quinta-feira, 31 de outubro de 2013

O Jornalismo em Evolução. Adriana Mello Guimarães. Nuno R. Fernandes. «Ora, tais ideias compõem uma verdadeira teoria do jornalismo, na medida em que evidenciam as principais funções da imprensa: ‘informar; interpretar; actuar e intervir’»

Cortesia de wikipedia

Resumo
Que mudanças ocorreram no jornalismo? É a pergunta que procuramos responder. Para tanto, pretendemos realizar uma análise sobre o desenvolvimento do jornalismo. A nossa análise parte do século XIX, pois foi um período de expansão da imprensa portuguesa, um legado rico, marcado por um carácter idealista e doutrinário que serviu para o estabelecimento das coordenadas ideológicas de toda uma memória colectiva até chegar ao jornalismo on-line, que proporciona rapidez para informar, mas também para desinformar.

A ascensão de uma profissão
«Ao longo do século XIX, numa época em que só a imprensa escrita existia como meio de comunicação de massa, os jornais desempenharam um papel revolucionário na vida social. Em Portugal, um artigo da Revista Universal Lisbonense registava a seguinte observação: A imprensa cinge o mundo. Dantes reinava a espada – hoje governa a pena (…) A antiga civilização estava nas guerras, a nova está na imprensa, que chama a atenção para o poder da imprensa enquanto difusora de ideias que suscita a discussão. Nesse contexto oitocentista, marcado pela exigência de uma consciência social, cabe a interrogação: qual era o conceito de jornalismo? No mundo europeu industrializado, a melhoria dos transportes, o alargamento da vida escolar e a evolução das técnicas gráficas foram determinantes para fazer do jornalismo uma actividade sustentável. A inserção da acção jornalística como factor de produção cultural na vida moderna logo se fez reflectir em Portugal: O jornalismo desempenhava na difusão das atitudes inovadoras papel de relevo, condicionado embora pelo analfabetismo generalizado e pelo baixo poder de compra dos possíveis leitores. Mas a imprensa de então é, apesar de tudo, uma realidade cultural de peso (…) só de 1869 a 1871 surgiram em todo o país, 45 novas tentativas. São, sobretudo, folhas políticas, literárias, de anúncios, religiosas, humorísticas, pedagógicas. De facto, o jornalismo oitocentista conferiu à vida do espírito uma presença social mais intensa, e marcou a mentalidade nacional de toda uma geração como um espaço de formação da opinião e da consciência do cidadão.
Nesse espaço, os literatos ocuparam, desde sempre, um lugar de destaque:
Os jornais eram, à época, importantes centros sociais. Era ali – e Eça recordá-lo-á em várias obras – que se faziam amigos, se discutia política, se ficava a par das intrigas do dia. Um periódico oitocentista era o centro do mundo. (Mónica, 2001,p.33) Ao longo dessa fase da chamada “imprensa de opinião”, as empresas jornalísticas contaram com a participação de grandes nomes da literatura e caracterizaram-se por manter, em termos de recursos humanos, uma estrutura centralizada:
O chefe da redacção era o verdadeiro espírito e a alma da publicação. O jornal, geralmente, era um homem, mais até do que um partido. (…) Era o redactor responsável com a sua personalidade, quem, dentro das coordenadas gerais, imprimia ao jornal uma vida própria. Ideologicamente, devemos lembrar que a imprensa da época é, em primeiro lugar política, em segundo lugar, literária e só acidentalmente noticiosa dos acontecimentos da vida quotidiana. No que diz respeito à circulação da informação, uma característica importante desta fase é assinalada por Tengarrinha: Em voz alta liam-se (…) os editoriais dos jornais mais importantes: de tal maneira, assim, a Imprensa e a oratória andavam intimamente ligadas. Entre os múltiplos escritores que emprestaram a sua pena a imprensa, destacamos o crítico alentejano Fialho Almeida que, conforme o espírito da época, entendia o jornalismo como uma missão pedagógica de intervenção e, sobretudo, como um meio para a circulação de ideias. Daí afirmar: Da imprensa deriva toda a espécie de incentivo e de energia fecunda e transformável que vai depois propulsar em todos os distritos gerais da actividade, moral e ciência, indústria e arte, política e religião. Na sequência deste pensamento, Fialho defende o interesse da esfera pública, o chamado espírito públicoÉ a imprensa que reforça e purifica a voz da opinião.
Outro grande escritor oitocentista, Eça de Queirós, concebia um jornalismo de projecção para o futuro, onde era necessário relacionar os factos para melhor compreender e fazer entender. Vejamos, logo no primeiro número de O Distrito de Évora, que fora posto a circular no dia 6 de Janeiro de 1867, o que Queirós afirma:
O jornalismo na sua justa e verdadeira atitude, seria a intervenção permanente do país na sua própria vida política, moral, religiosa, literária e industrial. […] É o grande dever do jornalismo fazer conhecer o estado das coisas públicas, ensinar ao povo os seus direitos e as garantias da sua segurança, estar atento às atitudes que toma a política estrangeira, protestar com justa violência contra os actos culposos, frouxos, nocivos, velar pelo poder interior da pátria, pela grandeza moral, intelectual e material em presença das outras nações, pelo progresso que fazem os espíritos, pela conservação da justiça, pelo direito, da família, do trabalho, pelo melhoramento das classes infelizes.
Ora, tais ideias compõem uma verdadeira teoria do jornalismo, na medida em que evidenciam as principais funções da imprensa: informar; interpretar; actuar e intervir. Por outro lado, cabe assinalar o surgimento de novos processos comunicacionais que deram origem à chamada fase da imprensa industrial. De facto, segundo José Tengarrinha, só entre 1865 e 1885 é que se estabeleceram em Portugal as condições propícias à transformação industrial da imprensa, o que deu ênfase à informação como preocupação e objectivo». In Adriana Mello Guimarães e Nuno R. Fernandes, O jornalismo em Evolução, Trabalho apresentado no III Seminário de I&DT, organizado pelo Centro Interdisciplinar de Investigação e Inovação do Instituto Politécnico de Portalegre, Dezembro, 2012.

Cortesia do IPP/JDACT