D. Brites (Beatriz)
«(…) Em Alcáçovas, em 1447,
em cerimónia conjunta, a que assistiram o rei, o regente Pedro e a mãe das
noivas, a viúva do infante João, celebraram-se os matrimónios das duas irmãs.
D. Isabel toucar-se-ia com uma coroa de rainha, mas D. Brites, tomando as palavras de António Caetano Sousa,
desposava o mayor senhor que nunce
houve em Hespanha, que não fosse Rey. De facto, não é de estranhar que
o notável teatino, académico da Real Academia da História Portuguesa,
assim considerasse o infante Fernando, já que o mero
elencar dos títulos e senhorios, que iria reunir no curto percurso da sua vida,
comprovava a importância e poder da sua casa: 1º duque de Beja; 2º duque de Viseu, por sucessão do infante Henrique
que, não tendo tomado estado e carecendo de descendentes que pudessem perpetuar
a sua memória, elegera o sobrinho como filho adoptivo, em testamento lavrado em
Estremoz, a 7 de Março de1436; 5º
condestável do reino, ocupando a vacatura deixada pelo condestável Pedro, filho
do regente Pedro; 9º mestre da Ordem de Cristo e 12º o mestre da Ordem de
Santiago; fronteiro-mor do Alentejo e do reino do Algarve; alcaide-mor da Guarda,
de Tavira e de Marvão; senhor da Covilhã, de Serpa, de Moura, de Lagos, de
Gouveia, da terra de Besteiros, de Lafões, de Sátão, detendo ainda a exploração
das saboarias do reino com o respectivo monopólio do fabrico e venda do sabão;
os direitos reais, judiaria e mouraria nas terras de Santarém; as rendas e
direitos das lezírias dos barrocais da Redinha e a posse e administração dos
arquipélagos da Madeira e dos Açores e das ilhas de Santiago, Maio, Boavista e Sal,
no arquipélago de Cabo Verde, e ainda o senhorio de Anafé, no Norte de África.
Tão vasto património provinha das régias doações de seu irmão, mas continha-se
essencialmente no legado do infante Henrique, seu tio. As mercês concedidas ao infante
Fernando foram de tal grandeza que, na relação extraída do Livro
dos Contos do Reino, relativos a 1461 a 1469, regista-se que a mor
contia (...) foy despachada ao Iffamte dom Fernando, em que para seu
assentamento recebera da coroa, no ano de 1461,
dois milhões duzentos e oito mil quinhentos e sessenta e um reais, pagos nos
almoxarifados de Setúbal, Faro, Tavira e Beja.
Duquesa de Viseu e duquesa de Beja. Uma rica e poderosa dona
Nada nos é dito sobre o que teria pensado a jovem em relação ao noivo que
lhe impunham.
Era ainda uma adolescente quando se celebraram os esponsais. Talvez tenha ficado
agradada pelo facto de Fernando ser tão
jovem quanto ela, enquanto sua irmã iria encontrar um marido vinte anos mais
velho. Decerto teria ficado embevecida com o riquíssimo enxoval com que sua mãe
a presenteara. Um enxoval em que, a par
das peças que deviam bem apetrechar uma casa, fossem ornamentos, como panos de
rás ou cortinas douradas e prateadas, fossem de uso quotidiano, como os gomis,
os picheis, os saleiros, as confeiteiras ou os castiçais para brandões, avultavam
as jóias de fino lavrado, onde brilhavam os diamantes, as esmeraldas, os rubis,
as pérolas grossas, e se arrolavam as crespinas de ouro, de veludo e de
cambraia, as toucas estufadas, as opas e mantos de brocado, de veludo e de damasco,
os chapins dourados, os espelhos de âmbar, os perfumes, as alfaias sagradas, as
arcas de Flandres, os cofres de Aragão. Um enxoval digno de uma princesa
ou de uma sultana, nas palavras do conde de Sabugosa, que, extasiado na leitura
do registo, não encontrou similitude para tanta grandeza senão nos lendários
faustos do Oriente. Ou seja, o enxoval, demonstrando a generosidade de quem
dava e a magnificência de quem o recebia, antecipava a grandeza e o poder que constituiriam
apanágio da Casa de Viseu-Beja». In Maria Odete Sequeira Martins, D. Brites
(Beatriz). 1429-1506, Mulher de Ferro, Quidnovi, 2011, Via do Conde, ISBN
978-989-554-789-0.
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