quarta-feira, 4 de maio de 2011

Oliveira Martins: O Príncipe Perfeito. Prefácio, Parte IV. «As diligências para modificar uma situação tão desfavorável começaram por isso logo no seguinte ano de 1482 em que D. João II enviou a Castela D. João da Silveira, Barão de Alvito, como embaixador, levando Rui de Pina para secretário, no intuito de conseguir um dos dois termos desta alternativa, ou remover para Lisboa as Terçarias, ou desfazê-las de vez»

Cortesia de revelarlx

«O capítulo V teria como título «As Terçarias de Moura». Nas pazes entre Portugal e Castela, negociadas em 1479 pela infanta D. Beatriz, ainda em tempos de D. Afonso V, estipulara-se, a par de outras garantias, que de Castela viesse para Portugal em reféns a Infanta D. Isabel, filha dos Reis Católicos, e aqui permanecesse entregue aos cuidados e guarda da Infanta D. Beatriz, residente por esse tempo no seu castelo de Moura. Ali se acolheria também o príncipe D. Afonso, filho de D. João II, débil criança que teria mais tarde de desposar D. Isabel, e, até isso suceder, ficaria igualmente sob a guarda da Infanta, sua avó, mãe da Rainha D. Leonor. O Duque de Viseu, irmão desta, e filho de D. Beatriz, seguiria para Castela em reféns, e por troca com sua prima D. Isabel.
Cortesia de geopedrados
Nisto consistiam as chamadas Terçarias de Moura, e delas resultou ficar mais tarde, quando ateada a inimizade entre D. João II e os Duques de Viseu e Bragança, confiado o filho daquele soberano à guarda de seus inimigos, e isto por efeito das cláusulas de um tratado de paz, que por todos os títulos tinha de ser cumprido e acatado. A Infanta D. Isabel fora entregue em Terçaria no ano de 1481. Conduzira-a a Moura, onde já se achava D. Afonso, o mestre de S. Tiago com os bispos de Palência e de Ávila, o de Coria e o licenciado de Huesca. Achavam-se em Moura para receber a princesa espanhola, além da Infanta D. Beatriz, os Duques de Viseu (D. Diogo) e o de Bragança e Guimarães D. Fernando, o conde de Faro, D. Álvaro de Bragança e outros senhores, entre os quais D. João da Silveira (Alvito), na qualidade de procurador de el-rei D. João II.

Cortesia de mjfs
Como poderia, pois, este soberano resolver a questão capital levantada entre a coroa e a nobreza, entrando francamente na luta suscitada pelo abuso das jurisdições exercidas pelos nobres, enquanto o seu herdeiro único continuava entregue precisamente àqueles que, pela força da sua posição eminente, teriam de capitanear e dirigir a resistência oposta aos planos do Rei?
As diligências para modificar uma situação tão desfavorável começaram por isso logo no seguinte ano de 1482 em que D. João II enviou a Castela D. João da Silveira, Barão de Alvito, como embaixador, levando Rui de Pina para secretário, no intuito de conseguir um dos dois termos desta alternativa, ou remover para Lisboa as Terçarias, ou desfazê-las de vez. Esta primeira tentativa de reaver o filho malogrou-se, porém, por efeito de intrigas do Duque de Bragança, que bem compreendia ser a instituição e manutenção das Terçarias a garantia mais valiosa contra o Rei, de cujos projectos se arreceava, e com a antipatia do qual contava como segura.
D. João II, já mestre na arte de dissimular, disfarçou o desgosto, afagou o Duque, para melhor lhe iludir a vigilância, e prosseguir nas diligências intentadas, aguardando momento mais oportuno para lhes alcançar o êxito que a princípio não colhera». In O Príncipe Perfeito, Oliveira Martins, Guimarães e Cª Editores, 6ª edição 1984.

Cortesia de Guimarães e Cª Editores/JDACT