quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Mulher de Ferro. D. Brites (Beatriz). 1429-1506. Maria O. Martins. «Um enxoval em que, a par das peças que deviam bem apetrechar uma casa, fossem ornamentos, como panos de rás ou cortinas douradas e prateadas, fossem de uso quotidiano, como os gomis, os picheis, os saleiros, as confeiteiras ou os castiçais para brandões…»

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D. Brites (Beatriz)
«(…) Em Alcáçovas, em 1447, em cerimónia conjunta, a que assistiram o rei, o regente Pedro e a mãe das noivas, a viúva do infante João, celebraram-se os matrimónios das duas irmãs. D. Isabel toucar-se-ia com uma coroa de rainha, mas D. Brites, tomando as palavras de António Caetano Sousa, desposava o mayor senhor que nunce houve em Hespanha, que não fosse Rey. De facto, não é de estranhar que o notável teatino, académico da Real Academia da História Portuguesa, assim considerasse o infante Fernando, já que o mero elencar dos títulos e senhorios, que iria reunir no curto percurso da sua vida, comprovava a importância e poder da sua casa: 1º duque de Beja; 2º duque de Viseu, por sucessão do infante Henrique que, não tendo tomado estado e carecendo de descendentes que pudessem perpetuar a sua memória, elegera o sobrinho como filho adoptivo, em testamento lavrado em Estremoz, a 7 de Março de1436; 5º condestável do reino, ocupando a vacatura deixada pelo condestável Pedro, filho do regente Pedro; 9º mestre da Ordem de Cristo e 12º o mestre da Ordem de Santiago; fronteiro-mor do Alentejo e do reino do Algarve; alcaide-mor da Guarda, de Tavira e de Marvão; senhor da Covilhã, de Serpa, de Moura, de Lagos, de Gouveia, da terra de Besteiros, de Lafões, de Sátão, detendo ainda a exploração das saboarias do reino com o respectivo monopólio do fabrico e venda do sabão; os direitos reais, judiaria e mouraria nas terras de Santarém; as rendas e direitos das lezírias dos barrocais da Redinha e a posse e administração dos arquipélagos da Madeira e dos Açores e das ilhas de Santiago, Maio, Boavista e Sal, no arquipélago de Cabo Verde, e ainda o senhorio de Anafé, no Norte de África.
Tão vasto património provinha das régias doações de seu irmão, mas continha-se essencialmente no legado do infante Henrique, seu tio. As mercês concedidas ao infante Fernando foram de tal grandeza que, na relação extraída do Livro dos Contos do Reino, relativos a 1461 a 1469, regista-se que a mor contia (...) foy despachada ao Iffamte dom Fernando, em que para seu assentamento recebera da coroa, no ano de 1461, dois milhões duzentos e oito mil quinhentos e sessenta e um reais, pagos nos almoxarifados de Setúbal, Faro, Tavira e Beja.

Duquesa de Viseu e duquesa de Beja. Uma rica e poderosa dona
Nada nos é dito sobre o que teria pensado a jovem em relação ao noivo que lhe impunham. Era ainda uma adolescente quando se celebraram os esponsais. Talvez tenha ficado agradada pelo facto de Fernando ser tão jovem quanto ela, enquanto sua irmã iria encontrar um marido vinte anos mais velho. Decerto teria ficado embevecida com o riquíssimo enxoval com que sua mãe a presenteara. Um enxoval em que, a par das peças que deviam bem apetrechar uma casa, fossem ornamentos, como panos de rás ou cortinas douradas e prateadas, fossem de uso quotidiano, como os gomis, os picheis, os saleiros, as confeiteiras ou os castiçais para brandões, avultavam as jóias de fino lavrado, onde brilhavam os diamantes, as esmeraldas, os rubis, as pérolas grossas, e se arrolavam as crespinas de ouro, de veludo e de cambraia, as toucas estufadas, as opas e mantos de brocado, de veludo e de damasco, os chapins dourados, os espelhos de âmbar, os perfumes, as alfaias sagradas, as arcas de Flandres, os cofres de Aragão. Um enxoval digno de uma princesa ou de uma sultana, nas palavras do conde de Sabugosa, que, extasiado na leitura do registo, não encontrou similitude para tanta grandeza senão nos lendários faustos do Oriente. Ou seja, o enxoval, demonstrando a generosidade de quem dava e a magnificência de quem o recebia, antecipava a grandeza e o poder que constituiriam apanágio da Casa de Viseu-Beja». In Maria Odete Sequeira Martins, D. Brites (Beatriz). 1429-1506, Mulher de Ferro, Quidnovi, 2011, Via do Conde, ISBN 978-989-554-789-0.

Cortesia de Quidnovi/JDACT