sábado, 5 de junho de 2010

Manuel de Arriaga: Primeiro Presidente da República. A defesa da liberdade de consciência, de expressão, de reunião e de associação, estiveram sempre entre os tópicos da sua acção política

(1840-1917)
Horta
Cortesia de wikipédia
Manuel José de Arriaga Brum da Silveira e Peyrelongue, mais conhecido por Manuel de Arriaga, foi um advogado, professor, escritor e político de origem açoriana. Grande orador e membro destacado da geração doutrinária do republicanismo português, foi dirigente e um dos principais ideólogos do Partido Republicano Português. A 24 de Agosto de 1911 tornou-se no Primeiro Presidente eleito da República Portuguesa, sucedendo na chefia do Estado ao Governo Provisório presidido por Teófilo Braga. Exerceu aquelas funções até 26 de Maio de 1915, data em que foi obrigado a demitir-se.

Quadro pertença da família
Cortesia de o leme
Manuel de Arriaga nasceu na casa do Arco, no centro da cidade da Horta, ilha do Faial. Estudou na Universidade de Coimbra. Nesta cidade, cedo se revelou um aluno brilhante e um orador notável. Aderiu ao positivismo filosófico e ao republicanismo democrático, passando a ser frequentador assíduo das tertúlias filosóficas e políticas, onde se destacava pela sua verve e capacidade argumentativa. Esta adesão ao ideário republicano, então considerado subversivo, levou a revoltas familiares. Nessas circunstâncias, foi obrigado a trabalhar para sustentar os seus estudos, e os do irmão, igualmente proscrito pelo pai por adesão a ideologias subversivas. Formou-se no ano de 1865 e no ano seguinte abriu escritório de advogado em Lisboa, cidade onde se fixou.
Fotografia de família
Cortesia de o leme
Nos seus tempos de Coimbra, revelou dotes de cultor da poesia e da literatura, tendo mantido até ao fim da sua vida uma actividade literária e interesses culturais que o integram claramente na Geração de 70. Em 18 de Maio de 1871 foi um dos doze signatários do programa das conferências democráticas do Casino Lisbonense. Tornou-se num membro destacado da geração doutrinária do republicanismo português, afirmando-se como um dos seus principais ideólogos. Afirmava-se partidário entusiasta da democracia, tendo sempre militado no republicanismo unitário e democrático, rejeitando o anticlericalismo e o jacobinismo que marcavam a corrente dominante do republicanismo português daquela época.
No ano de 1878, concorreu pela primeira vez a um lugar de deputado nas Cortes, integrando a lista republicana candidata a um dos círculo eleitorais da cidade de Lisboa (o círculo n.º 96). Apesar da forte campanha que conduziu, foi largamente derrotado, obtendo apenas 456 votos, contra os 1086 sufrágios do vencedor.
Em 26 de Novembro de 1882, numas eleições suplementares, foi finalmente eleito deputado republicano pelo círculo da Madeira. A vitória eleitoral deveu-se a um conjunto de circunstâncias que beneficiaram a sua candidatura: apresentara-se a convite de uma comissão de comerciantes e industriais funchalenses, desiludidos com os partidos do rotativismo, beneficiando da ausência de um candidato do Partido Regenerador. Foi o segundo republicano a tomar assento no parlamento português, juntando-se no parlamento a José Elias Garcia, que ali tinha assento desde 1881.
Manuel de Arriaga iniciou o seu percurso parlamentar apresentando de imediato uma proposta que visava eliminar o juramento de fidelidade ao rei e à Carta Constitucional a que estavam obrigados os parlamentares, proposta que obviamente foi de imediato rejeitada. Durante os dois anos no Parlamento renunciou ao seu vencimento como professor liceal, recebendo apenas o subsídio parlamentar a que tinham direito os deputados. Terminado o mandato, não foi reeleito. Na sua acção como deputado, e mesmo não conseguindo fazer parte de qualquer comissão parlamentar, distinguiu-se pela pertinência das suas intervenções e posições e pela fineza do seu trato. Demonstrando elevados dotes intelectuais e uma cultura superior, aliava a uma oratória brilhante uma grande combatividade política e um elevado rigor ético.
Cortesia do centenariodarepublica
No Partido Republicano Português, o prestígio que conquistara nas Cortes e a sua capacidade intelectual guindaram-no para uma posição preponderante, que manteve entre 1883 e 1892. Revelando-se um orador distinto e tendo dado um forte contributo para a estruturação do partido, foi autor de algumas das suas normas estatutárias e doutrinárias. A partir de 31 de Dezembro de 1891 integrou, com Jacinto Nunes, Azevedo e Silva, Bernardino Pinheiro, Teófilo Braga e Francisco Homem Cristo, o directório do partidário durante o período da sua estruturação.
No ano seguinte, depois de cinco anos fora do Parlamento, a reacção popular ao ultimato britânico de 1890, que levara à dissolução do recém-eleito parlamento, veio abrir uma nova oportunidade para os republicanos. Manuel de Arriaga voltou à ribalta política nacional ao liderar a manifestação organizada a 11 de Fevereiro de 1890 em repúdio ao ultimato britânico e à cedência do governo português. Foi preso durante o evento e conduzido a bordo de um navio de guerra, onde ficou retido até ser libertado por uma amnistia régia.
Aproveitado a indignação popular contra o rei e os partidos do rotativismo, nas eleições gerais realizadas a 30 de Março de 1890 (28.ª legislatura) concorreu novamente pelo círculo de Lisboa, sendo eleito folgadamente, em conjunto com outros dois republicanos, Elias Garcia e Latino Coelho. Foi proclamado deputado a 30 de Abril de 1890, prestando juramento, novamente sob protesto, a 3 de Maio. Nesta segunda passagem pelo Parlamento, com um grupo republicano substancialmente alargado, desempenhou um papel bastante mais interventivo. Apesar de não fazer parte de qualquer comissão parlamentar, começou por re-apresentar a sua proposta de eliminação da obrigatoriedade de juramento, proposta obviamente rejeitada, passando depois a utilizar as Cortes como uma plataforma privilegiada para a sua actividade político-partidária. Considerando-se eleito pelo voto popular, passou a defender acerrimamente a teoria da soberania popular, recusando qualquer solução política que não resultasse directamente da vontade dos cidadãos. A defesa da liberdade de consciência, de expressão, de reunião e de associação esteve sempre entre os tópicos da sua acção parlamentar.
Cortesia de arepublicano
Outra temática constante da sua acção parlamentar foi a defesa dos interesses do povo, por ele entendido como todos os cidadão. Nessa defesa dava grande importância à dignificação das classes menos favorecidas, tendo sido notável o empenho que colocou em 1883 na defesa dos camponeses e operários da Madeira, o círculo que o elegera.

