A
Mulher que Amou Jesus
«(…) Descreveu Joel da forma mais
simpática que podia, mas enquanto o fazia pensava que ele ainda ficava bem
longe do soldado. Quando terminou, Quezia disse, amavelmente: parece que V. fez
uma boa escolha. Teremos de aposentar o Soldado e o Diplomata. Construiremos
nossas vidas com um tratador de peixe e... Meu pai recebeu recentemente uma oferta
da parte de um homem chamado Reuben ben-Asher, que fabrica espadas. Não espadas
comuns, apressou-se a explicar. São espadas muito elegantes, finas como um véu
e afiadas como uma navalha. Mas você não tomou uma decisão?, perguntou Maria. Meu
pai não decidiu, respondeu Quezia. Só irei encontrá-lo depois que ele disser
sim ou não. Naquele instante, Maria sentiu-se grata à sua família. Embora muito
rigorosos e tradicionalistas, pelo menos não haviam tomado a decisão por ela.
Apesar de uma liberdade aparente, Quezia estava em pior situação que ela.
Talvez estivesse consciente disso e isso tivesse servido para alimentar as suas
fantasias.
Se seu pai disser que sim, espero
que esse homem seja uma pessoa agradável, foi tudo o que conseguiu dizer. A
ideia de ser apresentada a um estranho e receber ordens de viver com ele até um
dos dois morrer era bastante grave. Quezia deu de ombros, tentando aliviar o
ambiente. Nós somos mulheres, disse. No final, nunca temos escolha. Quezia insistiu
que Maria deveria ficar para falar com a sua mãe e o seu pai. Satisfeita, Maria
ficou; não só porque gostava deles, mas também porque estava curiosa de ver o
que diriam. Sara, a mãe de Quezia, ficou encantada. Parece uma excelente proposta,
disse. Ele junta-se à sua família, mas V. não tem de se unir à dele. E ele é
atraente? É..., acho que sim, disse Maria. Aquele passeio à beira do lago
parecia insuficiente para servir de base a uma vida conjunta, mas ela achava
que descobrira uma certa afinidade espiritual com ele. É religioso?, perguntou
Sara. Pergunto porque sei que é importante para a sua família. Não..., não sei,
respondeu Maria, dando-se conta de que não haviam discutido o assunto.
Quando conhecera Quezia e os seus
pais, percebera que eram diferentes da sua família, mas não compreendera que as
duas famílias eram originárias de tradições religiosas distintas: fariseus e
saduceus. Os fariseus eram rigorosos na interpretação da Lei e não faziam
quaisquer concessões; os saduceus, embora mantendo a tradição sagrada,
adaptavam-se, no dia a dia, às circunstâncias materiais de menor importância.
Em consequência disso, os fariseus não faziam amizade com romanos ou gentios,
temendo serem contaminados, enquanto os saduceus acreditavam que era preferível
conhecer o inimigo de perto. Ambos se acusavam mutuamente de trair os interesses
do judaísmo. Mas é uma questão importante, você não acha?, perguntou Sara. Ele
não parece uma pessoa intolerante, respondeu Maria. Fora essa a sua primeira
impressão. Mas ele pode imaginar que todos os canecos devem ser quebrados, se forem
tocados por uma impureza, disse Benjamim, o pai de Quezia. E pode querer que V.
se vista com aquelas roupas austeras. Maria estremeceu. Mas ele não as usa. Sério,
Benjamim disse: e o que pensa ele do Messias? Nós não..., não falamos sobre o
Messias, disse, finalmente. Bom, isso é um bom sinal, disse Benjamim. Se ele
fosse do tipo daqueles que andam procurando o Messias, não iria deixar de falar
nisso.
Não conseguem evitá-lo. Você fica
um instante com eles, fala sobre a safra ou sobre o imperador, e imediatamente
eles fazem aquele olhar distante e dizem: quando o Messias vier... É bom ficar
longe dessa gente! Agora é tarde, pensou Maria. Como poderei ficar longe? Será
que Joel está esperando pelo Messias? Parece muito sensível. As pessoas que se interessam
pelo Messias são mais apaixonadas. Eu acho que Maria devia sentir-se satisfeita
por não ter sido procurada por aqueles pescadores, disse Quezia. Aqueles que entregam
peixe no armazém, você sabe, não é? Balançou a cabeça, sacudindo o cabelo
brilhante, que na privacidade de casa podia ficar descoberto. Eles fedem. Você
mesma disse isso!, disse, apontando para Maria. Encontramos com eles quando íamos
chegando ao cais, contou Maria. Os filhos de Jonas, Simão e André. Ah, eu sei,
disse Benjamim. Conheço Jonas. E, voltando-se para sua filha, disse, com ar sério:
você não estaria sendo tão arrogante se soubesse que Zebedeu me procurou para
falar sobre você. E quem é Zebedeu?, perguntou Quezia, assustada. Um pescador
famoso de Cafarnaum. Tem uma casa em Jerusalém e relaciona-se com pessoas da
casa real. E tem vários filhos?, perguntou Quezia. Tem dois, disse Benjamim. Tiago,
o mais velho, é um jovem muito ambicioso. Pelo menos é que o diz Zebedeu: que
ele está ansioso para que seu pai se aposente. E o filho mais novo é João. Como
quase todos os segundos filhos, João fica na sombra do irmão mais velho. E o
senhor..., o incentivou? Na verdade, não. Eu conheci Tiago e o achei muito
arrogante. E João é muito sonhador para o meu gosto. Nunca irá se dar bem, nem
mesmo se herdar os negócios de seu pai. Há algo de suave em João e as pessoas
logo irão se aproveitar dele. Não, você não precisa se preocupar, não terá de se
unir à família de Zebedeu». In Margaret George, A Paixão de
Maria Madalena, 2002, Saída de Emergência, Edições Fio de Navalha, 2005, ISBN
972-883-911-1.
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