sexta-feira, 30 de março de 2018

A Verdadeira História. Margaret George. «À noite, acamparam fora dos muros da cidade, assim como outros milhares de peregrinos, estendendo-se em sua volta como se fosse uma segunda muralha»

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A Mulher que Amou Jesus
«(…) O tumulto aumentava à medida que os grupos se aproximavam da cidade, e as suas fileiras inchavam quando se juntavam. Era uma massa feliz e alegre de gente, impelida por uma combinação de temor e fé religiosos. Mais à frente, outras carruagens desciam as ladeiras, aos solavancos, e as canções de outros peregrinos enchiam o ar, com a batida de pratos e o repicar dos tamborins. A grande porta do lado norte estava aberta; uma porção de mendigos e leprosos lamentava-se, pedindo esmolas, e quase foram esmagados pela multidão que chegava. Maria viu alguns soldados romanos, a cavalo, olhando e atentos para o caso de qualquer problema. Seus capacetes, com um penacho, pareciam ameaçadores contra o céu azul. Os viajantes diminuíram o ritmo, quase para um passo de tartaruga, ao chegarem à porta; a mãe de Maria segurou-a junto de si, pela pressão exercida pela multidão à sua volta; de repente, todos se sentiram apertados e conseguiram atravessar a porta e entrar na cidade de Jerusalém. Mas não havia tempo para parar e admirar as coisas; a massa que vinha atrás empurrava todo o mundo para a frente. Aah!, exclamavam as pessoas à sua volta, em sinal de admiração.
À noite, acamparam fora dos muros da cidade, assim como outros milhares de peregrinos, estendendo-se em sua volta como se fosse uma segunda muralha. Sempre ocorria isso por ocasião das grandes festas; às vezes, meio milhão de peregrinos convergia para a cidade, que, naturalmente, não os podia alojar. E assim, uma segunda Jerusalém espalhava-se em torno da cidade. Risadas, canções e vozes animadas chegavam de outras barracas e fogueiras, as pessoas visitavam umas às outras, buscando parentes e amigos de outros vilarejos. E os judeus estrangeiros, que haviam viajado grandes distâncias para orar no Templo, sobressaíam pelas suas barracas estranhas: tinham cúpulas, pavilhões de seda e as entradas eram ornamentadas. Embora alguns deles vivessem longe das suas terras ancestrais por mais de dez gerações, ainda consideravam o Templo o seu lar espiritual.
Maria fechou os olhos, tentando dormir. Mas era difícil, com a algazarra da festa em sua volta. Em vez de Jerusalém, tornou a sonhar com o misterioso bosque de árvores com estátuas. O branco das estátuas na sua base de mármore, visível no luar do sonho, parecia flutuar com espuma nas ondas do oceano. O sussurro das árvores, a glória do mármore iluminado pela luz do luar e as promessas de segredos perdidos rodopiavam, como um turbilhão, nos seus sonhos.  Levantaram-se quando ainda estava escuro e começaram a preparar-se para entrar de novo na cidade, desta vez para cumprir os rituais da festa. Maria estava tão curiosa para ver o Templo, que tremia. Hoje, dia da festa, a multidão era ainda maior que na véspera. Rios de pessoas obstruíam as ruas, pressionando de tal forma as paredes das casas que quase parecia que estas não resistiriam aos empurrões. Alguns dos peregrinos eram bastante curiosos: os que vinham da Frígia, suando sob os seus pesados capotes de pele de cabra; outros, da Pérsia, com roupas de seda e brocados de ouro; os fenícios, com as suas túnicas e calças listradas; os babilónios, com os seus mantos pretos, sombrios. Embora todos se empurrassem uns aos outros, ansiosamente, na direcção do Templo, pareciam menos piedosos que vorazes, como se ali houvesse algo que estavam prontos a devorar.
Ao mesmo tempo, os barulhos da cidade começavam a fundir-se numa zoada. Os berros dos vendedores de água, certos de que fariam bons negócios, os cânticos dos peregrinos, a gritaria dos mercadores, que esperavam vender bijuterias e véus, e, acima de tudo, os balidos dos rebanhos de ovelhas sendo levadas ao Templo, para sacrifício, tudo isso ressoava como um estrondo doloroso. De algum lugar, bem ao longe, ouviram-se explodir as trombetas de prata do Templo, anunciando a celebração». In Margaret George, A Paixão de Maria Madalena, 2002, Saída de Emergência, Edições Fio de Navalha, 2005, ISBN 972-883-911-1.

Cortesia de SdeEmergência/JDACT