Após a Implantação da República Portuguesa, foi nomeado reitor da Universidade de Coimbra (17 de Outubro de 1910), tendo como vice-reitor Sidónio Pais, outro vulto do republicanismo português. A nomeação foi feita por António José de Almeida, que perante a necessidade de restabelecer a ordem na Universidade. Pouco depois, a 17 de Novembro de 1910, foi nomeado Procurador-Geral da República.
Perante um Partido Republicano Português dividido em facções crescentemente radicalizadas, a 24 de Agosto de 1911 foi eleito Presidente da República Portuguesa, por proposta de António José de Almeida. Sem o apoio da facção dos democráticos de Afonso Costa, recolheu 121 votos em 217, tendo como apoiantes toda a ala moderada do republicanismo português. Com 71 anos de idade, foi o primeiro Chefe do Estado eleito do novo regime.
Cortesia de wikipédia
O seu mandato foi atribulado devido a incursões monárquicas movidas por Paiva Couceiro e à crescente instabilidade política resultante da desagregação do PRP. Nesse ambiente, tentou, sem êxito, reunificar o partido que, entretanto, se desmembrava em diferentes facções. Adversário da hegemonia afonsista da ala radical do PRP, após o Movimento das Espadas, em Janeiro de 1915, Manuel de Arriaga convidou o general Pimenta de Castro a formar governo, dando origem à instauração de uma ditadura, com dissolução inconstitucional do Congresso da República. A decisão deu origem ao descontentamento generalizado dos republicanos, com os parlamentares, reunidos secretamente a 4 de Maio, no Palácio da Mitra, a declaram Manuel de Arriaga e Pimenta de Castro fora da lei e os seus actos nulos. Esta declaração levou a uma revolta, a Revolta de 14 de Maio de 1915.

Cortesia do blogdaruanove
Perante a formação de uma junta militar que reclamava a reposição da ordem constitucional, o bondoso e pacifista Manuel de Arriaga deixou o cargo a 26 de Maio, abandonando em definitivo a vida política, acusado de trair os ideais republicanos democráticos que defendera toda a sua vida. Publicou, em 1916, um livro intitulado «Na Primeira Presidência da República Portuguesa», um verdadeiro testamento da sua acção política.
Em cumprimento da decisão votada por unanimidade pela Assembleia da República, constante da Resolução da Assembleia da República n.º 49/2003, de 4 de Junho, o seus restos mortais foram transladado para o Panteão Nacional de Santa Engrácia.
Cortesia da wikipédia/JDACT