Os Bastardos do Bolonhês
«(…) O rei Afonso II (1185-1223) teve dois filhos bastardos, de
quem pouco ou nada se sabe: João Afonso, o único que a História
Genealógica refere e está enterrado no Mosteiro de Alcobaça, tendo falecido
a 9 de Outubro de 1234; e Pedro
Afonso, que terá participado na conquista de Faro, em 1249, e sido pai de Constança Pires, uma filha talvez bastarda. Mas os filhos ilegítimos do rei Gordo podem ter sido mais. Pois não é
verdade que, no seu testamento, o próprio monarca se refere aos filhos e filhas que tenho de outras mulheres?
O rei Sancho II, o infeliz rei Capelo
que lhe sucedeu no trono, não teve filhos nem filhas doutras mulheres. E também
não os teve de sua esposa, D. Mécia Lopes de Haro, tendo morrido sem
descendência. Pelo contrário, seu irmão, Afonso III, o Bolonhês, foi homem de várias mulheres e de muitos filhos,
legítimos e ilegítimos. Casou duas vezes. Sua primeira mulher foi D. Matilde,
condessa de Bolonha, com quem se uniu no ano de 1235. Mas, na opinião da maioria dos genealogistas portugueses, a
condessa, se lhe deu o cognome, não lhe deu filhos, embora, além-fronteiras,
oficiais do mesmo ofício garantam que Afonso III houve, de D. Matilde, dois
filhos, um rapaz e uma rapariga, que morreram crianças.
Em 1246, Afonso
trocou os domínios de sua mulher pelo reino de seu irmão, de que o papa o
fizera curador e defensor, depois de excomungar Sancho II. Portugal ardia então
numa guerra civil, que só terminará pela derrota do rei Capelo, que se exila em Toledo, onde virá a morrer, em Janeiro de 1248. Sentado no trono, Afonso III, que
continuava casado com a condessa de Bolonha, decidiu em 1253 contrair matrimónio com a rainha D. Brites, ou Beatriz, como hoje
preferimos dizer, também ela uma bastarda real, por ser filha do rei
Afonso X de Castela e de D. Maior de Guzmán, senhora de Alcocer, sua amante.
Era uma forma de consolidar a sua monarquia.
E (diz a Crónica de 1419) forom as gemtes muyto maravilhadas daquele
casamento, porquanto el-rey dom Afonso era casado com a condesa de Bolonha
[...] em guisa que hum seu paniguado lhe disse hum dia que fizera muito mal
receber outra molher sabendo bem que era casado com a condesa de Bolonha. E
el-rey lhe deu em resposta dizendo que, se em outro dia achase outra molher que
lhe desem outra tanta terra no regno pera o acresçentar, que loguo casaria com
ela […] A verdade é que, casando com D. Beatriz, em Chaves, a 20 de Maio de
1253, Afonso III incorreu em bigamia
(e em adultério, e em incesto), que o papa Alexandre IV se apressou a
condenar, excomungando-o, a instâncias, decerto, de D. Matilde, que reclamou a
separação do marido e restituição do dote. O
castigo pontifício durou dez anos. Mas, em 1259, D. Matilde morreu e, embora o papa tivesse ordenado a Afonso
III que se separasse de D. Beatriz, a morte da condessa de Bolonha contribuiu
para que Roma fosse abrindo caminho a uma solução, forçada pelos instantes
pedidos dos bispos portugueses e pelos esforços diplomáticos do rei Bolonhês. A 19 de Junho de 1263, o papa Clemente IV, entretanto
eleito, autorizou o monarca português a continuar a conjugalis copula com a
filha bastarda de Afonso X, o sábio rei de Castela. E, um mês depois, pela bula
In
nostra proposuistis levantou o interdito que o seu antecessor também
lançara sobre o reino portucalense». In Isabel Lencastre, Bastardos Reais, Os
Filhos Ilegítimos dos Reis de Portugal, Oficina do Livro, 2012, ISBN
978-989-555-845-2.
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