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Um Iluminista Paradoxal
«José Agostinho de Macedo, nascido após o meridiano de Setecentos, é
contemporâneo da grande Revolução. Em Portugal, sob o beneplácito de José I, em
pleno consulado pombalino, testemunha o deslocamento de algumas perspectivas
económico-sócio-políticas e assiste ao contrito reinado mariano. No apogeu da
idade adulta, ao pisar o limiar do século XIX, Macedo transporta consigo os
fantasmas do século que o viram nascer. Pela formação eclesiástica ascende a uma
ordem hegemónica do reino. Bem naturalizado, vive sob a regência daquele que
será o nosso primeiro e desafortunado rei constitucional, João VI. Já com o
país em estado predisposto à sublevação, fermento deixado pela primeira
experiência liberal, Agostinho atravessa o atribulado reinado de Pedro IV, com
a questão sucessória e a abdicação em sua filha Maria I, e, num instaurado
clima de pré-guerra, o padre Macedo, já oficialmente arregimentado no movimento
miguelista, participa na defesa do status quo absolutista do Portugal
Velho, consciente da sua condição de sociedade sitiada.
A primeira fase de um Macedo leitor das Luzes e literato foi muitíssimo
prolongada. De que modo terá a cultura clerical estruturado a mentalidade do
poeta e do conhecido pregador? Num momento de ruptura, introduzidas novas
categorias num mundo em trânsito, onde se postulava outro tipo de sociedade e
se impunha a decisão de aderir a uma nova configuração político-cultural,
encontrar-se-ia Macedo em condições de actuar independentemente, como aconteceu
a algumas grandes figuras do clero lusíada? Ou, penhorado a fidelidades canónicas
e a formas implícitas de mecenato, ter-se-á visto coagido a desconhecer
alternativas? Procuraremos enquadrar os elementos da ambiência respirada por
Macedo, a fim de conhecermos os condicionamentos sócio-culturais que
determinaram as suas opções.
José Agostinho de Macedo nasce na cidade de Beja em 11 de Setembro no
ano da graça de 1761. Nos termos da certidão de baptismo constam os nomes dos
pais: Francisco José Tegueira e Angélica dos Serafins Freire; mas não percebe
Inocêncio Francisco Silva, seu principal biógrafo, nem nós, como vem a optar
pelo apelido de Macedo. Opção acompanhada de manifesto repúdio pelo verdadeiro nome:
que diabo de Teiguera [sic] é este? O que lhe escreve a Carta: assina-se
Teiguera, agora diz que eu sou Teiguera? Desentendida a observação feita, e sem
documentos para elucidar tal enigma, este comportamento releva possivelmente de
um problema de identidade, embora no Breve de Secularização do frade José
Agostinho já conste o apelido Macedo. Apresentamos um trecho da cópia do
original da certidão do baptismo de Macedo, transcrita pelo tabelião João
Silvestre Fonseca de Beja, em 1843: [...] No primeiro dia do mês de Outubro de
mil setecentos e sessenta e um anos de minha licença baptizou e pôs os Santos
óleos o reverendo padre Pires Nolasco tesoureiro na Colegiada de S. João
Baptista desta cidade a José, filho primeiro de Francisco José Tegueíra natural
desta Cidade e de sua mulher Angélica dos Serafins Freire natural da Freguesia
de S. Julião da Cidade de Lisboa.
Formação Eclesiástica. A memória como talento
Oriundo de uma família de poucos recursos e dotado de excelente memória,
desde criança capaz de reproduzir um sermão inteiro, Agostinho parece destinado
à vida eclesiástica. Emprego justo para dom tão apreciado e único meio de
promoção numa sociedade estratificada em ordens quase incomunicáveis». In Maria
Ivone Ornellas Andrade, José Augusto Macedo, Um Iluminista Paradoxal, Edições
Colibri, Delegação Regional da Cultura do Alentejo, Ministério da Cultura, CM
de Beja, 2001, ISBN 972-772-305-5.
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