Vimos chegar as andorinhas
«Vimos chegar as andorinhas
conjugarem-se as estrelas
impacientarem-se os ventos.
Agora
esperemos o verão
do teu nascimento
tranquilos, preguiçosos.
Tão inseparáveis as nossas fomes.
Tão emaranhadas as nossas veias.
Tão indestrutíveis os nossos sonhos.
Espera-te um nome
breve como um beijo
e o reino ilimitado
dos meus braços.
Virás
como a luz maior
no solstício de Junho.
Quimera
«Eu quis um violino no telhado
e uma arara exótica no banho.
Eu quis uma toalha de brocado
e um pavão real do meu tamanho.
Eu quis todos os cheiros do pecado
e toda a santidade que não tenho.
Eu quis uma pintura aos pés da cama
infinita de azul e perspectiva.
Eu quis ouvir, ouvir a história de
Mira Burana
na hora da orgia prometida.
Eu quis uma opulência de sultana
e a miséria amarga da mendiga.
Eu quis um vinho feito de medronho
de veneno, de beijos, de suspiros.
Eu quis a morte de viver dum sonho
eu quis a sorte de morrer dum tiro.
Eu quis chorar por ti durante o
sono
eu quis ao acordar fugir contigo.
Mas tudo o que é excessivo é muito
pouco.
Por isso fiquei só, com o meu corpo».
Poemas de Rosa
Lobato de Faria, in ‘Antologia’
JDACT