Cortesia
de wikipedia e jdact
«Em
1471 Afonso V (1432-1481), rei de Portugal, decidiu voltar ao Norte de África
para dar continuidade à política de expansão africana da Coroa. O alvo
escolhido foi Arzila e, em Agosto de 1471, a vila foi conquistada por uma hoste
portuguesa que contou com 23.000 homens de combate. Pouco estudada pela
historiografia, a conquista de Arzila é meritória de um lugar de destaque fruto
da sua singularidade. Foi uma campanha meticulosamente planeada que incluiu a
compra de toneladas de mantimentos e armas e o recrutamento da maior hoste até
então levantada em Portugal. As consequências da queda de Arzila perduraram no
tempo: Tânger foi abandonada dias depois e o tratado de tréguas assinado com o
sultanato de Fez consolidou presença portuguesa na região, tendo esta
permanecido imperturbável até ao início do século XVI, e permitiu a Afonso V
abandonar de vez os campos de batalha norte-africanos e dar azo às suas
ambições castelhanas. O presente estudo insere-se numa lacuna historiográfica
face à pouca atenção que a conquista de Arzila granjeou, até ao momento, por
parte dos historiadores portugueses. Assim sendo, é estudada não apenas a
conquista de Arzila, enquanto acontecimento limitado ao mês de Agosto de 1471,
mas também todos os preparativos que foram levados a cabo para permitirem o
sucesso da campanha, bem como as consequências da queda de Arzila, mais
prolongadas no tempo. Esse estudo é escorado não só nos relatos cronísticos mas
também noutras fontes de tipo narrativo e na documentação de chancelaria. É
através do cruzamento das várias fontes que é possível detectar e corrigir
determinadas lacunas dos cronistas e dos historiadores que os seguiram». In
Resumo
A historiografia sobre a presença
portuguesa Marrocos
A historiografia portuguesa tem dedicado abordagens bastante
variadas ao tema da expansão portuguesa no Norte de África. Porém, os estudos
feitos até ao momento não incidem da mesma forma sobre os diferentes períodos
da presença portuguesa na região, que tem por datas limítrofes 1415 e 1769. O
período mais estudado, por ser considerado o apogeu da presença portuguesa em
Marrocos, engloba os séculos XV e XVI1. Relativamente aos primeiros 100 anos de
presença portuguesa na região, o que período que aqui nos importa, os estudos
de carácter geral de maior importância são as quase centenárias obras de David
Lopes, bem como os estudos mais recentes de António Dias Farinha. Assinale-se
ainda a importância da Nova
História da Expansão Portuguesa, que no seu primeiro volume faz uma
síntese de tudo quanto foi produzido acerca de Marrocos até ao final da década
de 1990.
No que a temas específicos diz respeito, existem numerosos
estudos de qualidade dedicados às várias áreas do conhecimento. A
historiografia portuguesa tem visado, no que à presença portuguesa no Norte de
África diz respeito, temáticas como a do armamento utilizado pelos guerreiros;
a violência decorrente de acções militares; a ocupação e defesa de
fortificações; o papel da marinha de guerra portuguesa; o decorrer das
campanhas militares na região e a adaptação portuguesa a diferentes formas de
fazer a guerra. Mas são os estudos específicos sobre as praças portuguesas no
Norte de África que mais têm ocupado os historiadores. De entre estes Ceuta tem
sido a cidade mais estudada, seguida de perto por Tânger. É compreensível que
Ceuta e Tânger concitem tanto interesse por, respectivamente, terem sido a
primeira vitória, e conquista, e a primeira derrota do reino de Portugal durante
o processo de expansão para fora dos limites geográficos peninsulares. No
entanto, afigura-se mais difícil de compreender o porquê de a conquista de
Alcácer Ceguer ainda não ter encontrado o seu historiador, sobretudo tendo em
conta que representa a primeira conquista em África de Afonso V. Já a campanha
comandada por este mesmo rei em 1463-1464 encontra-se melhor estudada. Por fim,
também a conquista de Arzila, ocorrida em 1471, não foi, até ao presente
momento, estudada de forma aprofundada. Tal situação afigura-se estranha quando
é tido em conta que não só constituiu a última vez que um rei português se
envolveu em pessoa numa campanha militar no Norte de África, excepção feita ao rei
Sebastião I, como representou uma estabilização da presença portuguesa naquela
parte do mundo por mais de 30 anos, além de ter permitido a curto trecho a
ocupação de Tânger e o retorno ao reino das ossadas do infante Fernando,
capturado em Tânger em 1437 e falecido em Fez em 1443, pondo assim fim aos
dois traumas que pesavam na consciência do reino, e do seu rei em particular,
desde 1437. A conquista de Arzila foi, de resto, tão significativa para Afonso
V que este a comemorou através da encomenda das Tapeçarias de Pastrana, que retratam de forma magistral esta
mesma conquista e que constituem uma obra-prima do século XV português.
As
obras essenciais para o estudo de Arzila são da autoria de David Lopes e de
Fayad el Mostafa, mas nenhuma das duas concede particular enfoque à conquista
da vila. Apenas na Nova História
Militar de Portugal e na Nova
História da Expansão Portuguesa a conquista de Arzila merece estudo
mais detalhado. No entanto, os estudos são elaborados fazendo recurso quase
exclusivamente aos relatos cronísticos de Rui Pina e Damião Góis, carecendo
assim de análises complementares fazendo recurso a documentação da chancelaria
régia bem como de outras fontes narrativas. É esta análise complementar que, como
veremos adiante, permite a detecção e correcção de lapsos e confusões em que
Rui Pina, em particular, incorre. Também as mais recentes biografias de Afonso
V e João II registam a campanha de Arzila, sem no entanto lhe concederem grande
destaque, o que é natural, dados os objectivos biográficos das obras». In
Paulo A. Mesquita Dias, A Conquista de Arzila pelos Portugueses, 1471,
Dissertação de Mestrado em História, Especialidade História Moderna e
Descobrimentos, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de
Lisboa, 2015.
Cortesia
de FCSH/UNLisboa/JDACT