sexta-feira, 15 de junho de 2012

Maria Cristina A. Cunha. Estudos sobre a Ordem de Avis, séculos XII-XV. «Por volta de 1170, após a conquista de Leão por Fernando II, fundou-se naquele reino, em Cáceres, uma irmandade ou confraria de cavaleiros, que ficou conhecida como “freires de Cáceres”. Dirigido por Pedro Fernandes, este novo instituto religioso visava defender as conquistas já efectuadas e a realizar pelas hostes cristãs na Estremadura castelhana»


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«O apoio material necessário a um tal empreendimento terá vindo do próprio arcebispo de Toledo, que, para além do fornecimento de armas e dinheiro, terá pregado uma Cruzada com o fim de atrair voluntários para a defesa da praça. A avaliar pelo recuo estratégico que os almoadas então levaram a cabo, desistindo da conquista de Calatrava, o número dos que responderam afirmativamente aos apelos do Arcebispo e do próprio abade, foi provavelmente considerável. O perigo imediato terá então passado, mas vários cavaleiros resolveram permanecer junto de Raimundo de Serrat, organizando uma confraria militar inspirada no modelo de vida cisterciense (1158), que tomou o nome da fortaleza onde estava sediada: Calatrava. Esta comunidade “mista”, composta por monges e por cavaleiros, manteve-se como instituição religioso-militar enquanto Raimundo foi vivo. Mas a sua morte fez levantar o problema da sucessão, já que os monges queriam escolher um abade (conforme estipulava a regra de Cister), enquanto que os cavaleiros preferiam designar um de entre eles para ser seu mestre. Às dissensões então ocorridas, juntou-se o desagrado da abadia de Scala Dei, (casa-mãe de Fitero, pelo facto e não ter sido consultada aquando da criação do convento-fortaleza de Calatrava. O resultado da oposição dos monges cistercienses aos cavaleiros foi o abandono dos primeiros da comunidade, ficando esta reduzida a um grupo de guerreiros que, sem uma unidade religiosa forte, tinha fortes probabilidades de se vir a desagregar. Tornava-se, pois, imperioso admitir religiosos, regulares ou seculares, que se tornassem capelães e assegurassem a orientação espiritual dos membros, pelo menos enquanto a milícia não se ligasse a uma ordem religiosa. Por esta razão, o mestre dos cavaleiros, Diego Velásquez, pediu a incorporação na Ordem de Cister, por ocasião da celebração do Capítulo Geral desta ocorrido em 1164. O resultado, embora positivo já que os membros de Calatrava passam a ser considerados fratres cistercienses, não foi um êxito total para os cavaleiros: a nova ordem não terá sido então incorporada na hierarquia cisterciense, permanecendo como uma casa à parte da estrutura de Cister. Não havendo uma Regra estabelecida, o Capítulo Geral terá então incumbido a abadia de Scala Dei da sua redacção, plasmando num texto a união espiritual dos cavaleiros aos monges brancos. A incorporação definitiva da ordem de Calatrava em Cister, isto é a sua aceitação como casa-filha de um convento cisterciense, só ocorreu em 1187, altura em que o mestre Nuno Perez de Quirionez, com o apoio do monarca castelhano e de vários outro magnates do reino, a pediu, com sucesso, ao Capítulo Geral de Cister, então reunido. Doravante, os freires calatravenhos ficariam ligados a Morimond, considerada a partir de então sua abadia-mãe. São patentes as vantagens que a incorporação no sistema cisterciense lhes trazia: se por um lado há um direito de visita da abadia-mãe à(s) abadia(s)-filha(s) para verificar nesta(s) o cumprimento dos Estatutos e a vida religiosa, por outro, cada abadia e, no caso em apreço, o convento de Calatrava preservava a sua autonomia económica e de gestão patrimonial. Também não deixa de ser importante a extensão de todos os privilégios outorgados à Ordem de Cister pelos monarcas e, sobretudo, pelos pontífices a todos os institutos religiosos que a ela pertenciam, como era o caso da Ordem militar castelhana.
Se inicialmente Calatrava actua apenas em Castela, logo durante o mestrado de Martim Peres de Siones (1170-1182), a milícia expande-se pelos outros reinos peninsulares. Estão documentadas visitas regulares dos mestres à Corte dos reis de Leão, que, aliás, se mostraram bastante generosos para com os cavaleiros, fazendo-lhe doações importantes. A razão da generosidade dos monarcas leoneses reside não na ajuda militar (de que não há notícia) mas no facto de Calatrava ser uma Ordem criada para defender as fronteiras e que se tinha inicialmente mantido como uma instituição puramente castelhana, pelo que era possível que lutasse ao lado dos reis de Castela contra o reino de Leão. Para evitar esta hipótese, os reis de Leão terão tentado “comprar”, com propriedades situadas no seu reino, a neutralidade dos calatravenhos.
Por volta de 1170, após a conquista de Leão por Fernando II, fundou-se naquele reino, em Cáceres, uma irmandade ou confraria de cavaleiros, que ficou conhecida como “freires de Cáceres”. Dirigido por Pedro Fernandes, este novo instituto religioso visava defender as conquistas já efectuadas e a realizar pelas hostes cristãs na Estremadura castelhana. Só após um acordo celebrado com o arcebispo de Santiago de Compostela, em 1071, a irmandade passa a denominar-se Ordem de Santiago». In Maria Cristina A. Cunha, Estudos sobre a Ordem de Avis, séculos XII-XV, Faculdade de Letras, Biblioteca Digital, Porto, 2009. 

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Cortesia da Faculdade de Letras do Porto/JDACT