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O
drama da História feminina. A História masculina e a Heresia. Maria Madalena e
o sagrado feminino. Como uma mulher foi convertida em prostituta pela história
masculina
«Maria Madalena é, em muitos
sentidos, a estrela do Código Da Vinci, e é apropriado que ela seja o
ponto de partida da odisseia de exploração nas histórias e mistérios da novela
de Dan Brown. Mas quem era esta mulher que desempenha um papel tão
decisivo em momentos críticos dos
Evangelhos tradicionais? Está claro que é um dos acompanhantes mais amealhados
ao Jesus itinerante. No Novo Testamento, a menciona por nome doze vezes. Está
entre os poucos seguidores de Jesus presentes no momento de sua crucificação e
se ocupa dele depois de morto. É a pessoa que, três dias depois, retorna à sua
tumba e a pessoa a quem o Jesus ressuscitado aparece pela primeira vez. Quando
aparece, instrui-a, de facto, outorga-lhe poderes, para que difunda as notícias
da sua ressurreição e se converta, com efeito, no mais importante dos
apóstolos, a portadora da mensagem cristã aos outros apóstolos e ao mundo. Este
relato é o que fazem as narrações autorizadas do Novo Testamento. Se se
estudarem as narrações alternativas, várias escrituras perdidas e os Evangelhos
gnósticos, se verá em seguida que há sugestões de que Maria Madalena e Jesus
poderiam ter uma relação extremamente estreita, uma relação íntima de marido e
mulher. Ver-se-á que ela seria uma dirigente e pensadora por direito próprio a
quem Jesus confiou segredos que não compartilhou sequer com os apóstolos
varões. Poderia ver-se envolvida numa ciumenta rivalidade com os outros
apóstolos, alguns dos quais, em particular Pedro, podem ter desdenhado seu
papel no movimento devido ao seu sexo, e ter encontrado que a sua relação com
Jesus era problemática. Pode ter representado uma filosofia mais humanista e
individualizada, talvez mais próxima a que realmente pregou Jesus que a que
chegou a ser aceita pelo Império Romano em tempos de Constantino como o
pensamento cristão oficial, padronizado e convencional.
Talvez a forma em que melhor a
conhece na história é como prostituta. Jesus simplesmente a perdoou, e ela
simplesmente se arrependeu e mudou de conduta, para ilustrar os tradicionais princípios
cristãos sobre o pecado, o perdão, a
penitência e a redenção? Ou não foi absolutamente uma prostituta, mas
uma rica patrocinadora financeira e partidária do movimento de Jesus, de quem,
no século VI, o papa Gregório declarou que era quão mesma outra Maria Madalena
dos Evangelhos, que era, esta sim, uma
prostituta? E quando o papa Gregório refundiu deliberadamente às três Marias dos Evangelhos em uma o
fez para marcar deliberadamente a Maria com o estigma da prostituição?
Tratou-se de um inocente engano de interpretação em uma idade obscura em que se
contava com poucos documentos originais
e a linguagem bíblica era uma mixórdia de hebreu, aramaico, grego e latim?
A Igreja necessitava simplificar e codificar os evangelhos e destacar os temas
do pecado, a penitência e a redenção?
Ou foi uma estratégia muito mais maquiavélica (um milênio antes de Maquiavel)
para arruinar a reputação de Maria Madalena ante a história e, ao fazê-lo,
destruir os últimos vestígios da influência dos cultos pagãos da deusa e do sagrado feminino sobre o cristianismo
primitivo, para escavar o papel das mulheres na Igreja e sepultar o flanco mais humanista da fé cristã? Chegou ainda mais longe? Quando o
papa Gregório com a letra escarlate da prostituição marcou a Maria Madalena, que
continuaria oficialmente uma prostituta reformada pelos seguintes catorze séculos,
começou um grande ocultação para negar o casamento de Jesus e Maria Madalena e,
em última instância, a linhagem real, sagrada,
de sua descendência? Sua
descendência? Bom, sim. Se Jesus e Maria Madalena se casaram ou ao
menos tiveram uma relação íntima bem poderiam ter um ou vários filhos. E o que ocorreu com Maria Madalena depois
da crucificação? A Bíblia cala, mas na área do Mediterrâneo, de
Éfeso ao Egipto, há lendas e tradições que afirmam que Maria Madalena e seu
filho (ou filhos) escaparam de Jerusalém e finalmente se assentaram para viver
como evangelistas. Os relatos mais interessantes são os que fazem que termine
sua vida na França... um tema que Dan Brown recolhe e integra à trama do
Código Da Vinci.
Não é surpreendente que Maria
Madalena, que representa a temática do pecado e a redenção, a Virgem e a puta,
a penitência e a virtude, os fiéis e os cansados, fosse sempre uma figura
destacada na arte e a literatura. Nos actos sacramentais, a primeira forma de
teatro produzida na Europa, faz mais de mil anos, era representada por fiéis de
sexo masculino. E após, foi uma figura constante na arte eclesiástica. Em
tempos muito mais recentes, Dan Brown não foi o único autor em sentir-se
fascinado pela Maria Madalena nem o primeiro em destacar a temática de seu possível
romance com Jesus. Nikos Kazantzakis postulou uma relação romântica
entre ambos em sua novela A última
tentação de Cristo faz mais de cinquenta anos (muito antes de que Martin
Scorsese o convertesse em filme na década de 1980 e fizera surgir o tema uma
vez mais). William E. Pipps tratou boa parte destes temas no seu livro Jesus esteve casado? Faz mais de trinta
anos. A ópera rock Jesus Cristo Superstar,
outra obra que tem mais de trinta anos, também dá por aceito que existe uma
relação romântica entre Jesus e Maria Madalena. Dado o interesse da nossa
sociedade pelos papéis que se adjudicam aos sexos, as mulheres como dirigentes
e todas as permutações do amor, o matrimónio e o sexo que alguém possa
imaginar, a nova Maria Madalena encaixa justo e O Código Da Vinci
chega bem a tempo». In Dan Burstein,
Secrets of the Code The Unauthorized Guide to the Mysteries Behind The Da Vinci
Code, Os Segredos do Código, Emecé Editores, Buenos Aires, 2004, ISBN
950-04-2585-8-1.
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