Educada para reinar. Uma
infância coimbrã
O avô Jaume, o Desditoso, conde de Urgell
«(…) A 25 de Julho de 1409, subitamente, faleceu Martí, o Jovem, rei da Sicília e herdeiro do trono aragonês, deixando
apenas um filho ilegítimo, Fadrique de Luna. Martí, o Humano viúvo desde 1406,
casou então com Margarida de Prades para rentar ter um novo filho varão, ao
mesmo tempo que pediu ao papa a legitimação de seu neto Fadrique. Por essa
altura, também nomeou Jaume governador-geral dos reinos da sua Coroa. Contudo,
na sua actividade governativa, o conde de Urgell não se mostrou capaz de servir
de árbitro nos enfrentamentos entre bandos nobiliárquicos nem de agradar à
burguesia citadina. Isto levou o rei a duvidar das suas capacidades e a
suspender a sua lugar-tenência a 18 de Maio de 1410. Foi um dos seus últimos gestos, pois Martí, o Humano, faleceu a 31 desse mês, sem
descendência. No seu testamento, não havia nomeado herdeiro porque, segundo se
supõe, estava à espera, para o fazer, da legitimação do seu neto, que só chegou
dois dias antes da sua morte. Assim, o trono ficou vago e seguiu-se um interregno
de dois anos, durante o qual foi mantida a ordem por uma comissão de doze
homens nomeados pela Diputación del General de Cataluña. Diversos
candidatos ao trono se apresentaram, todos com um parentesco mais ou menos
próximo com o defunto. Por via masculina, havia Fadrique de Luna, seu neto
ainda criança, e Jaume II de Urgell, neto de um irmão de seu pai. Por via
feminina, havia Louis III d'Anjou, duque de Calabria, filho de Violant, sua
sobrinha, e Fernando de Antequera, filho de sua irmã Elionor, já que Juan II,
rei de Castela, havia renunciado aos seus direitos a favor do tio.
As lutas entre os partidários destes aspirantes a
soberanos provocaram o caos nos reinos de Valencia e Aragão, permitindo a
Fernando aparecer como pacificador com as suas tropas castelhanas. Por outro
lado, o dinheiro de que este dispunha fê-lo ir conquistando apoiantes e a sua
ligação ao papa Bento XIII ganhou-lhe a simpatia do respectivo confessor, frei
Vicente Ferrer. Ora, este notável orador e seu irmão Bonifacio foram,
precisamente, dois dos delegados escolhidos para eleger o novo rei. Com efeito,
depois de várias tentativas baldadas para conseguir a reunião de um parlamento
geral da Coroa de Aragão, os parlamentares das diferentes regiões acabaram por
decidir seguir a sugestão de Bento XIII, de elegerem um corpo restrito de
pessoas tementes a Deus, conhecedoras da lei e preocupadas com o bem público,
para determinar qual o candidato mais idóneo. Foram, assim, nomeados nove
delegados, três pelo principado da Catalunha, três pelo reino de Aragão e três
pelo de Valencia (entre os quais os irmãos Ferrer); o reino de Maiorca
não se fez representar. Reunidos no castelo de Caspe, daí o nome de compromisso
de Caspe dado à resolução, os delegados ouviram os candidatos, ponderaram
os respetivos direitos e a 12 de Junho de 1412
votaram, tendo-se manifestado uma clara maioria a favor do infante castelhano. O
recém-eleito Ferran I convocou as cortes para Setembro, em Zaragoza, para se
fazerem os tradicionais juramentos de fidelidade ao rei. O conde de Urgell não
compareceu, mas o novo monarca tentou conquistá-lo, oferecendo-lhe o título de
duque de Montblanc e 150 000 florins, assim como uma aliança familiar através
de casamento de seu filho Enrique com Isabel,
herdeira do conde. Jaume pareceu submeter-se, enviando procuradores
para jurarem obediência a Ferran I em Lleida, em Outubro de 1412, mas sete meses volvidos
revoltou-se e tomou armas contra o soberano. Os seus ataques contra as cidades
de Huesca e Lleida não tiveram, porém, qualquer sucesso e ele acabou por se
entrincheirar com as suas tropas no castelo de Balaguer, onde se viu obrigado a
capitular a 31 de Outubro de 1413,
após um prolongado cerco.
Em consequência do processo que então lhe foi posto, a 29 de Novembro de
1413 Jaume II de Urgell foi
privado de todos os seus títulos, dignidades, ofícios e bens, sendo o condado
incorporado na Coroa; foi ainda condenado a prisão perpétua e enviado cumprir a
pena no castelo de Urueña, perto de Cidade Rodrigo, em Castela. Em 1426, todavia, quando as relações de Aragão
com o reino vizinho se tornaram tensas, com medo que o soberano castelhano Juan
II se pudesse apoderar dele e usá-lo para desestabilizar a sua Coroa, o filho
de Ferran I, Alfons V fê-lo regressar ao seu território, encerrando-o na
fortaleza de Xativa, a sul de Valencia, onde ficou até morrer, em 1 de Junho de
1433». In Ana Maria S. A. Rodrigues, As
Tristes Rainhas, Rainhas de Portugal, coordenação de Ana Maria S. A. Rodrigues,
Isabel Guimarães Sá, Manuela Santos Silva, Círculo de Leitores, 2012, ISBN
978-972-42-4708-3.
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