quinta-feira, 13 de novembro de 2014

A Diplomacia Liberal em Espanha através da Correspondência dos Representantes Portugueses. 1821-1823. Fernando Brandão. «Consignado em nove artigos, aos três primeiros dedicará a proposta da restituição de Montevideu. “Os dois seguintes tratam da devolução da Praça de Olivença”, incluindo indemnizações, delimitação fronteiriça e amnistias»

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«(…) Com fundamento no que havia já sido acertado, Pereira Mesquita chama a si a elaboração de um projecto (… ainda com Bardaxi y Azara elaborara-se um plano preliminar oportunamente remetido a Lisboa. Gizado sobre linhas gerais contemplava cinco pontos fundamentais: pôr termo às questões de Olivença e Montevideu; estabelecer circuitos comerciais; acertar acções comuns frente à concorrência de terceiros; qualificar auxílios a prestarem-se mutuamente em caso de ataque e, por fim, propor os princípios de uma Convenção para a entrega recíproca de criminosos, desertores, etc). Consignado em nove artigos, aos três primeiros dedicará a proposta da restituição de Montevideu. Os dois seguintes tratam da devolução da Praça de Olivença, incluindo indemnizações, delimitação fronteiriça e amnistias. Pelo artigo 6.º regulava-se terminantemente e definitivamente a mútua entrega de criminosos, desertores, etc.. Segundo o 7.º, obrigavam-se as partes a concluir, seis meses após a ratificação do Tratado, um outro de Comércio. E, como constava no artigo 8.º, uma Aliança defensiva, logo que possível, contra inimigos comuns, na Europa e nos domínios d’além-mar. Finalmente, pelo último, estendia-se às respectivas possessões em qualquer parte do Mundo a obrigatoriedade do acordado nos dois anteriores.
Como é óbvio, o que mais ressalta do projecto é a sua desmedida amplitude. Sem embargo, remetido para Lisboa, colhe pronta aprovação. Da parte de Pinheiro Ferreira, a única preocupação residiu na forma do seu processamento. Quanto a ele, haveria toda a vantagem em discutir o plano apenas entre os Governos, subtraindo-se ao juízo das Cortes. Só assim se obviariam os habituais atrasos e a desaconselhável publicidade. Tinham realmente larga justificação as apreensões do titular dos Estrangeiros. Por essa altura entrava em agenda no Soberano Congresso a questão de Montevideu. O debate suscitara imediata controvérsia entre duas facções. Uma, defensora da permanência portuguesa naquele território; outra, que frontalmente se lhe opunha. A discussão prolongou-se sem acordo. À falta deste, resultavam bloqueadas as negociações do projecto, a menos que dele fosse retirada a questão, como em despacho se informava para Madrid: … já vê que este assunto, por V. S. mui acertadamente posto no primeiro lugar no seu projecto não pode entrar no Tratado, pois não nos convém conservarmo-nos mais tempo no estado em que temos permanecido com tanta perda e nenhuma espécie de glória naquela Província.
Por seu turno Pereira Mesquita mantinha os contactos com o Gabinete espanhol, ao qual também entregara cópia do projecto. Ali, porém, tudo parecia facilitado, pois o monarca detinha suficientes poderes para concluir este tipo de tratado sem a intervenção das Cortes. Na audiência com Mardnez de la Rosa mostrara-se este compreensivo. Todavia, deixará bem claro o grande empenho espanhol em que se não abandonasse Montevideu às forças insurgentes. Como em ofício observava o nosso diplomata, invertiam-se as posições. O que seis anos antes originara viva repulsa, era agora ardentemente desejado, a ponto de se considerar a evacuação de Montevideu como um acto de hostilidade!... Para Madrid a presença portuguesa representaria um mal menor. De facto, o statuquo alimentava uma remotíssima esperança de recuperação daquele território. Caso retirássemos da área, seria certa a sua imediata independência, ou isolada ou adstrita à Província de Buenos Aires. Subjacente à atitude do Governo espanhol estaria o conhecimento de que a Assembleia de Montevideu votara a incorporação ao Reino de Portugal, Brasil e Algarves. Decisão aclamada no ano anterior, aguardava que o Soberano Congresso em Lisboa a admitisse, como veio a acontecer em meados de 1822». In Fernando  Castro Brandão, A Diplomacia Liberal em Espanha através da Correspondência dos Representantes Portugueses, 1821-1823, separata de A Diplomacia na História de Portugal, Academia Portuguesa da História, Lisboa, 1991.

Cortesia de APdaHistória/JDACT