Os
lagóias
«Da cidade nasce o povo,
baptizado, funeral,
amigos, vinho que provo
por tristeza ou arraial.
Cidade que tens o povo
das ruas da minha morte,
meu coração é tão novo
que morre sem que se importe.
Cidade, forma do povo
que tem por sorte a canseira,
no ganhar sou eu que o louvo
no perder, cidade inteira».
In
Portalegre,
Março 1974
Os
sinos de São Lourenço
«Os sinos dobram na cidade branca.
Os sinos de mais dobrar!
Dobrar dos sinos na cidade branca,
alguém do campo que lá foi morar.
São sinos de São Lourenço!
Os sinos de mais morrer.
Os sinos dobram na cidade branca,
gente de fora que lá foi viver.
Dobram os sinos na cidade branca.
Os sinos que dão mais dó!
Dobrar dos sinos na cidade branca,
era um velhote que vivia só.
São sinos de São Lourenço!
Os sinos da maior dor.
Os sinos dobram na cidade branca,
na Casa de Saúde, um lavrador.
Dobram os sinos na cidade branca.
Os sinos do maior dano!
Não dobram sinos na cidade branca,
nem leva padre à frente, era um cigano.
São sinos de São Lourenço!
Os sinos de mais de um tom.
Não dobram sinos na cidade branca,
foi ontem, suicidou-se era tão bom!
Ai sinos de São Lourenço!
Não dobram por mais engano.
Lá vai deposto da cidade branca
um homem que morreu republicano.
Mais tristes sinos da cidade branca.
Os sinos do derradeiro.
Caixão de linho virgem, é um
anjinho
filha tão nova, um
rapaz bombeiro».
In
Portalegre,
Setembro 1970
In
Carlos Garcia Castro e Raul Ladeira, Os Lagóias e os Estrangeiros, edição da CM
de Portalegre, 1992, Depósito legal nº 53094.
Cortesia
de CMP/JDACT