sábado, 18 de abril de 2020

O Segredo do Anel. Kathleen McGowan. «Ao levantar os olhos, seu rosto se desmanchou num sorriso acolhedor. Maureen! Que surpresa maravilhosa! Não esperava vê-la esta noite. Oi, Pete, murmurou ela, no mesmo tom afectuoso…»

Cortesia de wikipedia e jdact

Los Angeles. Outubro de 2004
«(…) Por favor, não saia daí. Por favor, espere até à minha chegada. Maureen projectou o pensamento em Peter, enquanto andava. Havia uma estranha ligação entre os dois, desde crianças. Ela esperava agora que Peter pudesse sentir como precisava desesperadamente falar com ele. Maureen tentara antes ligar para o primo por meios mais convencionais, mas fora em vão. Peter detestava telefones móveis e não tinha um, apesar das suas muitas súplicas ao longo dos anos. Além disso, recusava-se a atender na extensão da sua sala, se estava absorvido no trabalho. Ela acabou tirando os incómodos sapatos e guardou-os na enorme bolsa de couro pendurada no ombro, enquanto corria na etapa final para o seu destino. Prendeu a respiração ao virar a esquina, levantou os olhos para as janelas do segundo andar e contou da esquerda para a direita. Deixou escapar um suspiro de alívio ao ver a luz acesa na quarta janela. Peter ainda estava lá. Maureen subiu a escada devagar, ganhando tempo para recuperar o fôlego. Virou à esquerda no corredor e parou ao alcançar a quarta porta à direita. Peter estava sentado à sua mesa, examinando com uma lupa um manuscrito amarelado. Sentiu a sua presença antes de vê-la na porta.
Ao levantar os olhos, seu rosto se desmanchou num sorriso acolhedor. Maureen! Que surpresa maravilhosa! Não esperava vê-la esta noite. Oi, Pete, murmurou ela, no mesmo tom afectuoso, contornando a mesa para um abraço intenso. Fico contente que ainda esteja aqui..., fiquei com medo de que já tivesse ido embora e precisava desesperadamente falar consigo. Ele alteou uma sobrancelha e reflectiu por um longo momento, antes de responder: em circunstâncias normais, eu já teria ido embora há horas. Mas senti-me compelido a trabalhar até mais tarde esta noite, por alguma razão que não entendi direito..., até agora. O padre Healy deu de ombros, com um sorriso jovial e sugestivo. Maureen retribuiu com o mesmo sorriso. Nunca fora capaz de explicar em qualquer nível lógico a ligação que tinha com o primo mais velho. Mas desde o dia em que chegara à Irlanda, quando menina, eram íntimos como gémeos, partilhando uma fantástica capacidade de se comunicarem sem palavras.
Maureen enfiou a mão na bolsa e tirou um saco plástico de compras azul, do tipo usado por importadoras no mundo inteiro. Continha uma caixa rectangular pequena, que ela estendeu para o padre. Ah, Lyon's Gold Label! Uma grande escolha. Ainda não consigo suportar o chá americano. Maureen fez uma careta e estremeceu, para indicar sua aversão partilhada. Água de pântano. Creio que a chaleira já está cheia de água. Basta ligar e daqui a pouco tomaremos um chá. Maureen sorriu, enquanto observava Peter levantar-se da velha cadeira de couro que ganhara da universidade. Ao aceitar o cargo no Departamento de Extensão de Ciências Humanas, o estimado dr. Peter Healy recebera uma sala com janela. Os móveis eram modernos, com mesa e cadeira novas e funcionais. Peter detestava o funcional em matéria de mobília, mas detestava ainda mais o moderno. Usando o seu charme gaélico como uma força irresistível, ele conseguira atiçar o estafe, em geral impassível, para uma actividade frenética. Era um sósia do actor irlandês Gabriel Byrne, uma aparência que nunca deixava de atrair as mulheres, com ou sem o colarinho clerical. Os funcionários procuraram em porões e salas de aula em desuso, até encontrarem exactamente o que ele procurava, uma cadeira de couro de encosto alto, bastante confortável, e uma mesa de madeira que pelo menos parecia antiga. Os confortos modernos na sala eram da sua escolha: o pequeno frigorífico no canto, atrás da mesa, uma pequena chaleira eléctrica para ferver água e o telefone, que costumava ignorar.
Maureen sentia-se mais relaxada agora, enquanto o observava, segura na presença de um parente próximo, absorvida na arte tranquilizante e absolutamente irlandesa de fazer chá. Peter voltou até a mesa e inclinou-se para o pequeno frigorífico no canto. Tirou uma caixa de leite pequena e pôs ao lado do açucareiro branco e rosa, em cima do frigorífico. Há uma colher em algum lugar..., ah, aqui está! A chaleira começou a apitar, indicando que a água estava prestes a ferver. Pode deixar que eu faço o chá, ofereceu Maureen. Ela levantou-se e pegou a caixa de chá na mesa de Peter. Abriu o lacre de plástico com a ponta da unha. Tirou dois saquinhos redondos e largou-os em canecas diferentes, manchadas de chá. Os estereótipos sobre os irlandeses e o álcool eram um exagero dramático, na perspectiva de Maureen; o verdadeiro vício irlandês era o chá. Ela terminou os preparativos com a devida eficiência e entregou uma caneca fumegante ao primo. Foi se sentar na cadeira na frente da mesa. Com a sua caneca na mão, Maureen tomou um gole do chá, calada, sentindo que os benevolentes olhos azuis de Peter a contemplavam». In Kathleen McGowan, O Segredo do Anel, Editora Rocco, 2006, ISBN 853-252-096-0.

Cortesia de ERocco/JDACT