«(…) O capataz parou na base da árvore, segurando as vestes
curtas acima da linha da água. Grunhiu como o urso que parecia e gritou para
Pug: que história é essa de outra árvore podre? Pug falava o idioma tsurani
melhor do que qualquer midkemiano no acampamento, pois era quem estava lá há
mais tempo, tirando alguns velhos escravos tsurani. Gritou para baixo: tem
cheiro de podre. Devíamos desbastar outra e deixar esta em paz, feitor. O
capataz acenou com a mão. São todos preguiçosos. Esta árvore não tem nada de errado. Está boa. Não querem é
trabalhar. Agora, corte-a! Pug suspirou. Não havia como discutir com o Urso,
como Nogamu era conhecido por todos os escravos de Midkemia. Era óbvio que
estava aborrecido com alguma coisa e seriam os escravos a pagar por isso. Pug
começou a dar golpes na parte superior, que logo caiu. O cheiro de podre era
intenso e Pug retirou as cordas depressa. Ainda com o último pedaço amarrado na
cintura, ouviu o som da madeira rachando. Vai cair!, gritou para os escravos
que se encontravam na água abaixo. Sem hesitar, todos fugiram. Quando se ouvia a
palavra cair, ninguém ignorava o aviso.
O tronco da árvore estava-se rachando ao meio, pois a parte
de cima fora cortada. Embora não fosse um comportamento habitual, se uma árvore
estivesse em estado avançado de degradação e a polpa tivesse perdido a força,
qualquer falha na casca poderia fazê-la sucumbir ao próprio peso. Os galhos das
árvores afastariam as metades. Se Pug ainda estivesse preso ao tronco, as
cordas o cortariam ao meio antes de arrebentarem. Pug calculou a direcção da
queda. Quando a metade em que estava começou a se deslocar, atirou-se dela.
Caiu de costas na água rasa, na esperança de que o meio metro de profundidade
suavizasse a queda tanto quanto possível. O baque
na água foi imediatamente seguido pelo impacto mais violento contra o chão. O
fundo era feito principalmente de lama, logo ele não sofreu grandes danos. Com
o choque, o ar que tinha nos pulmões explodiu pela sua boca, deixando-o tonto
por um instante. Manteve presença de espírito suficiente para sentar e expirar
fundo.
De repente, sentiu um peso golpear-lhe o estômago,
deixando-o sem ar e empurrando a sua cabeça de novo para baixo da água.
Debateu-se, tentando mexer-se, e sentiu um galho enorme em cima do estômago.
Mal conseguia manter o rosto à tona para respirar. Sentia os pulmões ardendo e
respirava descontroladamente. A água entrou pela traqueia e começou a
sufocá-lo. Tossindo e cuspindo, tentou manter a calma, mas o pânico começava a
apoderar-se dele. Desesperado, tentou empurrar o peso de cima dele, mas o galho
não se mexeu. Subitamente, sentiu a cabeça fora da água e ouviu Laurie dizer: cuspa,
Pug! Expulse essa porcaria ou vai pegar a febre dos pulmões. Pug tossiu e cuspiu.
Com Laurie segurando a sua cabeça, recuperou o fôlego aos poucos. Laurie
gritou: agarrem o galho. Eu puxo-o de lá de baixo. Vários escravos chapinhavam
ao redor, com os corpos suados. Pegaram o galho submerso com esforço e o
levantaram um pouco, mas não o bastante para que Laurie arrastasse Pug dali. Tragam
machados. Temos de cortar o galho.
Os outros escravos começaram a levar machados, mas Nogamu gritou: não. Deixem aí. Não temos tempo para isso. Há mais árvores para
cortar. Laurie quase gritou: não podemos deixá-lo aqui! Vai se afogar! O capataz avançou e bateu em Laurie com o chicote. Fez um corte
profundo na face do cantor, que não largou a cabeça do amigo. Volte ao trabalho, escravo. Hoje à noite você será espancado por
falar comigo dessa maneira. Há outros que conseguem subir até lá em cima. Agora, deixe-o! Voltou a bater em
Laurie, que se encolheu mas manteve a cabeça de Pug acima da água. Nogamu ergueu o chicote para o terceiro golpe, mas foi impedido
por uma voz que veio de trás: tirem o escravo de baixo do galho. Laurie viu que quem tinha falado fôra o jovem soldado que
acompanhava o feitor. O capataz virou-se, desacostumado a ter suas ordens
questionadas. Quando viu quem falara, reprimiu as palavras que estavam na ponta
da língua. Assentindo com a cabeça, disse: seja
feita a sua vontade». In Raymond Feist, Mago Mestre, 1982, 1992, Saída de Emergência, 2014/2015, ISBN
978-989-637-767-0.
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