The
British Museum. Londres. 14 de Novembro
«(…) A voz do homem respondeu à chamada, mas cortes engoliram a
maior parte das palavras, interferência da trovoada. ... possível... Tens a
certeza?... Espera até... Os portões estão fechados? Harry voltou a fixar os
portões de segurança descidos. É claro que deveria ter verificado se tinham
sido selados. Cada galeria tinha apenas uma entrada para o salão central. O outro
acesso às salas seladas era através de uma das janelas altas, mas estas estavam
protegidas contra quebra ou intrusão. E embora a trovoada tivesse deitado
abaixo a energia central, os geradores de reserva mantinham o quadro de
segurança activado. Nenhum alarme tinha soado no comando central. Harry
imaginou Johnson já a ligar as câmaras, percorrendo a ala, aproximando-se
rapidamente da Galeria Kensington. Arriscou um breve olhar à sequência de cinco
salas. O brilho persistia no fundo da galeria. A sua passagem parecia errante,
casual, não o perscrutar determinado de um ladrão. Verificou rapidamente o portão
de segurança. O fecho eletrónico emitia uma luz verde. Não fora violado. Voltou
a fixar o brilho azulado. Talvez fosse simplesmente a passagem dos faróis de um
carro através das janelas da galeria.
A
voz de Johnson pelo rádio, aos cortes, assustou. Não tenho nada nas câmaras...
A câmara cinco está desligada. Fica onde estás... Outros a caminho. As palavras
restantes se volatizaram pela descarga eléctrica da tempestade. Harry
manteve-se junto ao portão. Outros guardas vinham em auxílio. E se não fosse um
intruso? E se fosse simplesmente o passar de faróis? Ele já se encontrava numa
situação difícil com Fleming. Só faltava pôr-se a ridículo. Arriscou e ergueu a
lanterna. Está alguém?, gritou. Quis soar autoritário, mas resultou mais como
um queixume agudo. Contudo, não se verificou alteração no padrão errante da
luz. Parecia dirigir-se mais para o fundo da galeria, não numa retirada
assustada, simplesmente num sinuoso andamento lento. Nenhum ladrão poderia ter
tanto sangue-frio nas veias. Harry atravessou até o fecho eletrónico do portão
e usou a chave-mestra para o abrir. Os selos magnéticos soltaram-se. Empurrou o
portão para cima o suficiente para rastejar por baixo e entrou na primeira
sala. Endireitando-se, ergueu de novo a lanterna. Recusou deixar-se dominar
pelo pânico momentâneo. Devia ter investigado mais antes de fazer soar o
alarme. Mas o mal estava feito. O melhor que podia fazer era salvar um pouco a cara, esclarecendo
ele próprio o mistério. Gritou de novo, em todo o caso. Segurança! Não se mexa!
O
grito não teve efeito. O clarão prosseguiu a sua marcha resoluta, embora
errante, para o fundo da galeria. Olhou para trás para o portão de acesso à sala
principal. Os outros estariam ali em menos de um minuto. Que se lixe, resmungou
em voz baixa. Apressou-se para o interior da galeria, perseguindo a luz,
determinado a eliminar a sua causa antes que os outros chegassem. Quase sem um
olhar, passou por tesouros de importância intemporal e valor inestimável:
armários de vidro exibindo placas de argila do rei assírio Assurbanipal;
pesadas estátuas de arenito datando de tempos pré-pérsicos; espadas e armas de
todas as eras; marfins fenícios retratando antigos reis e rainhas; até mesmo
uma primeira impressão das Mil e Uma Noites, sob o seu título original, The
Oriental Moralist. Harry continuou a avançar pelas salas, passando de dinastia
em dinastia, dos tempos das Cruzadas ao nascimento de Cristo, das glórias de
Alexandre Magno aos tempos do Rei Salomão e da Rainha de Sabá». In
James Rollins, A Cidade Perdida, Bertrand Editora, 2015, ISBN
978-972-252-930-3.
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