. Meg não vai casar com ninguém por enquanto. Não quando o corpo de seu pai ainda mal arrefeceu. Foi só… Uma ideia ridícula, ela vocifera.
Ele não é o que você pensa, Kit. É um de nós. Com isso ela imagina que Will quer dizer que Seymour é a favor da nova religião. Ela não gosta de ser agrupada com os reformadores da corte, prefere guardar os seus pensamentos sobre o assunto. Aprendeu ao longo dos anos que é mais seguro cultivar certa opacidade ali. Surrey não gosta dele, diz ela. Ah, é só uma coisa de família, nem é sobre religião. Os Howard acham os Seymour arrogantes. Não afecta Thomas. Katherine bufa. Will as deixa admirar a nova pintura do rei que está exposta na galeria. É tão nova que ela consegue sentir o cheiro de tinta; as cores são vívidas, com os detalhes em dourado». In Elizabeth Fremantle, Xeque-mate da Rainha, 2013, Editora Paralela, Editora Schwarcz, 2016, ISBN 978-858-439-003-8.

Cortesia de EParalele/ESchwarcz/JDACT