quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

Os Segredos Perdidos da Arca Sagrada. Laurence Gardner. «Os diários de Petrie foram por ele compilados num livro bastante substancial intitulado Researches in Sinai. Foi publicado por John Murray, Londres, em 1906, mas não durou muito tempo…»

jdact

«(…) Era uma prática padrão, mas infeliz, de os arqueólogos saquearem sítios arqueológicos na terra alheia, trazendo os seus troféus para museus no Ocidente. Esses incluíam não apenas itens portáteis, mas grandes estátuas, obeliscos e mesmo paredes inteiras de lugares como Egipto, Assíria e Babilónia. Os museus e galerias da Grã-Bretanha, da Europa e da América estão cheios de tais itens. Deve parecer lógico que, ao descrever algumas das mais importantes descobertas de Petrie no monte Serábit, eu devesse ter dado detalhes de onde aquilo poderia ser visto actualmente. O facto, porém, é que o butim de Serábit não foi fácil de localizar porque, embora alguns itens tenham ido parar em galerias públicas, muitos foram estrategicamente ocultados do escrutínio aberto. Entretanto, tenho prazer em dizer que consegui certo sucesso; uma lista de alguns museus em que os artigos de Serábit foram colocados pode ser vista em NR. Embora grande número de itens quebrados registados por Petrie não tenha sido removido por encarregados de museus após a expedição de 1904, foram furtados por outros, logo que se revelaram os detalhes da expedição. Consequentemente, não foram encontrados por uma expedição posterior da Universidade de Harvard em 1935.
A razão para muitos dos primeiros artefactos estarem guardados em segredo é que a descoberta de Petrie foi vista com grande desagrado na época; considerou-se que ela contradizia a narrativa do Êxodo dos acontecimentos na montanha sagrada. Foi ali que se disse que Moisés viu a sarça ardente, onde falou com Jeová, queimou o bezerro de ouro e recebeu as Tábuas da Escritura. Na prática, o relatório Petrie não desfigurava o relato bíblico de forma nenhuma; desafiava apenas a interpretação da Igreja da história e a maneira como ela vinha sendo ensinada. Essencialmente, a sua descoberta era contra os regulamentos do Egypt Exploration Fund. O estatuto de 1891 do Fund, Memorandum and Articles of Association, afirma que seus objectivos incluíam a promoção de inspecções e escavações com o propósito de elucidar ou ilustrar a narrativa do Antigo Testamento. Claro, isso significava o Antigo Testamento da forma como era tradicionalmente interpretado, não necessariamente como estava escrito.
Em seguida à morte da rainha Vitória, em 1901, e com o imperialismo britânico num pico de glória, os valores vitorianos ainda eram parâmetro quando Petrie fez sua descoberta em 1904. Esses valores, impostos na sociedade, poderiam hoje ser vistos como intimidações institucionais e não como conceitos válidos; foi preciso o rigor brutal da Primeira Guerra Mundial (dez anos depois) para que houvesse alguma nivelação de atitudes. Mas Petrie, apesar de ser o mais notável arqueólogo da época, sentiu o peso da desaprovação autoritária. Decidiu publicar as suas descobertas logo que voltou, mas viu o seu patrocínio do Egypt Exploration Fund ser cortado. Escreveu no seu relatório: todavia, tenho necessitado confiar no futuro..., no Egyptian Research Account e na British School of Archaeology in Egypt.
Os diários de Petrie foram por ele compilados num livro bastante substancial intitulado Researches in Sinai. Foi publicado por John Murray, Londres, em 1906, mas não durou muito tempo; hoje em dia é muito difícil encontrar cópias. Muito mais tarde, em 1955, a recém-formada e mais bem inspirada Egypt Exploration Sociey (em associação com a Oxford University Press) publicou a sua própria edição referente aos relevos e inscrições do Sinai. Esse trabalho em dois volumes tratava, num primeiro momento, das descobertas de Petrie, mas a segunda parte se concentrava nos manuscritos relacionados dos eminentes egiptólogos Alan H. Gardiner e T. Eric Peet. Eles aperfeiçoaram o trabalho de Petrie para a Society, transcrevendo, relatando e debatendo os hieróglifos e entalhes. Mas onde estavam os artefactos originais de Serâbit el Khâdim? Onde estavam todos os itens que Petrie e os outros haviam descrito? Transpira que, desde 1906, grande parte deles foi mantida atrás de portas trancadas, tendo pouquíssimos itens sido apresentados ao público. Segundo o que se pôde determinar, cerca de 463 artigos foram oficialmente removidos do Templo da montanha, tudo, desde grandes obeliscos e estelas a pequenas varas e tigelas. Felizmente, uma nova geração inteira de indivíduos é responsável pelos artefactos e, ao serem lembrados de sua existência (pois as barreiras do estilo vitoriano não são mais válidas), os curadores começam a mostrar algum entusiasmo a respeito». In Laurence Gardner, Os Segredos Perdidos da Arca Sagrada, Editora Madras, 2004, ISBN-978-857-374-901-4.

Cortesia de EMadas/JDACT