sexta-feira, 22 de junho de 2012

Marcas de Simbologia Religiosa Judaica e Cristã em Ombreiras de Porta. Carmen Balesteros. «Pensamos que o fenómeno dos rasgos longitudinais pode ser explicado de várias formas. Entre as várias explicações plausíveis a que nos parece mais aceitável é que estes rasgos longitudinais possam continuar, ainda que de forma diferente, a tradição hebraica/judaica de marcar nas ombreiras das portas a adesão a um culto»


Cruz gravada na umbreira da janela. Encinasola
Marca na ‘mezuzah’ numa casa da rua dos Mercadores. Évora
cb e jdact

Os Rasgos Longitudinais
«Este género de marcas é constituído por traços verticais que podem atingir uma profundidade de 0,5 cm e um comprimento que pode oscilar entre os 10 cm e os 50 cm. Apresentam-se isoladamente, um único rasgo, ou num conjunto de vários rasgos, e tanto podemos identificá-los nas ombreiras direitas como nas ombreiras esquerdas das portas. Quando identificamos este género de marcas, isoladamente ou em pequenos conjuntos, a situação mais frequente é que estes se registem em ambas as ombreiras.
Tendo iniciado a nossa investigação em Castelo de Vide, verificámos que um grande número de casas do bairro judaico, ainda que não exclusivamente, apresenta gravações longitudinais que alguns explicam como resultando da necessidade dos sapateiros afiarem as suas sovelas. Suspeitámos que não fosse esta a explicação única e os dados até agora recolhidos mostram que, na maior parte dos casos, dificilmente se poderá compreender o fenómeno como resultando exclusivamente do desempenho duma actividade artesanal.
Pensamos que o fenómeno dos rasgos longitudinais pode ser explicado de várias formas, ainda que julguemos dever ser, predominantemente, entendido como um ritual de carácter mágico/religioso. Entre as várias explicações plausíveis a que nos parece mais aceitável é que estes rasgos longitudinais possam continuar, ainda que de forma diferente, a tradição hebraica/judaica de marcar nas ombreiras das portas a adesão a um culto.
Os rasgos longitudinais encontram-se geralmente em habitações, igrejas, conventos, caso do antigo convento de Sta Catarina em Estremoz, ou edifícios ligados à Igreja, caso do antigo Paço Arquiepiscopal de Évora. No caso das habitações é em Castelo de Vide que o fenómeno é mais expressivo pelo grande número de casas que apresentam gravações longitudinais nas ombreiras das portas. No caso das igrejas ou conventos os casos mais notáveis, pela quantidade e aparente escolha intencional do local de gravação, são Zamora, Barcelona, Encinasola.

As Epígrafes de Referência Religiosa
Este último grupo de marcas diz respeito à gravação de abreviaturas ou frases de referência religiosa. Este género de marcas identificam-se nas jambas das portas, caso de Elvas e Castelo Rodrigo, nos lintéis das janelas, como em Borba, ou nos lintéis das portas, caso de Trujillo em que a inscrição hebraica de Sl 118,20 permite localizar com grande probabilidade a sinagoga medieval.
Para além destas epígrafes temos também casos em que se identifica a inscrição de uma data em relação com uma ou várias cruzes nas jambas, lintéis das portas, ou na fachada de um edifício.
São estes os casos do Sabugal, Vila Viçosa, Guarda, Celorico da Beira e Estremoz. As datas inscritas distribuem-se pelo século XVI, caso de Celorico da Beira; séc. XVII, caso da Guarda e Celorico da Beira; e séc. XVIII caso de Sabugal, Vila Viçosa e Estremoz.

Distribuição das Marcas por Géneros Arquitectónicos
As diferentes marcas de simbologia religiosa que têm sido objecto do nosso estudo podem ocorrer em quatro grupos arquitectónicos diferentes:
  • Arquitectura civil de utilização privada ou pública (ex.: habitações, fontes, moinhos);
  • Arquitectura religiosa (ex.: igrejas, conventos, sinagogas);
  • Arquitectura militar (ex.: portas ou panos de muralha);
  • Outros (ex.: Rocha dos Namorados, Reguengos de Monsaraz, Pedra das Gamelas, Arraiolos.
In Carmen Balesteros, Ibn Maruán, Revista Cultural do Concelho de Marvão, Coordenação de Jorge Oliveira, nº 7, 1997.

Fonte da Vila. Castelo de Vide
cb e jdact
Cortesia da C. M. de Marvão/JDACT