A casa ducal de Borgonha: a ascendência do conde Henrique
«(…) É tempo de abordarmos o enquadramento genealógico do conde Henrique.
Para o traçarmos recorreremos a vários estudos sobre a casa ducal de Borgonha,
alguns dos quais o tempo se encarregou de transformar em verdadeiros clássicos.
Abordemo-los por ordem cronológica. A primeira obra francesa que estabeleceu a
ligação entre a casa ducal de Borgonha e as origens da família real portuguesa
foi um pequeno opúsculo de Théodore
Godefroy (1580-1649) intitulado De
l'Origine des Roy de Portugal yssus en ligne masculine de la Maison de France,
editado em 1610. Théodore
Godefroy, historiador da Casa Real francesa, valorizou um fragmento de uma
crónica dos inícios do século XII que tinha sido editado pela primeira vez em
Frankfurt em 1596. Nesse texto,
quase coevo dos acontecimentos a que se reportava, o seu autor, conhecido como
o monge anónimo da abadia de Fleury,
registara a filiação do conde portucalense, entroncando-o na família ducal de
Borgonha:
Ele escolheu para esposa Constança, filha de Roberto, duque dos Borgonheses,
da qual gerou uma filha que.deu em casamento ao conde Raimundo, que era conde
para lá, do [rio] Árar. A outra filha, mas que não nasceu a partir do tálamo
dos esposos, deu-a a Henrique, um dos filhos do duque Roberto.
A obra de Théodore Godefroy teve um visível sucesso, tendo
conhecido três edições no curto espaço de cinco anos: em 1610, 1612 e 1614. Mas a primeira obra que
verdadeiramente deve ser classificada como um estudo genealógico da família ducal borgonhesa é o tratado
seiscentista de André Duchesne de Tourangeau intitulado Histoire des Roys, Ducs et Comtes de
Bourgongne et d’Arles. Extraicte de Diverses Chartes et Chroniques Anciennes, et
divisée en IIII Livres (Paris, Chez Sebastien Cramoisy, 1619). A este estudo pioneiro
sucedeu-se um outro, editado pelo mesmo autor poucos anos depois, intitulado Histoire Genéalogique des Ducs de Bourgongne
de la Maison de France (Paris, Chez Sebastien Cramoisy, 1628), onde Duchesne conseguiu ampliar
significativamente os dados genealógicos e documentais sobre os vários
elementos desta linhagem. Assim, podemos considerar que foi este geógrafo do rei
de França quem verdadeiramente lançou os alicerces da história genealógica da casa
ducal de Borgonha, desbravando fontes inéditas, algumas delas entretanto
perdidas, e sistematizando muita informação.
No entanto, a obra decisiva sobre a família ducal de Borgonha continua a
ser o estudo de Ernest Petit, Histoire
des Ducs de Bourgogne de la Race Capétienne (dois volumes, Paris, 1885-1905),
que foi o corolário de vários anos dedicados pelo autor ao estudo dessa
linhagem. Já no século XX, alguns autores consagraram a sua atenção à família
ducal de Borgonha. Foi o caso do cónego Maurice Chaume ou, já na segunda metade
da centúria, de Jean Richard, autor de um importante estudo de história económica,
que no entanto apresenta poucas novidades para o conhecimento genealógico da
família do conde portucalense Henrique de Borgonha. Acrescentemos,
para finalizu, o recente estudo linhagístico e prosopográfico que Patrick van
Kerrebrouck dedicou aos Capetos, na Nouvelle Histoire Généalogique de l’Auguste Maison de France, onde consagrou
um capítulo aos duques de Borgonhaa.
Henrique de Borgonha, conde de Portucale, era irmão de
dois duques de Borgonha (Hugo I e Eudes I, Borel)
e neto do duque Roberto I, o Velho,
figura cimeira desta linhagem. Era ainda sobrinho da rainha D. Constança (segunda
mulher de Afonso VI de Leão e Castela) e sobrinho-neto de Hugo, o Grande, o carismático abade de
Cluny. Finalmente, ere bisneto de Roberto II, o Pio, rei de França. Abordemos, sucintamente, os antepassados do
conde portucalense, para compreendermos a teia de relações que o unia à mais
alta nobreza de além-Pirenéus e mesmo à família real francesa».
In Luís Amaral, Mário Barroca, A Condessa-rainha, Teresa, coordenação
de Ana Maria Rodrigues e Outras, Círculo de Leitores, 2012, ISBN
978-972-42-4702-1.
Cortesia de C. Leitores/JDACT