terça-feira, 7 de janeiro de 2020

A Abadia de Northanger. Jane Austen. «Muito agradável, de facto, ela replicou, tentando em vão esconder um grande bocejo. Queria que ela tivesse dançado, disse a sua esposa; queria que tivéssemos arrumado um parceiro para ela»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) Como é desconfortável, sussurrou Catherine, não ter uma única amizade aqui! Sim, minha querida, replicou a senhora Allen perfeitamente serena, de facto, é muito desconfortável. O que devemos fazer? Os cavalheiros e as damas nesta mesa nos olham como se perguntando o porquê de estarmos aqui. Parece que estamos forçando a nossa entrada no grupo deles. Ah, parecemos. Isso é muito desagradável. Queria que tivéssemos inúmeros conhecidos aqui. Queria que tivéssemos ao menos um conhecido aqui. Seria alguém com quem conversar. É bem verdade, minha querida. E se conhecêssemos alguém, iríamos nos encontrar com ele imediatamente. Os Skinners estiveram aqui no ano passado. Queria que estivessem aqui agora. Não é melhor irmos embora? Não há nem louça ou talheres de chá para nós, veja. Não há mais, de facto. Que provocação! Mas acho que é melhor sentarmos imóveis, pois se pode tropeçar tanto numa multidão como essa! Como está minha cabeça, querida? Alguém me deu um empurrão que temo ter desarrumado meu penteado. Não, na verdade, está muito bem. Mas, querida senhora Allen, você está segura de que não há ninguém que a senhora conheça em toda essa multidão de pessoas? Acho que deve conhecer alguém.
Não, juro. Gostaria de conhecer. Sinceramente, queria ter muitos conhecidos aqui, e então eu lhe arranjaria um parceiro. Eu ficaria tão feliz por você dançar. Lá vai uma mulher esquisita! Que vestido estranho ela está usando! Como é antiquado! Olhe para as costas. Depois de algum tempo, foi-lhes oferecido chá por algum dos seus vizinhos, o qual foi polidamente aceito, e isso levou a uma leve conversa com o cavalheiro que fez a oferta, sendo esta a única vez em que alguém falou com elas durante a noite, até que foram descobertas pelo senhor Allen, que se juntou às duas quando as danças se encerraram. Bem, senhorita Morland, ele disse, directamente, espero que tenha tido um baile agradável. Muito agradável, de facto, ela replicou, tentando em vão esconder um grande bocejo. Queria que ela tivesse dançado, disse a sua esposa; queria que tivéssemos arrumado um parceiro para ela. Eu estava dizendo que ficaria muito feliz se os Skinners estivessem aqui neste Inverno ao invés do último. Ou se os Parrys tivessem vindo, como falaram uma vez. Ela poderia ter dançado com George Parry. Estou tão triste por ela não ter tido um parceiro! Faremos melhor em outra noite, espero consolou o senhor Allen. O grupo começou a se dispersar quando as danças terminaram, sendo o suficiente para deixar espaço para que o restante pudesse caminhar com algum conforto. Agora era a hora para uma heroína que não tinha ainda interpretado um papel mais distinto nos eventos da noite ser descoberta e admirada. A cada cinco minutos, ao desmanchar da multidão, abriam-se mais oportunidades para seus encantos. Ela era agora observada por muitos jovens que não se tinham aproximado dela antes. Nenhum, porém, começou a contemplá-la com arrebatado assombro.
Nenhum sussurro de ansiosa curiosidade começou a circular pela sala. Nem ela foi chamada de divindade por alguém alguma vez. Contudo, estava bonita e, tivessem aquelas pessoas visto Catherine três anos antes, agora eles a teriam achado demasiadamente encantadora. Ela era observada, entretanto, e com alguma admiração, pois, como ela mesma ouviu, dois cavalheiros disseram que ela era uma garota bonita. Tais palavras tiveram o seu devido efeito. Ela pensou imediatamente que a noite fora mais agradável do que ela achara até então. A sua humilde vaidade estava saciada. E ela se sentia mais grata aos dois jovens por esse simples elogio do que uma heroína de genuína qualidade teria estado por quinze sonetos celebrando os seus encantos, e rumou à sua cadeira de bom humor com todos, perfeitamente satisfeita com o que recebeu de atenção pública». In Jane Austen, A Abadia de Northanger, 1802 /1817, Relógio d’Água, 2016, ISBN 978-989-641-596-9.

Cortesia de Rd’Água/JDACT