quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Carla Alferes Pinto: A Infanta dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma Princesa Renascentista. Parte XII. «O bispo, que chega a Lisboa a 10 de Janeiro de 1542, tinha ordens para levar a Infante para França, com o dote que lhe era devido. Se tal propósito ‘levasse muito tempo e pouca solução’ D. Maria poderia partir sem o dote e com promessas de que o mesmo seria pago... Era esta a intenção»

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«Manobrara de forma hábil as ambições portuguesa e francesa sobre o ducado de Milão, de maneira a tornar os dois reinos adversários, e começara a convencer João III de que armar de tantos capitais um país com exércitos comandados por Francisco I acabaria por ser prejudicial, não só para ele como para Portugal, face às inúmeras relações pessoais que existiam entre as casas de Avis e de Habsburgo. Mas Francisco I, interessado no dote da Infanta e também terrivelmente pressionado pela rainha D. Leonor, escreve, a 26 de Agosto de 1538, ao seu embaixador na corte de Carlos V para que averigue, discretamente, sobre qual das duas Marias, filha de Carlos e de Isabel de Portugal, ou a Infanta portuguesa, gostaria o imperador de ver casada com o duque de Orleães.
Carlos V deu resposta logo no mês seguinte dizendo não poder dispor da mão de sua filha por motivos que ElRei de França devia de saber, e quanto ao casamento da infanta portuguesa com o duque francês, não o julgava correcto, uma vez que Carlos de Orleães estava quasi fiançado com a filha de Fernando da Alemanha.

NOTA: Com efeito, Carlos V reservara para o filho primogénito do rei dos romanos a sua filha mais velha, homónima da infanta portuguesa...; tanto mais que não podia a Infanta portugueza ccasar-se com o primogenito d' ElRei dos Romanos, a quem estava a filha do Imperador, o qual não entendia saísse sua filha fóra da casa d’Austria, [doc. Datado de 1535]. Relations des Ámbassadeurs vénitiens sur les affaires de France au XVIe siècle, tomo I, in Santarém, 1842-1860.

E para que não restassem dúvidas quanto à vontade do imperador - e, também, para acalmar a ansiosa rainha - reserva todo um artigo na carta ao rei francês para manifestar o seu empenho pessoal na resolução desta questão. Esse empenho não foi suficientemente lesto; em Abril de 1540, Carlos V volta a dar resposta a Francisco I sobre o mesmo assunto, agora num tom mais moderado, mas que deixa adivinhar que continuavam as manobras diplomáticas de bastidores.

NOTA: … diz que confiando nas virtudes da dita Infanta, e nas de sua mãi a Rainha D. Leonor, viuva d’EIRei D. Manoel de Portugal, elle se obriga a fazêl-as consentir em quanto a respeito d’ellas ajustar com ElRei de França. E no art. XIII oferece a sua mediação e bons ofícios, junto a ElRei de Portugal, afim de se concertarem amigavelmente as diferenças que entre elle e ElRei de França subsistião. [BNP, Cód. 8577].

D. Leonor e  Francisco I não desistem e mandam a Lisboa o bispo de Ade, dando início a um período de fértil correspondência entre a Infanta, a rainha D. Leonor, Francisco de Gusmão e as cortes de João III, Carlos V e Francisco I, com o intuito de concluir as negociações sobre a ida de D. Maria para França.
Em Dezembro de 1541 é a rainha de França que escreve à filha a fim de lhe dar a conhecer os seus desejos e as diligências que faz. Nesta carta, D. Leonor dá conta de que:
  • ya tengo escrito al Emperador, suplicando le haga de rnanera que vuestra hazienda sea assegurada desde aora, e que se Si dixeren que no salgais de sus manos sin ser casada, direis, que esto toca a vuestra madre.
Recomenda-lhe, ainda, que a carta, só seja vista por Joana Blasfer e que a queime depois de lida; e termina dando-lhe instruções para que não fale com ninguém sobre tal assunto, nomeadamente ao embaixador francês Honorato de Caix, salvo com o enviado de Carlos V na corte portuguesa, Luís Sarmiento. O bispo, que chega a Lisboa a 10 de Janeiro de 1542, tinha ordens para levar a Infante para França, onde se trataria de arranjar estado para a jovem princesa, com o dote que lhe era devido; todavia, e se tal propósito levasse muito tempo e pouca solução, D. Maria poderia partir sem o dote e com promessas de que o mesmo seria pago conforme fosse possível. Era esta a intenção. Pelo menos a de sua mãe, mas não necessariamente a de Carlos V, e certamente que não a de Francisco I». In Carla Alferes Pinto, A Infanta Dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma Princesa Renascentista, Fundação Oriente, 1998, ISBN 972-9440-90-5.