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A Questão
Judaica (séculos XV-XX). Os Judeus em Portugal no século XV
A População
«Os
finais de Trezentos conheceram um aumento demográfico na população de crença
judaica no reino, ao contrário do que viria a acontecer com a minoria moura
forra, que tenderia a diminuir. As comunidades de Évora e do Porto viram as
suas judiarias crescerem, devido à deslocação de judeus dos reinos vizinhos para
Portugal, provocada pelos levantamentos antijudaicos na Catalunha e em Castela,
a que se juntaram as pregações inflamadas de alguns frades, como Vicente
Ferrer. Além da expansão dos bairros judaicos para as zonas da cristandade,
ocorreu também a fixação das gentes da minoria em centros urbanos, onde antes
não existiam. À primeira metade do século XV pertenceram as comunidades
judaicas de Braga e de Barcelos, por exemplo. O êxodo dos judeus castelhanos que,
paulatinamente, ao longo desta centúria, foi engrossando com o número de
emigrantes para o reino português, originou uma proliferação de judiarias em
concelhos rurais, como Linhares, Castelo Mendo, Melo, na Beira, ou Évoramonte, Benavila,
etc., no Alentejo, ou o seu aparecimento nos termos das grandes cidades, como
Azurara, Arrifana, Gaia, Matosinhos e Vila do Conde, dependentes da comuna do
Porto, e Sacavém, Tojal. Almada, ligadas à comunidade de Lisboa.
A
comprovar esta mobilidade e a consequente fixação em território português,
temos a própria onomástica de origem toponímica: Catalão, Navarro, de Nájera,
Barcelonim, de Valença, Valencim, Toledano, Sevilhano, Segoviano, de Huesca,
etc., onde o verdadeiro nome da família judaica desapareceu, substituído pelo
da proveniência. O crescimento demográfico não estava somente relacionado com a
imigração dos judeus de origem peninsular, alguns deles atraídos pelo boom económico, provocado pelos
descobrimentos a partir de meados de Quatrocentos. Para ele contribuiu, também,
o facto de a família judaica ser constituída por um grande número de filhos que
atingiam a idade adulta, a que se juntava a longevidade de alguns dos seus
membros. Tudo isto pode-nos fazer compreender como, de cerca de 32 comunidades
existentes nos finais do século XIV, se passou para 140 localidades com
judiarias, em 1496, ou seja, na
altura do édito de expulsão do rei Manuel I. Durante este tempo as quatro maiores
comunas foram: Lisboa, Évora, Porto e Santarém.
Em
finais de Quatrocentos a população judaica de origem portuguesa não deveria
ultrapassar os 30 000 indivíduos. Estes viram-se confrontados, em 1492, com a expulsão dos judeus de
Castela, ordenada pelos Reis Católicos, com um acréscimo exagerado de correligionários
seus que viriam alterar o clima de relativa estabilidade existente entre a
maioria cristã portuguesa e a minoria judaica. Com permissão de João II e
contra a opinião dos seus conselheiros e dos povos, os judeus castelhanos
utilizaram, na sua maioria, Portugal como local de passagem para o Norte de
África e para as cidades italianas, nomeadamente Nápoles. Alguns deles, as 600 casas ou famílias receberam autorização
régia para permanecer no reino. De um momento para o outro a população judaica
duplicou, senão triplicou, o que não viria a ser benéfico para os judeus
portugueses. O acréscimo populacional de origem peninsular, nomeadamente
castelhana, levaria ao aumento do espaço municipal, ocupado pelos indivíduos da
minoria. Tal foi o caso da Rua de S. Miguel, no Porto, onde se teriam fixado
Isaac Aboab e os seus companheiros; ou a fixação de crentes moisaicos
nas casas cristãs de Évora, com a viva oposição do concelho. Este crescimento
demográfico levou-os a espalharem-se pelo reino e a localizarem-se em
municípios, onde o seu peso populacional seria até então reduzido. Este facto
poderá explicar a criação da sinagoga de Gouveia, em 1496, ou seja, pouco antes do édito de expulsão dos judeus de
Portugal.
A Sociedade Judaica
Embora
a documentação portuguesa seja mais abundante para o século XV do que para os
anteriores, permanece, no entanto, o desconhecimento sobre a organização social
das comunas judaicas, assim como o elenco das principais famílias e a sua
genealogia. Podemos, todavia, afirmar, se tivermos em atenção a globalidade da
sociedade medieval portuguesa, que as gentes desta minoria se integravam numa classe média de mercadores e homens dos
mesteres e, menos frequentemente, de proprietários rurais». In
História de Portugal, João Medina, volume VII, Judeus, Inquisição e
Sebastianismo, Maria José Pimenta Ferro Tavares, A Questão Judaica, SAPE, Ediclube,
Alfragide, Mateu Cromo, Madrid, 2004, ISBN 972-719-275-0.
Cortesia
de Ediclube/JDACT