sexta-feira, 29 de junho de 2012

Génese, Emergência e Institucionalização do Serviço Social Português. Alcina Martins. «Os escritos sobre a história do Serviço Social, em Portugal, após o 25 de Abril de 1974, apesar de demonstrarem interesse pela abordagem da temática, são escassos, esparsos, parcelares e com abordagens muito pontualizadas, não chegando a construir uma ‘outra’ leitura da profissão no nosso país»



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Introdução
«Em Portugal a investigação acadêmica sobre o Serviço Social dá os primeiros passos com a abertura do I curso de Mestrado de Serviço Social em 1987, ao abrigo do protocolo de Intercâmbio entre a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e o Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa.
Com a atribuição do grau de licenciatura à formação em Serviço Social (1989 e 1990) e o reconhecimento dessa equiparação a todos os assistentes sociais formados (1991), enceta-se uma nova etapa da profissão em Portugal. Os assistentes sociais inserem-se na carreira técnica superior de serviço social (ficando no mesmo plano que outros profissionais, como os sociólogos e os psicólogos), e abre-se a perspectiva de uma carreira académica e o incentivo à investigação científica.
Numa altura em que a complexidade dos problemas nas sociedades actuais exige cada vez mais um maior relacionamento e diálogo entre o meio académico, as diferentes áreas do conhecimento e as diversas profissões do social, a história do serviço social em Portugal continua a ser muito pouco conhecida dos assistentes sociais e da sociedade portuguesa, tornando-se urgente proceder ao seu resgate.
Considerou-se deste modo pertinente abordar a construção do serviço social português e as relações que vai estabelecendo e tecendo com a sociedade portuguesa, do ponto de vista das conjunturas sócio-históricas e das correntes do pensamento que mais directamente vieram influenciá-lo, privilegiando-se a análise da segunda escola de Serviço Social que se criou em Portugal, Escola Normal Social de Coimbra.
Esta segunda escolha prende-se com o facto de eu ser docente no Instituto Superior Miguel Torga, ex-Instituto Superior de Serviço Social de Coimbra e de esta escola apresentar ainda hoje uma situação particular em relação aos outros Institutos congéneres de Lisboa e do Porto. Estes estavam originariamente ligados ao Patriarcado de Lisboa e à hierarquia e estruturas da Igreja Católica, por interposta ‘Associação de Serviço Social’ que lhes dava suporte jurídico; após o 25 de Abril de 1974 desvincularam-se dessas associações e constituíram-se, na década de oitenta, em Cooperativas de Ensino Superior. Ao invés, o Instituto Superior de Serviço Social de Coimbra manteve-se dependente do órgão de administração regional que adquiriu o alvará da Escola Normal Social, a Junta da Província da Beira Litoral, actualmente designada Assembleia Distrital de Coimbra.
As produções existentes sobre a história do Serviço Social em Portugal, com raras excepções, são contemporâneas da sua institucionalização, datando das décadas de 30 a 50 e continuando ainda hoje a repercutir-se na leitura histórica que se faz da profissão. Nesses trabalhos são arrolados factos, numa perspectiva cronológica e linear em consonância com uma história de feição positivista, sem verdadeiramente se contextualizar o Serviço Social na sociedade portuguesa e sem se atender aos processos sócio-históricos subjacentes à construção desta profissão nos países mais industrializados, sendo omitidas as particularidades do processo português.
Os escritos sobre a história do Serviço Social, em Portugal, após o 25 de Abril de 1974, apesar de demonstrarem interesse pela abordagem da temática, são escassos, esparsos, parcelares e com abordagens muito pontualizadas, não chegando a construir uma ‘outra’ leitura da profissão no nosso país. Em trabalhos mais recentes e com outra amplitude, a ‘fundação’, do Serviço Social aparece associada à conjuntura do Estado Novo salazarista, à efectiva criação das escolas, identificando-se com a Doutrina Social da Igreja, suporte do próprio regime, sob a influência do Serviço Social franco-belga. Se bem que isso seja uma faceta da emergência e institucionalização do Serviço Social português, não são abordadas outras que não se reivindicam do corporativismo e que apresentam influências do Serviço Social norte-americano. Atendendo a que o processo de construção do Serviço Social português não foi nem linear, nem homogéneo, nem restringiu a sua história ao modelo corporativista, há que desvendar esses outras suas vertentes.
Não existe uma tradição de estudos sobre a dimensão histórica do Serviço Social em Portugal e a consequente produção teórica e bibliográfica. Assim, optou-se por fazer a pesquisa a partir de fontes primárias. Houve que proceder a todo um levantamento e recolha de informações, que, por se encontrarem dispersas, por compilar e por tratar, exigiu um redobrado esforço». In Alcina Martins, Génese, Emergência e Institucionalização do Serviço Social Português, Fundação para a Ciência e a Tecnologia, Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, ISBN 972-31-0832-1.

Com a amizade de Julieta Feliz
Cortesia da F. C. Gulbenkian/JDACT