sexta-feira, 13 de abril de 2012

História da Maçonaria em Portugal. A. H. Oliveira Marques. Das Origens ao Triunfo. «Quanto às lojas estabelecidas em várias outras praças fortes do País, há referência precisa a uma, criada em Olivença ou Elvas, existente em 1765-66 e de que participavam oficiais alemães servindo nas duas localidades. Esta loja fazia recrutamento, como nos informa Kinselach nas suas declarações»



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O Pombalismo
«A loja de Coimbra é tão provável e verosímil como a de Valença, embora não existam provas decisivas dos seus trabalhos. A juventude estudantil foi aí sempre um foco de irrequietismo e de vanguardismo culturais, de onde saíram, em todos os tempos, núcleos de maçons e lojas maçónicas, tão variadas e efémeras como a condição escolar o exigia. Sabe-se que, na década de Setenta, esteve activo, na cidade do Mondego, um núcleo de ‘libertinos’, quase todos eles perseguidos pela Inquisição (maldita) a partir da queda do marquês de Pombal, de que fizeram parte, entre outros, os estudantes António Morais Silva, João Bezerra de Seixas, José Laureano Leger, Manuel Espírito Limpo, o Morgado de Mateus, José Maria Teixeira, Francisco José Almeida, Diogo José Calado, Lourenço Justiniano Calado, António Caetano Freitas, Vicente Júlio Fernandes, Francisco José Almeida, Nuno Freitas da Silva, José Maria da Fonseca, João Manuel Abreu, Rodrigo de Sousa Coutinho e o afamado lente José Anastácio Cunha. Ainda em 1778-79 se faziam provavelmente iniciações na cidade, como se verá no capítulo seguinte. Com mais forte razão elas se realizariam nos anos anteriores, quando a liberdade religiosa e maçónica era maior. A influência de José Anastácio Cunha, que exerceu funções docentes em Coimbra de 1773 a 1778, pode ter sido decisiva na instalação da loja coimbrã.

Quanto às lojas estabelecidas em várias outras praças fortes do País, há referência precisa a uma, criada em Olivença ou Elvas, existente em 1765-66 e de que participavam oficiais alemães servindo nas duas localidades. Esta loja fazia recrutamento, como nos informa Kinselach nas suas declarações.
O mesmo depoente refere a existência de um maçon, oficial alemão em Estremoz, presente numa iniciação na loja de Lisboa. O próprio Kinselach, aquando da sua estada no Alentejo, durante o ano de guerra (1762), procedera a aliciações para a Maçonaria, conseguindo a adesão de um sobrinho ou primo do conde de Lippe. E em Almeida havia, já em 1760, um foco de ‘libertinagem’ entre a oficialidade, de que participava o morgado de Balsemão.
Também em Braga, apesar de não se tratar de uma praça forte, houve, junto de Kinselach, diligências por parte de nobres e oficiais do Exército portugueses para ser constituída uma loja, algures em 1776. A iniciativa não foi, ao que parece, levada a efeito.

Esta Maçonaria pombalina dos anos de Sessenta distinguia-se consideravelmente da Maçonaria das décadas de Trinta e Quarenta. Não no ritual nem nos objectivos expressamente professados, entenda-se, que se mantinham inalteráveis. A diferença estava antes nos maçons aderentes. Enquanto as lojas joaninas eram constituídas, com poucas excepções, por pequenos e médios comerciantes e artesãos, gente de pouco peso social, conformista e sem nada que a distinguisse do comum da população, nas novas lojas josefinas predominavam jovens militares bem pensantes, cônscios da sua visão diferente do mundo e desejosos de contribuir para uma modificação estrutural. Não se tratava ainda de uma maçonaria ‘liberal’, como viria a ser a de começos de Oitocentos, nem a ordem política sobretudo preocupava os novos maçons. As questões religiosas e filosóficas é que principalmente os norteavam. A contestação dirigia-se mais a Deus do que ao Príncipe. Eram postos em causa o Deus católico tradicional e as verdades da religião católica ou, pelo menos, do catolicismo interpretado por Roma. Daí, o impacte dos protestantes e da sua maneira diferente de entender o Cristianismo. E distinguiam-se também muitos desses maçons pela maneira de estar no mundo, de viver o dia-a-dia, em contraste com a esmagadora maioria da população. Ampla tolerância de ligações extramatrimoniais, recusa ao jejum e à abstinência, convívio com hereges e com estrangeiros ‘diferentes’, leitura de livros ‘proibidos’, aceitação de uma nova ciência, de uma nova filosofia e de uma nova moral ou, pelo menos, discussão em seu torno, eis o que uma percentagem significativa de novos maçons defendia e professava.
Maçonaria passou a ser geralmente conotada com libertinagem, tal como a palavra era definida no Portugal do século XVIII, mesmo que grande número de ‘irmãos’ continuasse arreigado às práticas religiosas e morais impostas pela tradição». 
In A. H. Oliveira Marques, História da Maçonaria em Portugal, das Origens ao Triunfo, Editorial Presença, 1990.

Cortesia de Editorial Presença/JDACT