terça-feira, 7 de junho de 2016

Memórias Paroquiais. 1758. Alvito. Transcrição de André Coelho. «… e daqui vem o serem as armas desta Villa hum toiro com huma aranha, mas tudo isto não tem mais certeza que huma simples tradição»

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Com a devida vénia a Fernanda Olival e André Coelho

Alvito. 2 de Junho de 1758. Memória Paroquial da freguesia de Alvito, comarca de Beja, [ANTT, Memórias Paroquiais, Vol. 3, nº 9, pp. 365 a 370]

[…]
Na capella mor estão duas portas huma da sanchristia, e outra fronteira da caza do despacho da confraria do Santissimo Sacramento, e nella esta tambem o Santissimo Sacramento em hum cofre a que chamão depozito. Tem coro alto cujo arco se faz celebre por ser quazi direito, e ter muito pequena volta, e de bacho do coro está outra porta para a rua, que he a principal. O parocho he religiozo Trino com o titulo de Reitor he aprezentado pelo padre ministro do Convento da Santissima Trindade da Villa de Santarem comendador desta igreja, a qual rende fora da comenda trezentos mil reis, e nella não há beneficiados. Tem dous conventos hum de religiozos Trinos, e he dentro da Villa, em que assistem tres religiozos cujo património são as rendas da dita paroquia. Outro de religiozos de S. Francisco da Provincia dos Algarves e he conhecido pelo titulo de Mugem de Arem, por corrupção do vocabulo, que era dos monges de alem, por quanto havião nos seculos mais antigos dous conventos de religiozos de S. Bento, e a este por ficar mais distante da povoação e entravão o convento dos Monges de Alem. Neste mesmo sitio se acha hoje fundado o convento dos religiozos de S. Francisco, de que he padroeiro o Excelentissimo barão conde. Este titulo de Mugem de Arem he ja antigo por quanto no tombo das capellas desta matriz a primeira capella he da caza do Excelentissimo barão conde com missa quotidianno [sic] e humas das fazendas anexas a esta capella he a erdade de Mugem de Arem, e este tombo foy feito pelo pe. Diogo Manaxo no anno de mil quinhentos, noventa e quatro, anno em que comessou a ser vigario da vara. Tem hospital, e tem Mizericordia, tudo governado pela meza dos irmãos da Mizericordia. O hospital he mais antigo, porque a Jrmida de Nossa Senhora das Candeyas, que antigamente se chamava Senhora do Hospital he muito mais antiga, e a esta imagem da Senhora do Hospital concorrerão os moradores desta Villa estabelecendo nas suas fazendas alguma obrigação, sensos, e foros para a assistência dos infermos, e por este motivo chamarão a Senhora do Hospital, que depois o doctor Francisco Soares ha mais de cem annos fez a Mizericordia ao pe desta Jrmida de Nossa Senhora; e com breve, que alcansou, se anexarão á Mizericordia as rendas de Nossa Senhora do Hospital, que de então para ca se começou a chamar Senhora das Candeyas, e ficarão estas duas igrejas as quaes se comunicão, governadas pela mesma meza da Mizericordia, cujas rendas poderão ser huns annos por outro trezentos mil, de cuja despeza sahem as pensões, e legados da dita Mizericordia. Tem sette hermidas, a de Santo Antonio, e esta tem hũa confraria ou huns devotos que o festejão, S. Sebastião, e a de Nossa Senhora da Graça, que tambem tem confraria, e esta hermida foy no seculos [sic] antigo a freguezia, que então era de S. Romão, e todas estas tres hermidas estão juntas á Villa, e nos seus arrabaldes, mais distantes fica a de S. Miguel no alto da serra, que vay para Villa Nova, a de S. Bartholomeu, a de Santa Luzia e a de S. Pedro. Tem outra hermida mais ao pe da Villa de Agua dos Peixes [sic] com o titulo de S. Jozeph, em todas estas ha festa no [sic] seus dias mas sem romagem especial, mais que as pessoas da Villa, e todas estas jrmidas pertencem ao padroado do Convento da Santissima Trindade de Santarem. Nesta terra se recolhem de todos os frutos como trigo, sevada, senteio, vinho, mas com mayor abundancia azeite. Tem camara, e dous juizes ordinarios tudo nomeação do sobredito donatario. He cabeça das terras da baronia, por estar nella o castello e palacio do barão conde, e a elle vem poizar, quando vem ás suas terras. Nella ha uma feira, que começa em dia de Todos os Santos dura tres dias. Por ella passa o correyo, que vay para a cidade de Beja e chega a esta terra na quinta feira pela menham, e vem de Beja para Lisboa na sesta feira a noite, e parte no sabado de madrugada. Esta terra dista de Beja capital da comarca sinco leguas, de Evora capital do arcebispado seis leguas, e de Lisboa capital do reino dezoito léguas em que se contão as trez de mar da Villa da Moita a cidade de Lisboa. Não consta ter esta terra privilegio nem antiguidade que se faça digna de memoria. Na praça desta Villa ao pé do castello, e palacio tem huma grande fonte, a qual he como a de Alcabideque. sahe de huma grutta, quem tem a modo de hum portado, e com as suas aguas moem nove moinhos, e se regão doze ou quatorze hortas. A esta gruta, e principio desta fonte, que recolheo fugido hum toiro, o qual por ser muito branco lhe chamarvão Alvito, outros dizem, que achado pelos que o buscavão gritarão Alvim ca está o toiro, na entrada desta gruta se achava huma aranha, a qual era de extraordinaria grandeza, em forma que fazia deficultoza a entrada para tirarem o toiro, e daqui vem o serem as armas desta Villa hum toiro com huma aranha, mas tudo isto não tem mais certeza que huma simples tradição». In André Coelho e Fernanda Olival, ANTT, Memórias Paroquiais, Vol. 3, nº 9, pp. 365 a 370, Memórias Paroquiais de 1758, Universidade de Évora, CIDEHUS, FCTecnologia, 2011.

Cortesia de UÉvora, Cidehus, FCT/JDACT