Cartas do Japão. 8 de Abril de 1902
A aliança anglo-japonesa - Exposição
industrial nacional de Osaka
«O que ultimamente mais tem
ocupado o espírito deste bom povo é a aliança anglo-japonesa; festas, discursos
elogiosos, largos comentários na imprensa, enfim todas as manifestações do
orgulho nacional, que neste país é supino, excitado pelo magno acontecimento de
vir uma prestigiosíssima nação da Europa dar as mãos ao Japão, para em comum cuidarem
dos seus mútuos interesses no Extremo-Oriente, tudo isto tem agitado o teatro de
multíplices intrigas e cobiças. É, pois, bem justificável o entusiasmo japonês.
Para os estranhos que pretendem julgar imparcialmente os acontecimentos,
é ainda impossível fazer um juízo sobre a aliança anglo-japonesa e sobre a que logicamente
se lhe seguiu, a aliança franco-russa. Deve presumir-se que ambas concorram para
a manutenção da paz, que se equilibrem, com o que as actividades comerciais de todo
o Extremo- Oriente e a remodelação civilizadora, lenta mas fatal, da China e da
Coreia, terão tudo a ganhar. No entretanto, e referindo-me particularmente ao
império do Sol Nascente, a situação criada tem seus perigos, um dos quais, quando
outros não haja, pode consistir num possível excitamento do orgulho do povo, do
seu espírito guerreiro, arrastando a nação a enormes despesas com o aumento das
suas forças militares e navais, comprometendo assim seriamente o estado
financeiro do país, já pouco florescente. Confiemos, no entretanto, que este extraordinário
povo, que tem dado ao mundo exemplos notabilíssimos da sua perspicácia, que soube
em pouco mais de trinta anos surgir do seu isolamento misterioso para a civilização
moderna, e de modo a tornar-se já hoje respeitado como um grande Estado, compreenda
claramente a sua situação e o justo caminho que deve seguir no intuito do seu progressivo
engrandecimento.
A par da aliança, um outro
assunto está ocupando os japoneses, e este inquestionavelmente de paz, de progresso
e de seguros benefícios: refiro-me à próxima 5.ª Exposição industrial nacional, que deve ser inaugurada em Osaka
em Março de 1903, permanecendo aberta
durante cinco meses. Já se trabalha mui activamente nas diversas construções requeridas
e tudo leva a crer que tal exposição será por muitos títulos interessante, de grande
alcance mercantil, digna enfim da cidade de Osaka, que é o centro produtor
industrial mais importante de todo o império. Esta 5ª Exposição industrial nacional oferecerá a novidade de conter um vasto
pavilhão especialmente destinado a amostras estrangeiras, visando o duplo fim de
concorrer a melhorar as novas indústrias indígenas e de criar novos mercados. Prevê-se
já que a Europa e a América se farão largamente representar.
Será Portugal
representado na próxima Exposição japonesa? Enviarão a Osaka os negociantes
portugueses, do reino e das colónias, amostras de alguns dos produtos do país? Presumo
que sim, e desejo-o ardentemente, parecendo-me que a completa ausência de tais produtos
constituiria facto muito lamentável. Os nossos negociantes abastados e empreendedores
deverão mesmo fazer mais: deverão aproveitar esta ocasião excepcionalmente favorável
para enviarem ao Japão algum ou alguns dos seus representantes, um individuo poderá
muito bem encarregar-se dos interesses de três ou quatro firmas mercantis, os quais
devem mirar a um duplo intuito: tentarem fazer conhecidos aqui alguns dos nossos
produtos e adquirirem abundantes amostras de artigos indígenas para torná-los
conhecidos em Portugal». In Wenceslau de Moraes, Cartas do Japão, Antes
da Guerra (1902-1904), prefácio de Bento Carqueja, Livraria Magalhães & Moniz,
Editora, Oficinas do Comércio do Porto, Porto, 1904.
Cortesia de L.
Moniz/JDACT