segunda-feira, 11 de junho de 2012

História do Descobrimento e Conquista da Índia. Primeiro Livro. Fernão Lopez de Castanheda. «E despois da partida deste Bartolomeu Dias, como el Rei tinha muitos grandes desejos de descobrir o Preste João das Índias para o conhecer por amigo, e por sua causa ter entrada na Índia, determinou de o mandar descobrir por terra; por onde já tinha mandado um fr. António de Lisboa frade de S. Francisco e um…»



Cortesia de wikipedia

NOTA: De acordo com o texto original

«CAPITOLO I.
De como el Rey dom Ioão de Portugal ho segundo deste nome mandou descobrir a India per mar & despois por terra. Antes que a India fosse descuberta pelos Portugueses, a mayor parte da especiaria, droga & pedraria dela se vazaua pelo mar roxo donde ya ter á cidade Dalexandria, & ali a comprauão os Venezianos que a espalhauão pela Europa , de que ho reyno de Portugal auia seu quinhão, que os Venezianos leuauão a Lisboa em galés, principalmente reynãdo nos reynos de Portugal el Rey do Ioão ho segundo deste nome: que como fosse de muyto altos pensamêtos, & desejoso dacrecentar seus senhorios & emnobrecelos a seruiço de nosso señor, determinou de prosseguir ho descobrimento da costa de Guiné que seus antecessores tinhão começado: porque por aquela costa lhe parecia q descobriria ho senhorio do Preste Ioão das Indias de que tinha fama: pera que por ali podesse entrar na Índia, donde per seus capitães podesse mandar leuar aquelas riquezas q os Venezianos lhe yão vender. E coesta determinação mandou nouamente continuar este descobrimento per mar, per hú Bertolameu diaz que foy almoxarife dos almazes de Lisboa, que mãdou por capitão mór a este descobrimento, em que descobriu aqle muyto grande & espantoso cabo dos antigos não conhecido: que agora se chama Cabo de boa Esperança, &, passou auante cento & corêta legoas ate ho rio do Iffante, & da hi se tornou pera Portugal sem achar nouas do Preste João nem da India: & naquela viagem pos era certos lugares algûs padrões q leuaua com cruzes & as armas reaes de Portugal. E ho derradeyro foy ê hú ilheo perto da terra firme quinze legoas atras deste rio do Iffante, a q pos nome ho ilheo da Cruz. E despois da partida deste Bertolameu diaz, como el Rey tinha muytos grãdes desejos de descobrir ho Preste joão das Indias pera ho conhecer por amigo, & por sua causa ter êtrada na India, determinou de ho mandar descobrir per terra: por onde ja tinha mandado hú frey António de Lisboa frade de sam Francisco & hú leigo q chegarão ate Ierusale &, da li se tornarão per não saberê a 1igoa Arábica. E pera este descobrimêto da terra escolheo hú criado seu que auia nome Afonso de payua natural de Castelo branco, & outro chamado Pêro de couilhaã natural de húa vila deste nome: & a este disse em segredo q esperaua dele hú grande seruiço, porq sempre ho achara bõ seruidor & leal, & muyto ditoso nos seruiços q lhe linha feytos. E ho ê q queria q ho seruisse, era irê ele & Afonso de payua descobrir & saber do Preste Ioão, & onde achauao a canela & a especiaria q ya da Índia a Veneza por terra de mouros: rogãdolhe muyto q lhe fizesse este seruiço, q ele disse q faria, & forào ambos despachados em Santarê aos sete dias de Mayo, de mil & CCCCLXXXVIJ. perante el Rey dõ Manuel q então era duq de Beja: & deulhes el Rey húa carta de marear q fora tirada de hú Mapamundi, pera que posessem nela os lugares do