segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

As Egípcias. Christian Jacq. «Ao entrarem no túmulo desta terceira Meresanq, um choque! Uma visão única, um conjunto esculpido que, tanto quanto sabemos, só existe nesta morada eterna»

Cortesia de wikipedia e jdact

Hetep-Heres, a mãe de Queops
O tesouro da rainha, mãe do rei
«(…) Se o estranho túmulo de Hetep-Heres, espécie de relicário que lembra o túmulo de Tutancámon, abrigava os chamados canopos destinados a receber as vísceras da rainha, ignoramos por que razão a múmia foi deslocada, supondo que alguma vez tenha estado no sarcófago. Será que uma alteração do programa arquitectónico levou os construtores a escavar outro túmulo para a rainha? Será que consideravam Hetep-Heres como uma faraó, dispondo assim de uma sepultura para o seu corpo mumificado e outra para o seu ser luminoso? Talvez novas escavações em Dahxur e Gize nos tragam respostas. Esperemos que um fotógrafo ponha o pé no lugar certo...

A enigmática Meresanq
Uma grande linhagem
Os nomes de Quéops, Quéfren e Miquerinos celebrizaram-se graças às suas três pirâmides erigidas no planalto de Gize. Esta prodigiosa quarta dinastia (cerca de 2613-2498 a.C.) viu nascer estes gigantes de pedra, verdadeiros centros de energia espiritual, raios de luz petrificados que permitiam à alma real ascender aos céus para se juntar às divindades e guiar os humanos sob a forma de estrela. Os baixos-relevos das sepulturas desta época mostram-nos um Egipto próspero, cuja riqueza se baseia numa administração rigorosa e eficaz, numa agricultura diversificada, numa criação desenvolvida e num artesanato de excepcional qualidade. Entre as altas personalidades da corte houve três mulheres com o mesmo nome, Meresanq, que parecem formar uma linhagem. Duas possíveis traduções para este nome notável: ou Ela ama a vida ou a Viva (uma deusa, provavelmente Hator) ama-a. Seja qual for a solução, o relacionamento directo de uma linhagem feminina com o conceito essencial de vida sublinha uma vez mais o papel proeminente da mulher na civilização do Antigo Egipto. Não sabemos nada acerca da primeira Meresanq; foi talvez a mãe do faraó Snefru, fundador da quarta dinastia e construtor de duas colossais pirâmides na estação de Dachur. A segunda Meresanq parece ter sido filha de Quéops. A terceira reserva-nos uma magnífica surpresa.
Numa das ruas de sepulturas do planalto de Gize, a leste da pirâmide de Quéops, abre-se a estreita porta de uma bela e grande morada eterna escavada na rocha para Meresanq III. A sepultura fora preparada por uma rainha de nome Hetep-Heres, como mãe de Quéops, mas que não devemos confundir com ela, existe uma dificuldade insuperável em estabelecer as genealogias egípcias! Esta Hetep-Heres era a filha de Quéops; tinha, pois, o nome da sua mãe e era muito dedicada à sua filha Meresanq, a terceira com o mesmo nome, e certamente esposa do rei Quéfren. Ao entrarem no túmulo desta terceira Meresanq, um choque! Uma visão única, um conjunto esculpido que, tanto quanto sabemos, só existe nesta morada eterna. Brotando da pedra, uma confraria formada por dez mulheres de pé, de idades compreendidas entre a adolescente e a mulher madura. (dois grupos distintos: o primeiro formado por três mulheres, encabeçadas pela superior e o segundo por sete, quatro adultas e três mais jovens, por ordem decrescente de estaturas). Quando penetramos pela primeira vez neste lugar que nos enfeitiça, temos a impressão de que estas mulheres estão vivas, que os seus olhos nos contemplam e que continuam a proferir as frases rituais indispensáveis ao bom andamento do mundo. E à medida que permanecemos neste lugar de uma rara força, a impressão confirma-se. Intimamente ligadas à rocha, estas estátuas foram animadas por magia e contêm ainda o ka, o poder imortal que faz delas estátuas da Luz.
Como Meresanq tinha acesso à Casa da Acácia, podemos supor que está representada na companhia das irmãs da confraria, e que a transmissão se faz da mais antiga à mais nova, passando por etapas intermédias. De resto, duas delas abraçam-se: a mais velha pousa o braço esquerdo sobre os ombros da sua discípula, a qual passa o braço pela cintura da sua iniciadora. Um profundo sentimento de comunhão desprende-se deste grupo de dez mulheres unidas para sempre pelos laços de uma mesma experiência de eternidade; contemplando-as no silêncio da capela, compreendemos a verdadeira dimensão das egípcias. A mãe, Hetep-Heres, é igualmente representada com a sua filha Meresanq em diversos episódios rituais, durante os quais a mais velha ensina a sua sabedoria à mais nova; é assim que as duas mulheres exploram os pântanos de barco para colherem flores de lótus. Não se dedicam apenas ao culto das divindades, também preservam o perfume da primeira aurora, quando a vida nasceu da Luz. Durante este passeio de barco, a mãe revela à filha o segredo do lótus, a partir do qual se desenvolveu a Criação». In Christian Jacq, As Egípcias, Edições ASA, 2002, ISBN-978-972-413-062-0.
                                                                                                                            
Cortesia de EASA/JDACT