sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

A Batalha de S. Mamede. 24 de Junho de 1128. Sociedade Martins Sarmento. «Quando Henriques, o borgonhês, morreu, deixando nos braços da viúva o pequenito Afonso Henriques, D. Teresa confiou o rebento à família do fidalgo duriense Egas Moniz, para que o educasse, e assumiu ela o governo do condado»

Acácio Lino, a Primeira Tarde Portuguesa
Cortesia de wikipedia

Afonso Henriques e S. Mamede
«A Sociedade Martins Sarmento organizou uma exposição, não procurando acrescentar qualquer nova auréola ao primeiro rei, nem pôr em causa o local do acontecimento histórico.
Isto é, não visou alimentar qualquer estéril polémica quanto à naturalidade de Afonso Henriques e muito menos quanto ao local onde foi travada a peleja.
Muito chãmente, procurou mostrar como a tradição alimentou um rico imaginário que, até prova documental irrefutável, constitui penhor histórico insubstituível para Guimarães e suas gentes.
Se o evento histórico tivesse sido congeminado por um poeta, com certeza que ele não desdenharia de escolher a noite de S. João como cenário ideal de sonhos auspiciosos gerados por eflúvios solsticiais. Pese embora a decisão de travar a batalha de S. Mamede ter decorrido de uma postura bastante pragmática do infante e dos barões de Entre-Douro-e-Minho, o facto é que mais do que as lendárias correntes que pesaram sobre a condessa destituída, ficou a imagem destemida do filho.
A primeira tarde portuguesa, vivida no rescaldo da batalha de S. Mamede, marcou para sempre o vínculo de Afonso Henriques a esta Terra, e uma vida longa e aventurosa projectaram a sua imagem pelos séculos fora, indissociavelmente presa a uma Guimarães mítica que tem enchido, desde sempre, o imaginário de todas as crianças portuguesas.
A tradição, sustentada há séculos por todos os historiadores vimaranenses, e não só, tem permitido alimentar um outro imaginário, aquele que puderam percorrer com os olhos e tactear através do diversificado material que ofereceram à curiosidade dos visitantes.

De Guimarães o campo se tingia,
Co sangue proprio da intestina guerra,
Onde a mãy que tam pouco o parecia,
A seu filho negaua o amor, & a terra,
Co elle posta em campo ja se via,
E não ve a soberba, o muito que erra.
Contra Deos, contra o maternal amor:
Mas nella o sensual era maior.

De Os Lusíadas, canto terceiro, Luís de Camões

Não passa muito tempo, quando o forte
Principe, em Guimarães está cercado,
De infinito poder, que desta sorte,
Foy refazerse o immigo magoado:
Mas com se offerecer aa dura morte,
O fiel Egas amo, foy liurado.
Que de outra arte podêra ser perdido,
Segundo estaua mal aperçebido.

Mas o leal vassallo conhecendo,
Que seu senhor não tinha resistencia,
Se vay ao Castelhano, prometendo,
Que ele faria darlhe obediencia.
Leuanta o inimigo o cerco horrendo,
Fiado na promessa, & consciencia
De Egas moniz mas não consente o peito
Do moço illustre, a outrem ser sogeito.

Chegado tinha o prazo prometido,
Em que o Rei Castelhano ja agoardaua,
Que o Principe a seu mando sometido,
Lhe desse obediencia que esperaua.
Vendo Egas, que ficaua sementido,
O que delle Castella não cuydaua,
Determina de dar a doçe vida,
A troco da palaura mal comprida.

E com seus filhos & molher se parte,
A aleuantar co elles a fiança,
Descalços, & despidos, de tal arte,
Que mais moue a piedade que a vingança.
Se pretendes Rei alto vingarte,
De minha temeraria confiança,
Dizia, eis aqui venho offerecido,
Ate pagar co a vida o prometido.

De Os Lusíadas, canto terceiro, Luís de Camões

D. Affonso Henriques
Pae, foste cavalleiro.
Hoje a vigilia é nossa.
Dá-nos o exemplo inteiro
E a tua inteira força!

Dá, contra a hora em que, errada,
Novos infieis vençam,
A benção como espada,
A espada como benção!
in Mensagem de Fernando Pessoa

In Maria José Marinho Queirós Meireles, D. Afonso Henriques e S. Mamede, Exposição, Congresso Histórico sobre D. Afonso Henriques, Sociedade Martins Sarmento, Guimarães, 1995, ISBN 972-8078-46-3.

Cortesia de S. M. Sarmento/Guimarães/JDACT