quinta-feira, 20 de novembro de 2014

A Conquista de Lisboa. 1578 1583. Violência Militar. Comunidade Política. Rafael Valladares. «… a circunstância de Alba se encontrar desterrado em Uceda desde Janeiro de 1579, em castigo por ter autorizado o casamento do seu filho Fadrique com uma sua prima em segundo grau, sem licença real»

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Violência
A escolha de Alba
«(…) A ligação entre os factos da Flandres e a conquista de Portugal evidenciou-se pelo menos em três pontos: em ambos os casos, Madrid tratou de punir duas rebeliões consideradas como domésticas, e também em ambos Alba tentou aplicar um projecto baseado em dois tempos (primeiro, uma repressão violenta o mais breve possível, a que se seguiria uma viagem do rei para conceder perdões), e em ambos os casos, por fim, o duque promoveu a criação de um tribunal especial para ditar a justiça sumária destinada aos rebeldes. Só este último ficou por realizar em Portugal no ano de 1580, certamente por causa dos resultados contraproducentes que Filipe II havia obtido nos Países Baixos com o Tribunal dos Tumultos. Contudo, o rei pôs em marcha algo muito semelhante nos Açores, quando esmagou finalmente a resistência das ilhas que se lhe opunham, em 1583. Claro que era inevitável que todas as mentes recordassem o protagonismo de Alba no episódio flamengo. Em plena campanha portuguesa, perante a tomada iminente de Cascais, o seu defensor Diogo Meneses desafiou o duque para que medisse a sua espada e verificasse se se havia tão bem com os portugueses como com os flamengos. O próprio Filipe II não resistiu a comparar o seu opositor, o prior do Crato, com o também rebelde Guilherme de Orange. Diante daqueles que subestimavam a fuga do bastardo luso, o rei ironizou: ..não sei se se disse o mesmo do de Orange, pelo que não há que fiar até que o tenhamos morto ou preso.
Ainda que estes comentários não expliquem completamente se Alba foi escolhido para invadir Portugal pela sua experiência bélica em geral, ou se pela adquirida na Flandres em particular, há motivos para acreditar que a segunda razão pesou mais do que a primeira. A escolha do general máximo de uma guerra sintetiza sempre o próprio sentido da mesma e a sua natureza, a ponto de revelar quais são os objectivos militares e as intenções políticas do atacante. No debate que, aparentemente, se travou em torno da escolha de Alba, confluíram várias linhas de argumentação, que se resumiam ao elogio da sua posição de veterano e prestígio, os partidários, ou em criticar a sua idade avançada, os detractores. Estes últimos militavam na facção do então já falecido príncipe de Eboli, o português Rui Gomes Silva, seu grande rival no governo, que exploraram a circunstância de Alba se encontrar desterrado em Uceda desde Janeiro de 1579, em castigo por ter autorizado o casamento do seu filho Fadrique com uma sua prima em segundo grau, sem licença real. A Coroa não podia permitir que uma linhagem como a dos Toledo decidisse estabelecer as suas alianças sem antes contar com as prioridades régias, sobretudo neste caso em que o noivo havia desprezado uma anterior prometida e, portanto, outra família aristocrática. Deste modo, quando estalou a crise sucessória de Portugal, Alba caíra em desgraça devido a uma curiosa combinação de luta pela sua estratégia familiar, desobediência ao rei e divisionismo cortesão. À medida que avançava o ano de 1579 e a via militar se ia consolidando como prioritária face à negociação, o nome do duque começou a soar cada vez mais entre os conselheiros de Filipe II como líder da invasão, incluindo-se o parecer de Cristóvão Moura, que alguma historiografia apontou como opinião decisiva. A ideia de que haviam de ser as endurecidas tropas espanholas destinadas à Flandres o aríete da invasão portuguesa deverá ter pesado a favor da candidatura de Alba, dada a identificação e cumplicidade protectora que se forjara entre o duque e os seus homens durante os extraordinários anos nos Países Baixos. O presidente do Conselho de Castela recordou, em Fevereiro de 1579: Vemos o grande descontentamento existente entre todos os soldados por não compreenderem que não seja o duque a chefiá-1os. Se em algum momento o que restava do grupo ebolista tinha contado para prejudicar Alba, este período chegou ao fim com outro acontecimento ocorrido a 28 de Julho do mesmo ano: as detenções de Ana Mendoza Lacerda, princesa viúva de Eboli, e do secretário real António Peréz, relacionadas com o assassínio do também secretário Juan Escobedo, que alvoraçara Madrid no mês de Março anterior. Durante o Inverno e a Primavera de 1579, redobraram-se as vozes a favor da nomeação de Alba para o empreendimento de Portugal, convertendo-o praticamente os seus defensores na única pessoa capaz de dar conta daquela operação. Fosse ou não assim, em Fevereiro de 1580 o rei anuiu, sobretudo depois de conhecer os argumentos de Moura a favor de Alba, devido ao prestígio de que o duque gozava em Portugal, de facto, o rei Sebastião pedira-lhe o seu parecer relativamente à jornada de Marrocos, que ele desaconselhou, e do medo que suscitava. … seria bom para espantalho, que para isso serve, acabou por reconhecer o monarca. A 25 de Fevereiro, Filipe II informou Cristóvão Moura que o duque estava já a caminho da Estremadura». In Rafael Valladares, A Conquista de Lisboa, 1578-1583, Violência Militar e Comunidade Política em Portugal, Texto Editores, Alfragide, 2010, ISBN 978-972-47-4111-6.

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