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Censurava-se abertamente a sua acção como reinante, fazendo-se disso a mais
descabelada propaganda junto da parte consciente da nação. Aliciavam-se adeptos
valiosos para o partido da oposição, que se avolumava cada vez mais. A espaços,
o país vibrava ainda com os seus feitos de armas. Duas expedições militares
efectuadas em 1238 e 1239, contra Mértola, Alfajar de Pena e Ayamonte, uma, e
contra Cacela, outra, coroadas ambas, com assinalável brilhantismo, pela conquista
dessas povoações, electrizaram de entusiasmo a opinião pública.
Paio
Peres Correia, por seu turno, foi-se a Tavira, tomando-a após desesperada
resistência moura. O rei, contudo, se se distinguia como capitão de tropas,
errava por tibieza como chefe político do país e esta circunstância fazia
esquecer aquela.
Os
restos de prestígio que o aureolavam prestes se diluíram com o casamento desigual
que celebrou com a viúva de Álvaro Peres Castro, dons Mécia Lopes de Haro,
filha de fidalgo biscainho Lopo Dias de Haro. Não lhe levaram a bem os
detractores tal casamento, tanto mais que Sancho II amoleceu nos braços da mulher
o seu temperamento de guerreiro. Nada havia, agora, que o impusesse à admiração
nacional e, naturalmente, os inimigos trataram de explorar a situação a seu
favor.
Trabalhava-se
activamente para o derrubar do trono. O monarca aprendeu à sua custa quanto era
terrível e clamava vingança o espírito implacável dos adversários da sua pessoa.
Gregório IX tinha morrido, 1241; e Inocêncio IV, após duas semanas de Celestino
IV exercer o cargo, sucedera-lhe. As dissenções de Frederico II, imperador da
Alemanha, com aquele, continuaram com este. Inocêncio, perseguido, e expulso da
Itália pelo imperador, repelido de França por S. Luís, e de Espanha pelo rei de
Aragão, acolheu-se à cidade de Leão, onde logo tratou de reunir um concílio para
depor Frederico. Lá se apresentaram, entre os delegados de Portugal, o
arcebispo de Braga, o bispo de Coimbra e os outros descontentes, e o papa
juntou à deposição do imperador da Alemanha a de el-rei de Portugal.
Os
adversários de Sancho II tinham enfim conseguido o que pretendiam. Para tanto,
forjaram repugnantes maquinações em que tomou parte saliente o próprio irmão do
monarca, Afonso, o Bolonhês. Este, procurando em Paris, onde residia pelos
aludidos prelados, com eles celebrou um tratado deprimente para a coroa.
Que
importavam as condições acordadas, se o infante não pretendia respeitá-las? O
que o interessava de imediato era apossar-se do trono, de qualquer modo, mesmo
em prejuízo do irmão, seu legítimo possuidor. Depois, na sequência dos
acontecimentos, se veria o que havia a fazer...
Sancho
II, assinala um escritor, era um rei inábil, sem dúvida. Deixara que se
cometessem violências que até certo ponto justificavam as reclamações
eclesiásticas. Com valimentos pouco acertadas, descontentara muitos fidalgos e
levantara grandes discórdias na corte». In Américo Faria e Herdeiros, 1958, Dez
soberanos destronados, Grandes Soberanos Destronados, Edições Parsifal, Lisboa,
2014, ISBN 978-989-8760-00-5.
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Parsifal/JDACT