quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Terra Inquieta. Manuel Faria. «Mas o cifrão não conta para quem sente nos hemisférios cerebrais o delírio planetário. Após uma subconsciencialização profunda, em que os prós e os contras se digladiavam na obscuridade subterrânea do “eu”»

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«(…) Andava no ar uma ideia surda, geográfica, de voos transoceânicos e roteiros de gelo nas planuras do Ártico, com o Sol da meia-noite a piscar o olho cósmico, lá para as bandas do Cabo Norte... Ao mesmo tempo, umas cautelas infantis, ingénuas, de consciência insegura em ordem a tão aerodinâmica viagem e uns segredinhos dúbios, cochichados na sombra, não fosse o pavilhão auditivo paterno captar o disparate turístico. Os dias foram rodando..., as semanas sucediam-se, saboreando o volátil passeio, na perspectiva de realizar um sonho! Os oito voos, os itinerários ao longo dos meridianos e paralelos, de harmonia com o plano das agências que superentendem nesses paranóicos devaneios, bem como nas achegas necessárias de alimentação e dormida nessas paragens frigoríficas, se foram programando aos poucos, por via telefónica, quer entre os participantes motivados, quer entre estes e as respectivas agências turísticas. Trezentos contos altos, incluindo passaportes do Porto a Lisboa e vice-versa, custa o passeio. Mas o cifrão não conta para quem sente nos hemisférios cerebrais o delírio planetário. Após uma subconsciencialização profunda, em que os prós e os contras se degladiavam na obscuridade subterrânea do eu, Helsínquia, Finlândia, Lapónia, Fiordes Escandinavos, Cabo Norte, Sol da meia-noite, ruíram, em pedaços, tal como sucede aos castelos de oiro feitos no ar pelas loucas mãos da fantasia! Fico contente com esta derrocada...» In Manuel O. Faria, Terra Inquieta, APPACDM, Braga, 1994, ISBN 972-8195-10-9.

Cortesia de APPACDM/JDACT