Tráfico e Tráficos. Os navios negreiros não param de passar
«(…) No resto do Mundo, a situação é ainda mais preocupante, sendo particularmente
grave no sul da Ásia e em África. Além do rápido crescimento de formas diversas
de trabalho forçado, a que se passou a chamar escravatura moderna, subsiste ainda, apesar de oficialmente
abolida, a escravatura tradicional.
Diga-se de passagem que essa abolição é, por vezes, muito recente: a Arábia
Saudita, por exemplo, só o fez em 1963,
e a Mauritânia em 1980.
Fala-se mesmo que, nos nossos dias, no Sudão, na Mauritânia e em
alguns países do golfo Pérsico, continuariam a funcionar mercados de escravos,
sobre os quais se procura manter uma pesada cortina de silêncio. A Amnistia
Internacional denunciava, em Agosto de 2011,
a prisão na Mauritânia de quatro activistas da recém criada Iniciativa
pata o Ressurgimento do Movimento Abolicionista.
Em 2005, calculava-se que
existissem, no Mundo, 27 milhões de pessoas submetidas à escravatura tradicional e entre 250 milhões e 300 milhões de
menores (dos 5 aos 17 anos) obrigados a trabalho escravo (doméstico,
fabril...), dos quais perto de um milhão (raparigas na sua maioria)
lançados anualmente na prostituição. Ao longo do tempo, as organizações
internacionais têm procurado, sem muito sucesso, acabar com o que sobra de
formas tradicionais de escravatura ou evitar o desenvolvimento de novas modalidades.
Em 1926, quando muitos Estados não
tinham ainda ilegalizado a compra e venda de pessoas, a Sociedade das Nações
aprovou a Convenção Internacional sobre a Escravidão. Tratava-se de um
tratado internacional que se esperava que fosse subscrito por todos os países,
aos quais era deixada a iniciativa de criar as medidas necessárias e suficientes
para acabar definitivamente com a escravatura. Essas medidas foram sendo acompanhadas
e aprofundadas pela Sociedade das Nações mas os esforços abolicionistas
acabaram por ser interrompidos com a II Guerra Mundial.
O facho dessa luta passará depois para as mãos da Organização das
Nações Unidas e dos seus organismos especializados. Em 1949, a Assembleia Geral da ONU
adoptou a convenção para a repressão do tráfico de seres humanos e da
exploração da prostituição, que, no entanto, mais de sessenta anos depois (em
2011) ainda só tinha sido assinada por 93 países e ratificada por 80.
Apesar disso, em 1956, foi aprovada uma convenção
suplementar à de 1926, tendo
em vista a abolição da escravatura e do tráfico de escravos e das instituições e práticas análogas à
escravatura, como a servidão por dívidas, os casamentos forçados, e todas
as formas de cedência de menores a terceiros com o fim de os explorar». In
Arlindo Manuel Caldeira, Escravos e Traficantes no império português, O
Comércio Negreiro no Atlântico durante os séculos XV a XIX, A Esfera dos
Livros, Lisboa, 2013, ISBN 978-989-626-478-9.
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