Novas
Cartas Portuguesas. Ou de
como Maina Mendes pôs ambas as mãos sobre o corpo e deu um pontapé no cu dos
outros legítimos superiores
(…)
Ouvem já, entre isto
e o traçado que cada uma trama em suas vidas, quem se nos aproxima ou espia,
este rego de amores que cresce entre nós, nem de nostalgia, nem de vingança,
como de mães e filhas de uma mesma casa, ou, maior escândalo, como de obreiras
frente à mesma adversa matéria, competentes e competindo e afogando as penas e
depondo a bota à beira-catre, ascesiando de quartel ou convento, retiradas
prevendo a corrosão nas hierarquias e costumes, instaurando a lei de uma nova
irman(dade), dão-se conta do risco? Il me semble que je fais le plus grand tort
du monde aux sentiments de mon coeur, de tâcher de vous les faire connaître en
les écrivant... Está decretada a gravidade desta empresa. O que farei convosco será
grave, ainda que para tanto haja que rir-me. Ou, como hoje, nem tanto».
16/3/71
Eis-nos
«Eis-nos de luta
expostas
sem vencer os dias
as verilhas
certas
no passo retomado
o rever das casas e das causas
o revolver das coisas
que dormiam
Diária é a escolha
o movimento insano
o sossego manso e mais pesado
daquilo que desperta e não
quebramos
daquilo que rasgamos
e dobramos
carta por carta em seu perfil
exacto
Fêmeas somos
fiéis à nossa imagem
oposição sedenta que vestimos
mulheres pois sem procurar
vantagem
mas certas bem dos homens que
cobrimos
E jamais caça
seremos
ou objecto
dado
nem
voluntário odor
de bosque seco
vidro dizemos
pedra
caminhada
em se chegar a nós
de barca
ou vento
Remota viração que se reparte
esta que usamos em cumprir
sustento
de pressuposta amarra
em que ficamos
apartadas dos outros
e
tão perto»
17/03/1971
JDACT
In Maria Isabel Barreno, Maria Teresa
Horta, Maria Velho Costa, Novas Cartas Portuguesas, 1972, edição anotada,
Publicações dom Quixote, 1998, 2010, ISBN 978-972-204-011-2.