senhorio do Preste, & assi o caminho por õde fossem. E pera sua despesa lhos deu el Rey quatro cêtos cruzados da arca das despesas da orta Dalmeirim: & tomãdo deles o q podessê gastar, foy posto ho resto no banco de Bertolameu florêtim, & assi lhes deu el Rey hua carta de crêça pera serê socorridos em perigo ou necessidade ê quaesquer reynos q se achassem, porq em todos era el Rey conhecido. E partidos Pêro de couilhaã & Afonso de payua de Santarê chegarão a Barcelona ê dia de corpo de Deos, dôde lhescãbarão ho cambo pera Nápoles, a q chegarão dia de sam Ioão: & sendo lhes dado seu caminho pelos filhos de Como de medicis forão ter a Rhodes, em cuja religião não auia ainda mais de dous Portugueses, hu chamado frey Gonçalo & outro frey Fernãdo com quê pousarão, & da hi passarão a Alexandria como mercadores, &. dali se forão ao Cayro, & da hi em companhia de mouros de Fez & de Tremecê em trajos de mouros forão ter ao lugar do Toro ao pé de monte Sinay na costa Darabia no mar roxo: dõde permar se forão a çuaquê na costa da bexia, & despois a Adê. E sabendo ja bê que aquelle rey Christão q elRey dõ Ioão cuydaua q era ho Preste Ioão das Indias era senhor de Ethiopia, cõcertarão q lhe leuasse Afonso de payua húa carta del Rey dõ Ioão & se visse coele.
E por ser a moução pera a India de q sabião a verdade õdestaua, q fosse lá Pêro de couilhaã, & q a certo tempo se ajútassem ambos no Cairo. E partidos cada hú pera sua parte, Pêro de couilhaã q ya ê húa nao de mouros: foy ter a Cananor, & dahi a Calicut, q vio q era naqle tempo a principal escala da costa da India, & dahi foy ver a ilha de Goa, & foy a çofala & á ilha que agora chamão de sam Lourêço q os mouros chamauão da lua , & despois á Dormuz. E tornado ao Cairo achou noua q Afonso de payua era morto: & querêdose tornar pera Portugal cõ tão boas nouas como leuaua, soube como hi andauão em sua busca dous judeus Portugueses, hu chamado Rabi habrão morador è Beja, & outro Ioseph morador em Lamego & çapateiro, q esteuera em Babilónia & soubera nouas da ilha Dormuz, & do seu trato dôde fora ter a Portugal algûs dias despois da partida de Pêro de couilhaà & Dafonso de payua. E cotou isto a el Rey dom Ioão , que logo ho tornou a mandar cõ cartas a Pero de couilhaà, &, coele Rabi habrã por seu companheiro: & dizia nelas que se Pero de couilhaã tinha visto & sabido tudo aquilo a q ho mandaua q se tornasse a Portugal & q lhe faria mercê. E se não tinha tudo visto & sabido q lhe escreuesse o que linha feyto, & principalmente fosse ver ho Preste Ioão. E alê desta carta requererão os dous judeus estreitamête a Pero de couilhaã da parte dei rey dõ Ioão q fosse ver ho Preste Ioão, & mostrasse Ormuz a Rabi habrão. E logo Pero de couilhaã escreueo a el Rey tudo o q tinha sabido do Preste, & õde era seu señorio, & assi o q vira da India & Dormuz: & a carregação q se fazia è Calicut despeciaria, Droga & pedraria: & q Calicut &Cananor eslauão ê costa, & podiase nauegar pera lá pela sua costa & mar de Guiné, indo demandar çofala: dõde podião ir tomar a costa de Calicut». Fernão Lopez de Castanheda, Historia do Descobrimento e Conquista da Índia pelos Portugueses, CPJ Van Der Peet, Amsterdam Antiquqriae, Purchased for the University of Toronto, Library from the Canada Council special grant for islamic studies, 1950, Livro I, Lisboa, MDCCCXXXIII, Typographia Rollandiana.

Cortesia de T. Rollandina/JDACT