domingo, 11 de fevereiro de 2018

As Egípcias. Christian Jacq. «O nome da legítima ocupante do local era Hetep-Heres, que provavelmente significa “o faraó é plenitude graças a ela”. Uma grande personalidade, visto que era esposa do faraó Snefru»

Cortesia de wikipedia e jdact

Merit-Neit, a primeira faraó do Egipto?
Uma rainha ao leme
«(…) As escavações arqueológicas revelaram várias sepulturas de mulheres das primeiras dinastias: rainhas, mães de reis ou personalidades da corte; estas descobertas provam o respeito pela mulher e ao mesmo tempo a sua eminente posição nas altas esferas do Estado. Uma destas rainhas, esposa do último faraó da segunda dinastia (cerca de 2700 a.C.), merece especial menção: Ny-Hepet-Maat, o leme pertence a Maat, considerada como a antepassada da terceira dinastia. Embora nada saibamos a seu respeito, o seu nome é revelador. Se por vezes referimos o carro do Estado, os egípcios preferiam dizer o navio do Estado, pois o Nilo era o rio nutriente e a grande via de circulação. O facto de uma rainha ser considerada o leme, demonstra que é capaz de orientar correctamente o barco. É sobretudo assimilada à deusa Maat, a base da civilização egípcia. Podemos traduzir a palavra Maat por Ordem, desde que nela incluamos as ideias de ordem universal, de harmonia cósmica, de eterno equilíbrio do universo, de justiça celeste que inspira a justiça humana, de rectidão, de solidariedade entre os seres vivos, de verdade, de justa repartição dos deveres, de coesão social, de sabedoria. Maat tem na cabeça uma pluma, a rectriz, que permite dirigir o voo das aves; é também ela que inspira a acção quotidiana do faraó. De facto, o seu primeiro papel consiste em colocar Maat no lugar da desordem e da injustiça, lutando contra os defeitos inerentes ao ser humano: o esquecimento, a preguiça, o desinteresse pelos outros, a teimosia cega e a avidez. O faraó deve dizer e fazer Maat, para que o Estado seja o reflexo justo da harmonia cósmica. Por isso, como Assmann demonstrou, o faraó, súbdito de Maat e servo do seu povo, não pode ser um tirano e deve proteger o fraco contra o forte e combater as trevas, é o vínculo que assegura a coesão entre os humanos, o vínculo entre a comunidade dos homens e os poderes criadores. Foi esta concepção grandiosa e efectiva que permitiu que a instituição faraónica durasse três milénios. Para o historiador, a rainha Ny-Hepet-Maat, como Merit-Neit, não passa de uma sombra fugaz; mas, graças aos seus nomes, estas mulheres encarnam a grandeza da aventura egípcia e fornecem-nos a chave para a sua decifração. O facto de Maat ser uma deusa e de as rainhas do Egipto serem as suas encarnações terrestres significa que confiavam à mulher a mais vital das responsabilidades.

Hetep-Heres, a mãe de Queops
No dia 2 de Fevereiro de 1925, a equipa do arqueólogo americano Reisner procedia à exploração do planalto de Gize, no grande cemitério real situado a leste da fenomenal pirâmide de Quéops (cerca de 2589-2566 a.C.), muitas vezes chamada a Grande Pirâmide. Aí se encontram também três pequenas pirâmides de rainhas cujas capelas de culto, abertas sobre a face oriental, dão para uma alameda. Nesse dia, o fotógrafo da expedição decide instalar-se na extremidade setentrional da alameda para tirar fotografias. Como qualquer bom profissional, prepara cuidadosamente o material e assenta o tripé de maneira a estabilizá-lo, uma operação mil vezes repetida, um acto rotineiro. Mas desta vez encontrou um pequeno obstáculo, pois um dos pés enterrou-se numa cavidade. O técnico deparou-se então com uma camada de gesso. Tratava-se, evidentemente, de uma obra humana, uma espécie de ardil destinado a imitar o solo rochoso. Os escavadores encontraram uma trincheira rectangular obstruída por pequenos blocos de calcário que escondiam uma escada prolongada num túnel que conduzia a um poço, também obstruído por pedras. A excitação aumentou: tratar-se-ia de uma sepultura inviolada? A quem pertenceria?
Depois de desobstruírem o poço, os escavadores acederam a um nicho contendo ânforas, o crânio e as patas de um touro embrulhadas em redes: uma oferenda que mitigaria a sede do proprietário da sepultura, que também dispunha do poder criador do touro. A 8 de Março de 1925 chegou-se à câmara funerária, uma pequena sala talhada na rocha. Uma sala... inviolada!

O tesouro da rainha, mãe do rei
A 25 m da superfície do solo encontrava-se, pois, uma sepultura secreta a que nenhum salteador tivera acesso. A presença de um sarcófago levava a crer que haviam descoberto uma múmia, mas estava vazio. Passada a decepção, contemplaram os múltiplos objectos contidos na sepultura, cujo exame exigiu 1500 páginas de notas e 1700 fotografias. O nome da legítima ocupante do local era Hetep-Heres, que provavelmente significa o faraó é plenitude graças a ela. Uma grande personalidade, visto que era esposa do faraó Snefru e a mãe do construtor da Grande Pirâmide». In Christian Jacq, As Egípcias, Edições ASA, 2002, ISBN-978-972-413-062-0.
                                                                                                                            
Cortesia de EASA/JDACT