sábado, 18 de julho de 2015

Os bons velhos tempos da prostituição em Portugal. Alfredo A. Pessoa. «Sobre o conceito de bárbaro, os Gregos designavam pela palavra bárbaros todos os estrangeiros (mormente os persas) que não falavam a sua língua. A etimologia é estranha e complicada…»

jdact e wikipedia

Uma história celta
«A origem dos povos antiquíssimos envolve-se quase sempre nas mais estranhas lendas. A lenda da origem dos Celtas é curiosíssima. Celtina, filha de Britanus, rei de um país setentrional, era uma donzela de uma castidade feroz, que fazia o desespero dos seus adoradores. Desprezava todos os pretendentes, repelia-os com desdém, numa palavra: era inacessível a todos os galanteios. Um dia, o acaso fez-lhe encontrar no seu caminho Hércules, líbio, herói de mil extraordinárias proezas e dotado, ao que parece, de uma formosura varonil excepcional. A princesa, loucamente enamorada do herói, declara-lhe o seu amor, mas, ao que diz a lenda, não logra cativá-lo. Hércules acabava de praticar uma façanha de primeira ordem: roubara os bois de Gérion e ia conduzindo os animais, muito orgulhoso daquela presa. O ensejo não era dos mais propícios para idílios, embora com a mais formosa das princesas, e o latagão mostrava-se indiferente a todas as sugestões.
A frieza do seu amado mais irrita o temperamento da princesa. Sente-se arder em desejos sensuais poderosíssimos e persegue o indiferente. Quando viu que os seus rogos e o seu amor não conseguiam abrandar aquela pena, Celtina, que, apesar de mulher, tinha ânimo e esforço para a luta, rouba a Hércules os seus bois e declara-lhe peremptoriamente que não poderá reavê-los enquanto não saciar os desejos que a devoram. Hércules rende-se e satisfaz a vontade de Celtina. Desta ligação sexual nasce Celto, o pai da raça celta. Da Gália céltica, os Celtas vieram à Península e ocuparam primeiramente, ao que parece, a parte da Bética conhecida pelo nome de Betúria, a oriente do Guadiana, entre a Estremadura espanhola e o oceano Atlântico. Passando à Lusitânia, estabeleceram-se na parte do Alentejo ao norte dos Turdetanos. O Guadiana extrema-os a oriente dos celtas da Betúria.
Dizem que Elvas, Estremoz, Vila Viçosa e a antiga Meróbriga eram as principais cidades de que os Celtas estavam senhores. Segundo a tradição, a invasão dos celtas foi contrariada na Lusitânia pelos antigos habitadores do país. Os bárbaros ou sarrienos, que, da serra da Arrábida se estendiam até à confluência do Canha com o Tejo, foram os seus mais encarniçados inimigos. Estes povos sustentaram contra os Celtas lutas sanguinolentas. Segundo alguns autores, o nome de bárbaros proveio-lhes da sua natural ferocidade, e por isso, até ao cabo da Roca, que era um dos limites do seu domínio, chamaram os antigos promontório bárbaro. Segundo Resende (Antiquitates Lusitaniae) o nome de bárbaros proviera-lhes do termo barbarii, derivado de barbaricarii, significando tintureiros. Entre estes povos fazia-se importante comércio de grã escarlate, que se criava na serra da Arrábida.
Seja como for, os Sarrienos vagueavam pelas serras, mantendo-se da caça e do que roubavam aos vizinhos. Eram indomáveis, e os Romanos, mais tarde, tiveram de sofrer da sua parte a mais tenaz das resistências. Não tinham a menor noção de pudor, segundo antiquíssimas tradições, a que daremos apenas a fé que merecem afirmações feitas sem base que as robusteça. As mulheres acompanhavam os homens na caça e na rapina e a prostituição era para elas um dever imposto pelos costumes. Quando o mar encapelado rugia contra as costas, os Sarrienos procuravam aplacar as divindades marinhas sacrificando-lhes em cima dos rochedos um homem e uma mulher; outras vezes algumas crianças eram imoladas por aqueles selvagens ao Oceano temeroso, deus temível, pai e dispensador de todas as coisas: oceanum, patrem rerum.
NOTA:
Sobre o conceito de bárbaro, os Gregos designavam pela palavra bárbaros todos os estrangeiros (mormente os persas) que não falavam a sua língua. A etimologia é estranha e complicada, e o Resende onde diz que a recolheu não o é menos. Mas chamar bárbaros aos habitantes da península é, de qualquer das maneiras, um anacronismo. Se a palavra é grega, só muitos anos depois é que houve alguém a chamar-nos esse nome...» In Alfredo Amorim Pessoa, Os bons velhos tempos da prostituição em Portugal, Antologia, 1887, Anotações, 1976, Antígona_Frenesi, 2006, Lisboa, ISBN 972-608-175-0.

Cortesia de Antígona/JDACT